Tendo em consideração as nossas últimas semanas aqui no Observador, qualquer um pode ficar com a ideia de que os “jogos de luta” estão a ter algum período de destaque no mercado, ou que estão a reviver a fase de maior sucesso que aconteceu na segunda metade da década de 1990. Mas não, o facto de termos falado de Injustice 2 e de ARMS, e de hoje trazermos o regresso de uma das séries de fighting games de maior sucesso (especialmente em Portugal) é uma mera coincidência de calendário de lançamentos.
Há cerca de vinte anos os jogos de luta estavam no seu auge, transpondo o sucesso nos salões de arcadas que vinha ainda da década de 1980 para o conforto das consolas domésticas. Dos grandes sucessos bidimensionais de Street Fighter e Mortal Kombat passámos para as abordagens 3D, com os personagens hiper-poligonais de Virtua Fighter a abrirem caminho para o que viria a ser, anos mais tarde, um dos maiores sucessos da PlayStation: Tekken.
Com o verdadeiro bastião de vendas encontrado pela Sony no nosso País, durante muito tempo os Tekken eram sinónimo de jogos de luta em Portugal, culminando naquele que se tornou o standard do género e que foi lançado em 1998: Tekken 3, o jogo que todos queriam jogar e que ainda hoje é um dos fighting games de maior sucesso comercial (sendo o jogo de luta mais vendido de sempre) e crítico com 96% de Metacritic.
O que sempre diferenciou Tekken dos restantes era a fluidez e a complexidade do seu elenco. Cada personagem era verdadeiramente diferente de jogar dos restantes, fosse nas gigantescas listas de movimentos, ataques e combos, que estavam intimamente ligados aos estilos de luta de cada um. Se os fighting games “clássicos” na arcadas nos habituaram a uma lógica de quatro botões que controlavam murros e pontapés, fracos e fortes, Tekken vinha agitar as águas ao mudar-nos o mindset para nos obrigar a reajustar o controlo dos braços e das pernas.
Passaram-se quase 20 anos desde que Tekken 3 agarrou os possuidores da primeira PlayStation, e este Tekken 7 é quase um descendente em linha direta desse jogo, tal é a familiaridade e proximidade entre ambos.
Esta familiaridade que encontramos após tantos anos tem algo de muito positivo, especialmente no reencontro com alguns dos personagens recorrentes. A memória muscular responde de imediato e os golpes e combinações desses personagens surgem de forma imediata, com os comandos inalterados após duas décadas de contacto. Jogar este Tekken 7 quase que nos dá a mesma sensação do qual falávamos no artigo sobre WipEout: existe um instinto de semelhança tão grande que parece que a única separação entre o Tekken 3 e este 7 é mesmo a tecnologia e o distanciamento gráfico entre os dois.
Tekken sempre foi “menos simpático” para novos jogadores do que muitos outros concorrentes e este Tekken 7 não é exceção. Aliás, não fosse o vídeo de recapitulação da convoluta história da série e com todos os seus momentos auto-referenciais que não fazem sentido, e dir-se-ia que que Katsuhiro Harada, o autor deste e de outras séries de luta de sucesso não tinha vontade de estender a abrangência dos seus jogos para além do segmento que já os conhece. Ainda que o button mashing tão típico de novos jogadores em jogos de luta possa ser uma resposta relativamente eficaz como primeiro contato, o domínio de Tekken sempre me pareceu mais complexo do que os seus concorrentes.
O lado negativo desta familiarização da série ao longo destes anos é o de servir de estranho déja vu. Foram largos anos de desenvolvimento para este Tekken 7, o que seria de esperar que a par de outras empresas e títulos grandes do género que tentassem reinventar-se e destacar-se num mercado em constante evolução. Mas não, Tekken 7 preferiu ficar circunscrito aos jogos de luta que ainda teimam em permanecer num ambiente tridimensional, de onde praticamente todos os concorrentes já saíram.
Apesar de termos desejado que a série se reinventasse, tal como reinventou e redefiniu aquilo que eram os fighting games no final dos anos 90, Tekken 7 apostou num lugar seguro, um caminho que conhece bem e onde os seus resultados sempre foram muito bons. Visualmente soberbo, Tekken 7 consegue trazer tudo aquilo que adorámos na série para os dias de hoje, fazendo o melhor uso possível da tecnologia de Unreal Engine 4.
Em quase todos os aspetos esta conclusão da quase absurda história do clã Mishima e do elenco sui-generis que inclui, entre outros personagens memoráveis, um lutador de capoeira e um urso, é um jogo muito bom. Tão bom quanto o melhor que a série já foi em tempos, tendo apenas uma pequena diferença: nessa época era Tekken quem fazia o mercado avançar a cada iteração, e nos dias de hoje limita-se a reconstituir esse caminho já trilhado.
Tekken 7 é uma aposta segura. E isso diz tudo, para o bem e para o mal.
Ricardo Correia, Rubber Chicken