Artigo atualizado às 12h44 com informação sobre o número de mortos

Pelo menos 60 pessoas morreram em confrontos na manhã desta segunda-feira entre palestinianos e soldados israelitas na Faixa de Gaza ao longo da fronteira com Israel, horas antes da transferência da embaixada dos EUA para Jerusalém. Uma das vítimas mortais é um bebé atingido por gás lacrimogénio. Segundo o porta-voz do ministério, Ashraf Al Qedra, um dos feridos, um homem de 30 anos, não resistiu aos ferimentos e morreu durante a madrugada.

O Ministério da Saúde palestiniano fala ainda em 2.771 feridos e adianta que muitas das vítimas mortais não foram ainda identificadas. Enquanto isso, Trump e Jared Kushner falam em acordos de paz na inauguração da embaixada dos EUA em Jerusalém. Benjamin Netanyahu elogia “coragem” de Trump em cumprir o que promete. Entre os feridos, 225 são crianças e 12 são jornalistas. Do número total, há 54 em estado muito grave.

Entre mortos, estão seis crianças com menos de 18 anos, confirmou o embaixador palestiniano na ONU, Riyad Mansour, em conferência de imprensa.“Condenamos veementemente as atrocidades cometidas pelas forças israelitas de ocupação, que utilizaram um forte poder de fogo contra civis que têm o direito de se manifestar pacificamente e que o fizeram”, sublinhou o diplomata.

[Veja no vídeo, em 99 segundos, como se chegou a este dia trágico]

De acordo com o Telegraph, 40 mil pessoas — descritas como “manifestantes violentos” — estavam em 12 localizações diferentes ao longo da vedação que marca a fronteira entre a Faixa de Gaza, enclave palestiniano que é controlado pelo movimento radical palestiniano Hamas desde 2007, e Israel e outros milhares de palestinianos estavam concentrados a cerca de um quilómetro. Participam em protestos contra a transferência da embaixada dos Estados Unidos de Telavive para Jerusalém, cuja inauguração começou esta segunda-feira às 16h00 (14h00 em Portugal continental).

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O contraste entre o que se passa dentro do edifício da embaixada e o que se passa lá fora, no palco dos confrontos, é evidente:

Segundo a agência espanhola EFE, as forças israelitas, que haviam alertado a população para não se aproximarem da linha divisória, dispararam gás lacrimogéneo contra os manifestantes para impedir que os palestinianos se aproximassem do portão de segurança.

Mas os palestinianos aproximaram-se. “Não queremos só uma ou duas pessoas a aproximar-se. Queremos um grupo grande“, disse uma idosa de mala ao ombro e uma bandeira da Palestina na mão, relata o The New York Times. O grupo tornou-se “grande”, especialmente depois das orações do meio-dia. E não por causa do apelo da mulher de mala ao ombro e bandeira da Palestina na mão. É que, de acordo com o mesmo jornal, membros do Hamas dirigiram-se aos fiéis, incentivando-os a juntar-se aos protesto, alegando que a vedação tinha sido ultrapassada e que os palestinos estavam a invadir Israel.

Por volta das 18h00 locais (16h00 em Lisboa), o movimento radical palestiniano Hamas pediu aos manifestantes que se afastassem da vedação, ao dar como finalizados os protestos desta segunda-feira.

As fotos dos confrontos violentos em Israel

O Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, saudou esta segunda-feira a transferência da embaixada norte-americana de Telavive para Jerusalém, em Israel, e afirmou ser “um grande dia” para Israel. No discurso de abertura da cerimónia de transferência da embaixada, Martin M. Friedman, o embaixador norte-americano em Israel, afirmou que o “dia histórico de hoje é atribuído à coragem e claridade moral de uma pessoa para com a qual teremos sempre uma enorme e eterna dívida de gratidão: o presidente Donald J. Trump”.

Trump. “Israel é soberano para determinar a sua própria capital”

O Ministério da Saúde palestiniano revelou que 443 ferimentos foram feitos por armas de fogo, 320 por gás lacrimogéneo e três por balas de borracha. As forças armadas israelitas divulgaram um comunicado onde acusam o grupo palestiniano Hamas de “liderar uma operação terrorista”. Em comunicado, o exército israelita anunciou que lançou um raide aéreo contra “cinco alvos terroristas num campo de treino militar pertencente ao Hamas” no norte da Faixa de Gaza.

O ataque foi realizado em resposta a ações violentas do Hamas nas últimas horas”, lê-se no comunicado.

Na terça-feira, os palestinianos assinalam o ‘Nakba’ (desastre, em árabe), que designa o êxodo palestiniano em 1948, quando pelo menos 711 mil árabes palestinianos, segundo dados da ONU, fugiram ou foram expulsos das suas casas, antes e após a fundação do Estado israelita.

“Estamos preparados para apoiar um acordo de paz”, diz Kushner

Enquanto os conflitos se adensam, na cerimónia de inauguração da embaixada dos EUA em Jerusalém, onde Donald Trump apareceu numa mensagem de vídeo, falou-se várias vezes de paz.

Primeiro foi Trump, que apareceu em vídeo a dizer que continua comprometido com a mediação do conflito israelo-palestiniano, e a afirmar que Israel é uma nação soberana e, como tal, capaz de determinar a sua própria capital. Depois foi a vez de o genro e conselheiro Jared Kushner subir ao palco para saudar o passo dado pelos norte-americanos. E para, mais uma vez, falar de paz.

“Como podemos ver dos protestos do mês passado, e os de hoje, a violência é parte do problema e não parte da solução. Os EUA estão preparados para apoiar um acordo de paz em todos os termos que forem possíveis. Acreditamos que os dois lados ganham mais se os povos puderem viver em paz e livres de perigo, livres do medo e capazes de prosseguir os seus sonhos”, disse.

Jared Kushner acrescentou ainda que Jerusalém é uma “cidade única na história da civilização”. Também o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, subiu ao palco na cerimónia de inauguração da embaixada para agradecer a Donald Trump. “Obrigado presidente Trump por ter a coragem de manter as promessas, e obrigado por manter os nossos povos mais próximos do que nunca”, disse, acrescentando ainda que, “ao reconhecer a história, Trump está a fazer história”.

Reino Unido pede “calma”. França quer evitar “novo atear das chamas”

O Governo britânico apelou para a “calma e a contenção” ao tomar conhecimento do número de mortos nos confrontos. “Estamos preocupados com as informações sobre violência e perdas humanas em Gaza. Apelamos para a calma e a contenção, para evitar ações destrutivas para os esforços de paz”, declarou um porta-voz da primeira-ministra, Theresa May, em conferência de imprensa.

“A primeira-ministra fez claramente saber, em dezembro, que nós desaprovávamos esta decisão. Pensamos que ela em nada ajuda os planos de paz na região””, disse o porta-voz de Theresa May, recordando que o Reino Unido se mantém “firmemente empenhado numa solução de dois Estados, com Jerusalém como capital conjunta”.

Também a França apelou “a todos os atores” para impedirem “um novo atear das chamas” no Médio Oriente. “Quando as tensões no terreno estão a intensificar-se, a França apela a todos os atores para darem provas de responsabilidade a fim de impedirem um novo atear das chamas”, sublinhou o ministro dos Negócios Estrangeiros francês, Jean-Yves Le Drian, numa declaração escrita. “É urgente voltar a criar as condições necessárias à busca de uma solução política, num contexto regional já marcado por fortes tensões”, acrescentou, referindo-se à retirada norte-americana do acordo nuclear com o Irão e à recente escalada militar entre Israel e o Irão na Síria.

Alistair Burt, o secretário de Estado britânico para o Médio Oriente e a África do Norte, exigiu, por sua vez, “contenção no recurso a balas verdadeiras”, na rede social Twitter. Classificada como “histórica” por Israel, esta promessa de instalação em Jerusalém feita pelo Presidente norte-americano, Donald Trump, foi interpretada como um ato de desafio à comunidade internacional, num período de grande preocupação com a estabilidade regional.

O Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, afirmou que os EUA tinham perdido “o seu papel de mediador” no Médio Oriente, depois da sua decisão de transferir a embaixada de Telavive para Jerusalém. “Rejeitamos esta decisão que viola o direito internacional e as resoluções das Nações Unidas”, declarou Erdogan, no segundo dia da sua visita ao Reino Unido, durante uma palestra no centro de reflexão Chatham House.

O chefe de Estado acrescentou que “com esta decisão, os EUA escolheram serem uma parte do problema e perderam o seu papel de mediador no processo de paz” no Médio Oriente. Erdogan exportou ainda a comunidade internacional a “desempenhar o seu papel o mais rapidamente possível” e a tomar medidas para acabar com “a agressão crescente de Israel”. Reafirmou ainda que “a criação de um Estado palestiniano independente, com Jerusalém como capital” é “a única solução para uma paz durável”.

O dia mais mortífero em Gaza desde 2014

Segundo um porta-voz da OMS em Gaza, Mahmoud Dare, os hospitais e unidades de saúde estão sobrelotados e estão a debater-se com falta de medicamentos e equipamentos, situação agravada pelos sucessivos cortes na energia elétrica. “Os números são comparáveis a uma situação de guerra. São mesmo muito grandes os números de feridos”, frisou Dare.

Segunda-feira foi o dia mais mortífero em Gaza desde a operação militar israelita Margen Protector, de 2014, em que morreram mais de 2.000 palestinianos em 50 dias. Desde o início, a 30 de março, de um movimento de contestação designado “marcha de retorno”, que reivindica o regresso dos refugiados palestinianos às terras de onde foram expulsos ou fugiram após a criação do Estado de Israel, em 1948, já morreram 109 palestinianos e mais de 12.000 ficaram feridos, metade deles atingidos por balas reais.

Num comunicado divulgado esta segunda-feira, a organização não governamental Médicos Sem Fronteiras (MSF) denunciou a violência registada segunda-feira na Faixa de Gaza, considerando-a “inaceitável e desumana”.

Os palestinianos celebram esta terça-feira a “Nakba” (catástrofe), que, no seu entender, representa o nascimento do Estado de Israel — 14 de maio de 1948 –, com um dia de greve geral e de dor devido às mortes de segunda-feira. Aguardam-se mais protestos e confrontos com as forças israelitas na faixa de Gaza e na Cisjordânia.