Expectativa versus Realidade. Dois quadros podem ser pintados para ilustrar o que vai ser a tradicional festa social-democrata do Pontal, que decorre este sábado em Loulé. Um é o entendimento de Rui Rio, e o outro é aquilo que os críticos internos esperavam que fosse. “O silêncio tem um lado bom: a expectativa. Se [Rui Rio] não tiver coisas boas guardadas para o regresso, e se fizer um discurso pífio, mostra que as férias não serviram para nada”, ouve o Observador de uma fonte social-democrata crítica de Rui Rio. Este é um lado. Depois de ter estado o mês de agosto todo remetido ao silêncio, sob o lema de que “férias são férias”, o líder do PSD voltou a entrar em cena esta sexta-feira, numa visita às zonas afetadas pelo incêndio da serra de Monchique, e falou tanto sobre tanta coisa que arrumou a maior parte dos chamados assuntos pendentes. O que sobra para o discurso político de sábado à tarde? Críticas ao governo e o lançamento do ano político que aí vem, e que é ano eleitoral, dirão uns. É esse o entendimento de “rentrée” partidária, e era dessa forma que era usada a intervenção do Pontal nos últimos anos (nos mandatos de Passos Coelho, e não só). Mas não é esse o entendimento de Rio.

“Não é uma rentrée, não queremos falar de rentrée”, diz ao Observador, fonte da direção de Rui Rio, que sublinha que o líder do PSD sempre rejeitou a ideia de rentrée por entender que é um conceito “que serve apenas para mediatizar” e, já agora, porque o trabalho é contínuo. Outra fonte já tinha adiantado ao Observador que “o discurso mais a sério não é o do Pontal, vai ser o da Universidade de Verão”, onde Rio estará a cargo do encerramento, no próximo dia 9. Mas outras vozes no partido entendem que o facto de o líder do maior partido da oposição ter estado “desaparecido” durante mais de 30 dias confere-lhe uma obrigação acrescida de entrar com os dois pés. E o primeiro momento não é o discurso da Universidade de Verão, mas sim o do Pontal, marcado para este sábado por volta das 17h.

De acordo com fonte oficial citada pela agência Lusa, o discurso de Rio não terá mais do que 30 minutos e será uma intervenção política “apropriada a uma festa de convívio com militantes”. Ou seja, não será este o momento escolhido por Rio para elencar as prioridades do partido para o próximo ano, nem tão pouco será de esperar que Rio lance as sementes para aquilo que vai ser a estratégia eleitoral do partido para o ano que se avizinha. Foi isso que fez António Costa há uma semana, na Festa de Verão do PS em Caminha, a chamada “rentrée” dos socialistas, onde só faltou pedir maioria absoluta para as próximas eleições.

O que Costa disse (e o que quis dizer) no tiro de partida do ano eleitoral

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A verdade é que Rui Rio quer ser um político diferente e não quer fazer como os outros. A chamada “rentrée” é só mais um exemplo. Depois de ter mudado totalmente os moldes da festa algarvia, que há anos que se realizava no calçadão de Quarteira, em meados de agosto, e dava primazia ao discurso político do líder, Rio deixou claro que pretendia regressar ao espírito original do convívio, dispensando os autocarros que habitualmente levavam militantes de todo o país ao Algarve e que custava aos cofres do partido cerca de 80 mil euros.

Em declarações à Lusa no fim de julho, Rui Rio disse querer fazer regressar a tradicional festa algarvia do partido ao “espírito genuíno dos anos 70”, quando o Pontal nasceu como um piquenique, juntando-lhe atividades lúdicas. “O Pontal nasceu de uma forma genuína: começou por ser um piquenique de militantes do PSD no verão e depois cresceu, porque está lá muita gente que não é do Algarve de férias, e cresceu bem. Mas, a partir de uma dada altura, desvirtuou-se“, disse na altura, lamentando que a festa se tenha transformado “primeiro num comício, depois num jantar, para onde o partido carregava camionetas de militantes para compor a moldura humana e aparecer na televisão com uma imagem de força”.

“Eu acho que isso não faz sentido nenhum, não só porque é dispendioso, como dá uma imagem que depois não corresponde à realidade”, disse na altura, justificando a mudança.

A poupança, segundo chegou a explicar o secretário-geral, José Silvano, foi na ordem dos 60 mil euros. Pôr as contas do partido em dia e “arrumar a casa” tem sido, de resto, o mote da direção do PSD. Esta sexta-feira, depois de o jornal i ter noticiado que o PSD estava a pôr em tribunal os candidatos às autárquicas que tenham tido gastos excessivos e se estejam a recusar a pagar, Rui Rio falou aos jornalistas em Monchique a explicar a medida. A ideia, disse, não é atacar ninguém ad hominem mas sim instituir uma regra de “responsabilidade cívica” que, quem não cumpre, responde judicialmente pelo incumprimento. “Os partidos não podem ter um passivo monstruoso e depois dizerem ‘votem em nós’ para governar o país”, disse à margem de uma reunião com representantes de associações agrícolas e florestais de Monchique.

Ao 31º dia, Rio falou. “O PSD não fala com a mata a arder”

A ida a Monchique esta sexta-feira foi, na verdade, a primeira aparição pública do líder do PSD desde o dia 31 de julho. E, respondendo aos críticos que o acusaram de não ter interrompido as férias para comentar os mais diversos assuntos, Rio falou de quase todos eles — nem que tenha sido para repetir que não comenta. Foi o caso do Orçamento do Estado, cujas negociações à esquerda deverão ser retomadas nos próximos dias, e sobre o qual Rio insiste que só se pronuncia quando vir o documento; ou o caso da continuidade ou substituição da PGR, cujo mandato acaba em outubro, mas que Rio insiste que só falará depois de Marcelo e Costa se pronunciarem; ou o caso da saída de Santana Lopes do PSD, que Rio desvalorizou por achar que o PSD, “se quiser ganhar eleições”, não é à direita que vai roubar votos, mas sim ao centro.

Em todo o caso, as críticas internas continuam e as notícias desta sexta-feira sobre os processos judiciais interpostos pelo PSD contra os candidatos autárquicos do próprio partido, só serviram para espicaçar ainda mais os críticos. Miguel Pinto Luz foi um deles: “Se isto é a rentrée de combate político ao Partido Socialista depois de tudo o que aconteceu no país nas últimas semanas, melhor era continuarmos todos de férias”, disse. “Deixe de andar aos pontapés aos seus companheiros de partido”, já tinha dito o autarca de Cascais, Carlos Carreiras.

Rio, médio ofensivo, veste a camisola 7

Sendo ponto assente de que a festa do Pontal iria ser diferente dos últimos anos, não se sabia é que ia ficar marcada por um torneio de futebol protagonizado por algumas das principais figuras do partido de Rui Rio. O dia começará com o torneio de futebol de sete, entre quatro equipas, e acabará com a intervenção política do líder, pelas 17h. Ao que o Observador apurou, contudo, constituir as quatro equipas de sete elementos não foi tarefa fácil, e foi o próprio Rui Rio que pegou no telefone para ligar a autarcas e figuras do partido a fazer o convite. Depois de várias negas, o ex-ministro Miguel Poiares Maduro e o comissário europeu Carlos Moedas foram alguns dos contemplados que aceitaram participar.

Os dois jogos vão decorrer em simultâneo: a equipa dos autarcas joga contra a equipa dos dirigentes algarvios, e a equipa da direção nacional, onde joga Rui Rio, vai defrontar uma equipa com membros do Conselho Estratégico Nacional, com o coordenador David Justino à baliza. Depois, haverá uma final entre as duas equipas vencedoras.

O secretário-geral José Silvano, o líder parlamentar Fernando Negrão, o vice-presidente Morais Sarmento e os antigos governantes Miguel Poiares Maduro e Carlos Moedas farão parte da equipa da direção, que inclui também uma mulher, a vogal da Comissão Política Nacional Cláudia André. Salvador Malheiro, vice do partido e presidente da câmara de Ovar, jogará na equipa dos autarcas, e até o árbitro será do PSD: o deputado Rui Silva, que já jogou futebol profissional, terá a responsabilidade de arbitrar os jogos entre os dirigentes nacionais e os membros do CEN.

Rui Rio, segundo fonte da direção, vai mesmo vestir a camisola 7 ao jogar a “médio ofensivo”. Resta saber se não sairá lesionado.