A França defendeu esta quarta-feira que a NATO deve ter uma “conversa franca” com a Turquia para conhecer a posição deste aliado na Aliança Atlântica, num momento em que Ancara tem dado sinais ambíguos, nomeadamente na relação com a Rússia.

“Estamos na mesma aliança (…). Acho que vamos precisar rapidamente de ter com a Turquia uma grande conversa, pesada, franca, pública para saber de que lado está um, de que lado está o outro e onde estão os nossos interesses comuns e dizer tudo, caso contrário, não iremos sair disto”, declarou o chefe da diplomacia francesa, Jean-Yves Le Drian, numa intervenção no Senado (câmara alta do parlamento).

Impõe-se uma grande conversa . É essencial para as nossas relações com a Turquia, mas também é essencial dentro da Aliança Atlântica (…). A atualidade impõe-nos isso”, reforçou o ministro dos Negócios Estrangeiros francês.

O representante do governo francês identificou “pelo menos quatro ambiguidades” da Turquia em relação aos seus aliados da NATO: as relações com a Rússia, a intervenção contra os curdos sírios em outubro 2019, os diferendos relacionados com a delimitação das zonas marítimas no Mediterrâneo oriental ou, segundo o próprio apelidou, a “chantagem” migratória.

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“A Turquia acaba de pedir um apoio militar e medidas de reforço no domínio da defesa aérea e antimíssil à NATO e, ao mesmo tempo, está a comprar dispositivos antiaéreos S-400 à Rússia, cuja interoperabilidade no seio da NATO não está provada, pelo contrário”, destacou Jean-Yves Le Drian.

E prosseguiu: “Quando é atacada em Idlib [noroeste da Síria], a Turquia volta-se para a NATO a dizer que ‘quer a aplicação do Artigo 4.º’ que pede a solidariedade dos aliados (…) mas ao mesmo tempo instrumentaliza com cinismo os migrantes“.

Segundo o Artigo 4.º do Tratado de Washington, qualquer aliado da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO, na sigla em inglês) pode solicitar consultas quando acredita que a sua integridade territorial, independência política ou segurança estão ameaçadas.

A Turquia invocou, na semana passada, o Artigo 4.º depois da morte de 33 soldados turcos na Síria em ataques atribuídos ao regime sírio, que conta com o apoio de Moscovo.

Após uma reunião de urgência, a NATO expressou “total solidariedade” com a Turquia e exortou o regime sírio e a Rússia a pararem os “ataques indiscriminados” em Idlib.

Apesar desta manifestação, os aliados não assumiram, porém, novos compromissos concretos para ajudar Ancara, que pede o estabelecimento de uma zona de exclusão aérea no noroeste da Síria para impedir que aviões do regime sírio e do aliado russo realizem ataques.

Em outubro último, a Turquia realizou uma intervenção unilateral contra os nossos aliados curdos no âmbito da coligação internacional contra o Estado Islâmico, da qual a NATO é membro, da qual a Turquia é membro”, realçou o ministro francês.

Jean-Yves Le Drian frisou também que as tensões relacionadas com a delimitação de fronteiras marítimas no Mediterrâneo oriental, que envolvem outro membro da NATO (a Grécia), acentuaram-se em novembro último com a conclusão de um acordo controverso entre Ancara e o Governo de Acordo Nacional líbio.

Tal acordo permite à Turquia reivindicar direitos sobre vastas áreas marítimas ricas em hidrocarbonetos, em prejuízo da Grécia, Egito, Chipre e de Israel.

Jean-Yves Le Drian lembrou também, entre outros aspetos, o “rompimento pelo exército turco do embargo (de armas) decidido pelas Nações Unidas sobre a Líbia”.

Durante a intervenção no Senado, o ministro francês também referiu a questão migratória que envolve a Turquia.

As autoridades turcas, que acolhem no seu território cerca de quatro milhões de refugiados, anunciou na sexta-feira ter aberto as fronteiras com a Europa, ameaçando deixar passar migrantes e refugiados, numa aparente tentativa de pressionar a Europa a assegurar-lhe um apoio ativo no conflito que a opõe à Rússia e à Síria.

A União Europeia e a Turquia celebraram em 2016 um acordo no âmbito do qual Ancara se compromete a combater a passagem clandestina de migrantes para território europeu em troca de ajuda financeira num valor total de 6 mil milhões de euros para financiar o acolhimento dos refugiados, especialmente os sírios que fogem da guerra.