“Desagradado? Quando se sai numa partida como esta, é normal. O Cristiano sabe que é nosso ponto forte mas também que deve respirar para estar sempre no topo”. A menos de 15 minutos do final da primeira mão da meia-final da Taça de Itália, em Milão, Andrea Pirlo trocou Ronaldo por Morata e o português saiu de campo com cara de poucos amigos. O técnico relativizou, o avançado também já se tinha esquecido pouco depois. Ainda hoje, aos 36 anos, o capitão da Seleção continua com o mesmo foco: golos, vitórias, títulos – e de quando em vez um descanso mas em jogos que permitam essa pausa. O que, a partir desta fase da temporada, deixou de existir.

22 golos em 23 jogos, oitavo bis da época, reviravolta com o Inter. Este é Ronaldo. E faz na sexta-feira 36 anos

Quatro dias depois, em mais um encontro decisivo na Serie A frente a uma Roma que partia à frente da Juventus na classificação, Ronaldo voltou a ser titular, voltou a fazer a diferença e desta vez cumpriu os 90 minutos. Marcou um golo, teve uma bola na trave que ainda foi confirmar ao relógio do árbitro e à indicação dada pela tecnologia na linha se não tinha mesmo entrado, obrigou Pau López a uma grande intervenção e continuou em busca de mais oportunidades mesmo depois do 2-0, num autogolo a cerca de 20 minutos do final. Apesar dos sinais apresentados no plano defensivo pelos bianconeri, cada vez mais sólidos não só no setor recuado mas também no próprio jogo coletivo sem bola, Pirlo não arriscou pela importância dos três pontos e manteve o avançado para o que desse e viesse. Ainda assim, aqueles 15 minutos sempre tinham dado para “respirar” mais um pouco.

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Desde que chegou aos 30 e apenas em seis anos, o português marcou 300 golos, o último dos quais diante da formação romana apenas um dia depois do 36.º aniversário. Ou seja, grosso modo, uma média de 50 golos por temporada apenas em 326 jogos (média de 54 por época). E numa altura em que se torna alvo de comparações a qualquer registo que atinja, este é talvez o ponto que melhor define aquilo que é hoje Ronaldo: se Pelé, que fez a maioria dos golos na carreira até aos 23 anos, marcou 127 golos depois dos 30 (17% do total de golos), e se Messi, com 33 anos e meio, marcou 157 depois dos 30 (22% do total de golos), Ronaldo marcou 39% depois de entrar na casa dos trinta, em mais uma prova do cuidado e do profissionalismo que sempre teve na carreira.

300.º golo em 326 jogos, seis anos depois: os trintas trouxeram um Ronaldo ainda melhor (e a dar vitórias à Juventus)

Foi isso que lhe permitiu chegar onde chegou, é isso que lhe permite estar onde está. E seria isso que, mais uma vez, permitiria que entrasse de início na equipa de Pirlo para a segunda mão da meia-final, depois de uma vitória por 2-1 no primeiro jogo com bis do português. De início e até aos 90 minutos, estando algumas vezes desapoiado na frente mas vendo a Juventus confirmar mais um bom desempenho em termos defensivos que manteve o nulo até ao final e deu mais uma oportunidade ao avançado de ganhar o único título que ainda lhe falta em Itália, a Taça, depois da derrota nos quartos com a Atalanta em 2019 e da final perdida com o Nápoles em 2020.

Com nova aposta de Pirlo nos centrais mais jovens (De Ligt e Demiral) em vez dos mais experientes (Bonucci e Chiellini), e com outras nuances como a colocação de Cuadrado à frente de Danilo na direita e a dupla Kulusevski e Bernardeschi no apoio mais direto a Ronaldo, a Juventus foi tentando fazer um jogo de maior domínio e controlo em posse que pecou pela falta de capacidade em esticar mais vezes até ao último terço, perante um Inter que criou sempre mais perigo quando saía em transição e que teve boas oportunidades por Lukaku, na sequência de um livre tenso de Eriksen, e Lautaro Martínez, sempre com o apoio de Hakimi pela direita que voltou a ser a unidade mais desequilibradora pelo corredor lateral permitindo mais jogo pelo meio de Barella.

As características mantiveram-se após o intervalo mas as substituições dos dois técnicos tiveram o condão não só de melhorar a ocupação de espaços da Juventus sem bola com McKennie no lugar de Bernardeschi como uma quebra do conjunto de Milão, mesmo com Perisic e Sensi já em campo. E foi nessa fase que Ronaldo, que já tinha ameaçado no final da primeira parte, mais conseguiu brilhar, sobretudo numa jogada individual onde tirou três adversários da frente e rematou para a segunda grande intervenção de Handanovic a evitar o golo da equipa de Turim. Pirlo lançou depois Chiellini no lugar de Cuadrado, recuperou a linha de três defesas que muitas vezes se transformou em cinco perante a pressão do Inter mas aguentou o nulo entre alguns sustos pelo meio.