São 10h30 da manhã e uma pequena comitiva de Rui Moreira espera pelo recandidato à presidência da Câmara Municipal do Porto à porta do antigo hospital Joaquim Urbano. Lá dentro, algumas das paredes que serviram cuidados de saúde estão hoje dedicadas à ação social, graças ao Centro de Acolhimento para pessoas em situação de sem-abrigo. Rui Moreira e Fernando Paulo, vereador da Habitação e Coesão Social, abrem o caminho naquele que é um projeto que pode vir a crescer.

Mas antes da visita que o autarca fez pelo local, os números (também eles fornecidos pela pelo executivo): há quatro anos o Porto tinha “mais de 700 pessoas em situação de sem-abrigo”, mais de 200 sem teto — sendo que nesta definição também são consideradas as pessoas que estão em residências de acolhimento ou habitações partilhadas incluídas nos programas de ação social. Agora, o número desceu para 520 pessoas, ainda que 190 continuem nas ruas. 

Mas não é suficiente e o presidente da câmara culpa o poder central: “Esta é uma resposta que devia ter sido dada pela Segurança Social, conseguimos constituir uma resposta que resulta de uma vontade política e de instituições, mas temos ouvido promessas de que vai haver milhões e o que verificamos é que resposta devia ter outra dimensão.” Rui Moreira apercebeu-se que muitas das pessoas que ali vivem não são do Porto, vêm de outros locais à procura de apoio e considera que “esta é uma resposta que deve ser construída em rede e que o Estado não se pode demitir destas funções”.

A Câmara Municipal do Porto está a explorar parte das instalações que pertencem ao centro hospitalar e Moreira admite que o executivo gostaria de ficar com a totalidade do espaço para dar mais respostas. Por enquanto, aquele local tem espaço para 40 utentes e sete vagas estão por preencher. Quando sobe as escadas que dão acesso à parte frontal do edifício, a “Dona Hermínia” dá as boas-vindas. Vive ali há vários anos, todas a conhecem. E está bem, “comer e beber” é o que mais gosta. E tirar fotos com o presidente da cidade. Rui Moreira ainda estava a subir as escadas e a câmara já estava pronta para filmar.

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É naquela mesma porta que está uma folha que diferencia aquele centro de acolhimento. “Permitidos animais de companhia.” E não só, os casais também não são separados quando ali entram, podem ficar juntos. Moreira lembra que esses são alguns dos “mitos” que existem sobre estes locais e que afastam as pessoas. “Se as pessoas começarem a perceber que há respostas, que aqui há distribuição de metadona, que não têm de ficar cá presos porque não podem sair durante o dia…”, explica, crente de que poderá aumentar o número de pessoas que procura ajuda.

A visita prossegue pela cantina, os quartos, a enfermaria, a sala de estar, mas o ponto alto é a chegada ao restaurante solidário. São já três na cidade e o quarto vai abrir na zona de Massarelos até ao final do ano. São 550 refeições diárias nos três estabelecimentos e Rui Moreira orgulha-se do projeto que travou a distribuição de comida na rua que diz ser “medieval”. Cheira bem, é dia de feijoada e todas as pessoas podem ir ali buscar comida. Agora, devido à Covid-19, apenas há take away, mas antes era um “restaurante normal”.

Quem por ali passa tem como objetivo ser integrado na sociedade, há uma oficina de carpintaria que realça o talento de muitos, nomeadamente do senhor Dantas, que está a dourar uma cadeira de madeira porque já o fazia no passado. Muitas das pessoas acabam por procurar aquela técnica, cada um paga o que quer e todo o dinheiro é dos utentes. Mas a meta é mesmo arranjar trabalho. As responsáveis acreditam que será fácil no caso do senhor Dantas.

E na rua, a horta de que Cristina trata há quatro meses. Vivia na rua, é de Gaia e “gosta muito” de estar no centro de acolhimento. Mas entre a terra e a rega, sabe que aquele é um local passageiro e admite que o objetivo é um dia sair dali. Quando for possível.