O primeiro-ministro pede à presidente do Banco Central Europeu prudência na retirada dos estímulos às economias europeias durante o período de recuperação. Numa intervenção na sessão comemorativa do 175º aniversário do Banco de Portugal onde esteve Christine Lagarde, António Costa aproveitou também para enviar recados para o exterior — até mudou de língua — para garantir o compromisso de fazer o que for preciso por “finanças públicas sólidas” e para afirmar que esta é uma “nova dinâmica de convergência que importa agora não pôr em causa”.

O momento é de crise política, com o primeiro-ministro (e recandidato ao cargo em eleições a marcar) à espera da dissolução da Assembleia da República e António Costa aproveitou o palco para avisos e pedidos externos e internos. Só não respondeu aos jornalistas que fintou saindo pela porta lateral do Museu do Dinheiro.

A intervenção em português foi interrompida, a dada altura, pelo inglês. “That’s why it is now our time to say that we will do whatever it takes to ensure sound public finances.” A garantia que as instituições internacionais esperam num momento de instabilidade política e com fundos europeus a chegarem ao país (por vida do Plano de Recuperação e Resiliência e por via do próximo quadro comunitário) foi feita de forma a chegar, direta, a todos os cantos, com Costa a a dizer que “fará o que for preciso para garantir finanças públicas sólidas”. O “whatever it takes” dito desta forma permitiu uma colagem à famosa frase de Mario Draghi, quando em 2012 era presidente do BCE, e travou o descontrolo do euro.

Sessão solene comemorativa do 175.º aniversário do Banco de Portugal. Com a presença do Governador do Banco de Portugal, Mário Centeno; Presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde; Primeiro-ministro, António Costa. Cerimónia realizou-se no Museu do Dinheiro. Lisboa, 3 de novembro de 2021. JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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Em português, imediatamente antes desta frase, Costa já tinha afirmado que “são as contas certas que garantem a credibilidade internacional de Portugal, permitindo-nos ter poupado 3.000 milhões de euros de juros da dívida anualmente face a 2015 e alcançar valores recorde no investimento contratado pela AICEP em 2018, 2019 e, novamente, em 2021″. Bandeiras que fará por agitar em campanha e que, nas negociações falhadas do Orçamento para 2022, foram um dos principais argumentos para travar as exigências à esquerda.

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A Lagarde, que o ouvia sentada no palco ao lado do governador do Banco de Portugal (e ex-ministro das Finanças de Costa) Mário Centeno, avisou que “uma retirada precoce dos estímulos, sem a necessária flexibilidade ou gerando incerteza, colocará em causa a força da recuperação.” Já tinha ouvido algo nesse sentido.

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“É fundamental que a política monetária acompanhe a evolução das nossas economias, assegurando uma recuperação robusta e sustentada de todos os países da área do euro”, disse Costa que apontou a ação do Sistema Europeu de Bancos Centrais como “fundamental para os resultados alcançados na UE e também em Portugal”. E ainda a este propósito, o primeiro-ministro lembra que “as respostas nacionais nunca serão suficientes e deverão ser conjugadas, nomeadamente, com uma política monetária que assegure condições de financiamento favoráveis à consolidação da recuperação, adaptando-se, de forma gradual, ao fim do período de emergência“.

A intervenção seguiu entre este compromisso perante as instituições europeias e também os pedidos para que a política monetária não descole. “Cada um só estará seguro quando todos estivermos seguros, também na recuperação económica a mesma só será sustentável quando todos os estados membros estiverem numa trajetória robusta de recuperação”, avisou. E elencou mesmo conquistas que diz dividir com essa ação externa, como os “mínimos históricos, em cerca de metade de 2019” dos custos da emissão da dívida pública, ou a ausência de limites ao crédito das empresas ou ainda os “mínimos históricos” das “taxas de juro enfrentadas pelas empresas” durante a crise.

Sessão solene comemorativa do 175.º aniversário do Banco de Portugal. Com a presença do Governador do Banco de Portugal, Mário Centeno; Presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde; Primeiro-ministro, António Costa. Cerimónia realizou-se no Museu do Dinheiro. Lisboa, 3 de novembro de 2021. JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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Foram medidas que o primeiro-ministro socialista argumenta terem ido no sentido inverso de outras crise, referindo em concreto a de 2011 (com a entrada da troika no país) e a ação europeia de então. “As medidas adotadas de forma tempestiva foram essenciais para – e ao contrário do que aconteceu na crise financeira anterior — assegurar estabilidade financeira, garantir a necessária provisão de liquidez e evitar a fragmentação dos mercados que, num contexto de elevada incerteza, teria impedido as respostas nacionais em muitos Estados Membros”, sublinhou perante Lagarde que estava sentada no palco ao lado do governador do Banco de Portugal, o seu ex-ministro das Finanças Mário Centeno.

Mais do que uma vez Costa repetiu que “as respostas nacionais nunca serão suficientes” e têm de ser articuladas com uma política monetária concreta. Mas para isso também pediu passos concretos: “completar o processo da União Bancária “sob pena de impedir a materialização plena dos seus benefícios e de criar distorções na afetação de recursos entre economias, prejudicando aquelas que, como a nossa, têm uma escala menor”; “desbloquear o impasse” no Sistema Europeu de Seguro de Depósitos; “prosseguir de forma decisiva com a União dos Mercados de Capitais”. Isto além de defender que a “governação económica e orçamental da UE tem também uma oportunidade de ouro para ser revista e melhorada, incluindo no quadro de novos instrumentos e mecanismos europeus”.

Terminou a garantir que as suas “políticas económicas e sociais estão plenamente alinhadas” com os objetivos de recuperação europeus. Neste momento só não tem a certeza de as poder continuar.

Sessão solene comemorativa do 175.º aniversário do Banco de Portugal. Com a presença do Governador do Banco de Portugal, Mário Centeno; Presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde; Primeiro-ministro, António Costa. Cerimónia realizou-se no Museu do Dinheiro. Lisboa, 3 de novembro de 2021. JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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