É uma das cicatrizes (que continua por sarar) do ataque terrorista de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos, em que morreram quase 3.000 pessoas quando terroristas da Al-Qaeda lançaram aviões contra as torres do World Trade Center em Nova Iorque e contra o Pentágono em Washington.  Cumprem-se esta terça-feira 20 anos desde que os primeiros 20 presos da “guerra contra o terrorismo” desembarcaram na baía de Cuba, em Guantánamo. A primeira imagem divulgada mostrava homens de fato-macaco laranja, encapuçados e de joelhos no campo Ray-X, cercados por arame farpado: seriam “os piores dos piores”, na expressão de Donald Rumsfeld, então secretário da Defesa dos Estados Unidos.

Por aquele arame farpado passaram cerca de 780 detidos, muitos deles empurrados arbitrariamente do campo de batalha para lá. Um estudo, citado pelo The Guardian, descobriu que 55% dos detidos não cometeram atos hostis contra os EUA ou contra os seus aliados. Atualmente, (sobre)vivem 39 presos em Guantánamo, a maioria sem acusações criminais, de acordo com o The New York Times, que vai mantendo atualizada uma listagem dos prisioneiros.

A tortura, ou as “técnicas de interrogatório agressivas” como intitulava eufemisticamente a CIA, tornaram-se marca da violação de direitos humanos e hoje coloca-se em causa as alegações obtidas desta forma. Entre elas, estava a pancada facial, confinamento apertado, nudez forçada 24 horas por dia e afogamento simulado.

O diário do mais famoso preso de Guantánamo. E o relato (censurado) das suas torturas

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Entre a tortura e o medo, nem Portugal passou imune. A cronologia é simples: em 2008, um relatório da organização não-governamental Reprieve demonstrou, nas suas palavras, “inequivocamente que 728 de 774 prisioneiros de Guantánamo foram transportados através de jurisdição portuguesa” em pelo menos seis ocasiões diretamente da base das lajes dos Açores. Em 2009, chegaram a Portugal dois ex-presos sírios de Guantánamo, anunciava o ministério da Administração Interna. Em 2010 vieram à tona os telegramas do Wikileaks, que confirmaram que o governo deu “luz verde” à passagem de prisioneiros que saíam da base de Guantánamo.

Obama prometeu fechar a prisão, mas não conseguiu cumprir a promessa, apesar de a ter esvaziado significativamente. Quando chegou à Casa Branca, em janeiro de 2009, havia 240 prisioneiros em Guantánamo e, no fim do mandato, já só lá estavam 41, tendo enfrentado grande oposição no Congresso norte-americano. Trump deu um passo atrás, ao recusar fechá-la. O legado continua com Biden, que parece querer retomar os esforços de Obama, porém, até agora, libertou apenas um detido, no último verão (fora as dificuldades em encontrar países disponíveis para receber os detidos que faltam, quando até estados norte-americanos recusam recebê-los nas suas prisões). E a pergunta mantém-se: Até quando ficará aberta?

Sobre o crucial — os julgamentos — os mais importantes terroristas continuam por julgar, nomeadamente o autoproclamado orquestrador do 11 de setembro, Khalid Sheikh Mohammed.

E enquanto não se faz justiça e, segundo um relatório da organização Human Rights Watch (HRW) divulgado no domingo, os EUA gastam 540 milhões de dólares (cerca de 477 milhões de euros) por ano apenas para manter detidos em Guantánamo. Além disso, o Pentágono pediu 88 milhões de dólares (aproximadamente 77 milhões de euros) para a construção de um hospício para os detidos idosos, noticiou o The New York Times.

Estes são apenas alguns dados e momentos que marcam 20 anos de um dos capítulos mais controverso da história dos EUA. Veja a fotogaleria do Observador, onde há mais factos referidos.