O antigo primeiro-ministro britânico Boris Johnson negou esta terça-feira ter mentido intencionalmente no parlamento sobre a realização de festas na residência oficial durante a pandemia de Covid-19, num documento submetido ao inquérito parlamentar em curso.

“Não enganei a Câmara dos Comuns (câmara baixa do parlamento) intencionalmente ou inadvertidamente em 1 dezembro de 2021, em 8 de dezembro de 2021, ou em qualquer outra data. Nunca sonharia em fazê-lo”, afirmou Boris Johnson, citado no documento esta terça-feira conhecido.

No testemunho, Johnson admite que a câmara possa ter sido induzida em erro pelas suas declarações, garantindo, porém, que as regras e orientações foram completamente seguidas e que as suas declarações foram feitas “de boa fé”.

O documento de 52 páginas é um testemunho escrito de defesa à Comissão dos Privilégios, que vai interrogar pessoalmente o antigo primeiro-ministro na quarta-feira.

Em causa estão várias “festas” realizadas no número 10º de Downing Street, edifício da residência e escritório oficiais do primeiro-ministro britânico, entre 2020 e 2021, que violaram as restrições impostas na altura devido à pandemia de Covid-19, um escândalo que ficou conhecido por “Partygate”.

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Boris Johnson encorajou festas semanais em Downing Street durante confinamentos

A polícia britânica aplicou no total 126 multas pela violação das restrições da pandemia de Covid-19 em edifícios do Governo, incluindo a Johnson, à sua mulher Carrie e ao sucessor Rishi Sunak, então ministro das Finanças.

Na sua argumentação, Johnson queixa-se do tom “altamente tendencioso” de um dos relatórios produzidos pela comissão parlamentar, e afirma ser claro no material divulgado até agora que “não existem quaisquer provas que sustentem uma alegação” que ele enganou “intencionalmente ou inadvertidamente” a Câmara dos Comuns.

“A única exceção são as afirmações do desacreditado Dominic Cummings, que não são apoiadas por qualquer documentação”, referiu Boris Johnson, numa referência ao seu antigo assessor, o qual afirma ter um “rancor” contra o antigo chefe.

A Comissão dos Privilégios Parlamentares escreveu no documento que “as provas sugerem fortemente que as violações das regras teriam sido óbvias para Johnson na altura em que estas reuniões ilegais estavam a ter lugar”.

No testemunho, Johnson alega ser “importante compreender o contexto em que as pessoas estavam a trabalhar no número 10º (de Downing Street) durante toda a pandemia”, com dias de trabalho longos e intensos.

No documento de defesa, alega também que ainda não percebeu porque foi multado pela polícia por ter participado num evento em que foi celebrado o aniversário.

Nunca me foi fornecida qualquer fundamentação pela polícia, em particular, como é que alguns indivíduos que compareceram não foram multados”, acrescentou.

Sobre uma festa no jardim onde foi consumido álcool e comida, o antigo primeiro-ministro britânico argumentou que se “tratava de uma reunião ao ar livre socialmente distanciada, para estimular o moral do pessoal e o trabalho de equipa depois do que tinha sido um período muito difícil”.

“Na minha opinião, uma oportunidade de agradecer ao pessoal e de elevar a moral era essencial para fins laborais”, vincou. O inquérito parlamentar sobre se o antigo primeiro-ministro mentiu no parlamento pode resultar na suspensão e perda de mandato.

A Comissão de Privilégios é composta por sete deputados, a maioria do Partido Conservador (força partidária de Johnson), embora seja presidida pela deputada trabalhista Harriet Harman.

O antigo primeiro-ministro vai ser interrogado na quarta-feira a partir das 14h00 e durante até quatro horas.

Se a comissão considerar Boris Johnson culpado, poderá pedir a suspensão do parlamento, medida que terá de ser votada pela Câmara dos Comuns.

Se for aprovada uma suspensão durante 10 dias de plenário, a legislação abre a possibilidade de o deputado ser deposto por uma petição para forçar a renúncia subscrita por 10% dos eleitores registados no círculo eleitoral de Uxbridge.

O inquérito tem sido sujeito a varias tentativas de desautorização por parte de aliados de Johnson, com o antigo ministro da Economia Jacob Rees-Mog a chamar-lhe “pseudotribunal” (‘Kangaroo court’) e o lorde Stephen Greenhalgh a apelidar o processo de “caça às bruxas”.