O Conselho de Fiscalização das secretas insiste: não houve nada de ilegal na atuação do SIS quando recuperou o computador do ex-adjunto de João Galamba, Frederico Pinheiro. Isto apesar de não ter ouvido o próprio: segundo o órgão, que esteve esta quarta-feira a dar novas explicações no Parlamento, não cabe ao conselho fazer “acareações” ou “confrontar terceiros com as suas declarações”.

Após uma audição parlamentar feita à porta fechada e pedida pela Iniciativa Liberal para questionar o Conselho de Fiscalização do SIRP sobre a uma “alegada violação dos deveres de independência e imparcialidade”, o conselho presidido pela socialista Constança Urbano de Sousa e composto também por Joaquim da Ponte (indicado pelo PSD) e Mário Belo Morgado (pelo PS) emitiu um comunicado em que garante que “não existem indícios de uma atuação ilegal do SIS”.

[Já saiu: pode ouvir aqui o penúltimo episódio da série em podcast “Piratinha do Ar”. É a história do adolescente de 16 anos que em 1980 desviou um avião da TAP. E aqui tem o primeiro, o segundo, o terceiro e o quarto episódios. ]

Para o Conselho, “tendo em consideração um contexto preexistente e os dados naquele momento disponíveis” o diretor do SIS achou que se “impunha desenvolver diligências” para prevenir que documentos confidenciais e classificadados fossem “comprometidos”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Quanto às acusações de que o SIS tem sido alvo por contactar um cidadão a meio da noite e exercer funções que poderiam caber à polícia, a resposta é que o SIS “não usou meios que lhe estivessem vedados”, uma vez que Pinheiro “manteve uma conversa telefónica” com um agente e disponilizou-se para lhe entregar “voluntariamente” o computador, como disse aos jornais.

Esta era uma das principais questões que a IL suscitou quando pediu esta nova audição dos fiscalizadores, defendendo que essa “omissão” contribuía para o “incumprimento grave dos especiais deveres” do órgão, que considerava ter sido parcial neste processo ao só ouvir a versão do SIS. Até porque, quando foi ouvido na Comissão Parlamentar de Inquérito, Frederico Pinheiro garantiu ter sido “ameaçado” pelas secretas, mas o Conselho de Fiscalização não fez referência a essas declarações.

Fiscalizadores fazem “interpretação ampla” das funções do SIS

Dentro da reunião, apurou o Observador, os representantes do órgão insistiram na versão da legalidade do SIS, que tem sido amplamente questionada — “não mexeram um milímetro” em relação ao que já tinham dito ao Parlamento, diz fonte presente no encontro — com o seguinte raciocínio: o SIS tem entre as suas funções prevenir o tal comprometimento de documentos classificados, e o “contacto” com cidadãos insere-se nesse ciclo de “produção de informação” necessário para poder exercer as suas atividades. É preciso, justificam os fiscalizadores, interpretar as funções do SIS de forma ampla.

Ou seja, na versão do Conselho de Fiscalização, o SIS precisaria de falar com Frederico Pinheiro para perceber o que estava em causa, mas o caso só se tornaria de polícia se o ex-adjunto tivesse recusado entregar voluntariamente o computador. Nesta reunião, apurou o Observador, os fiscalizadores não voltaram a explorar a questão de haver, ou não, indícios de crime — já tinham afirmado no Parlamento que não, o que contraria a versão do Governo, que começou por afirmar que estaria em causa um roubo; desta vez, questionados sobre o mesmo ponto, mantiveram-se em silêncio.

Houve deputados que expressaram dúvidas sobre se, nesse caso, não havendo indícios de crime, fazia sentido a intervenção da Polícia Judiciária — ao que os representantes do Conselho terão respondido com uma falta de articulação “histórica” entre as duas instituições, mas que não põe em causa a legalidade da atuação do SIS.

Pinheiro lido pelo jornal e uma não-resposta sobre chefe de gabinete

Também dentro da reunião, os fiscalizadores explicaram que leram a versão de Frederico Pinheiro nos jornais — as tais “declarações públicas” a 28 e 29 de abril referidas no comunicado, uma vez que o ex-adjunto só foi explicar-se ao Parlamento mais tarde – e que esta batia certo com a versão das secretas, justificando assim que não tenham tido a iniciativa de ouvir o antigo colaborador de Galamba.

Segundo fontes presentes na reunião, Constança Urbano de Sousa, Joaquim da Ponte e Mário Belo Morgado foram ainda questionados sobre se sabiam qual tinha sido o procedimento exato que a chefe de gabinete de João Galamba, Eugénia Correia, usou para acionar o SIS, e não responderam. Uma omissão registada pelos deputados e interpretada como uma falha grave num processo em que o objetivo passava precisamente por perceber se a atuação do SIS foi legal.