“É um belíssimo Orçamento”. A frase é de Pedro Nuno Santos que quando se estreou no comentário televisivo, há uma semana, prometeu não vir para fazer oposição. No entanto, o elogio ao Governo ficou apenas por esta frase, esta segunda-feira, com o socialista a discordar da velocidade de Fernando Medina na redução do défice (até ao excedente) e da dívida pública. O socialista diz que o Governo devia ter aproveitado “parte” do excedente para “resolver problemas da administração pública”, nomeadamente aumentar médicos e descongelar a totalidade das carreiras dos professores.

Foram os dois exemplos que colocou à cabeça quando afirmou que, no Orçamento, “obviamente que era possível fazer diferente, desde longo cumprir a trajetória de redução da dívida que tinha sido apresentada no Programa de Estabilidade”. Pedro Nuno Santos fez mesmo as contas entre o que era previsto (0,9% de défice) e o que é apontado para este ano (excedente de 0,8%): “É um desvio de 4,4 mil milhões de euros que não chegam à economia. Uma margem muito importante que poderia ser usada, parcialmente, para resolver problemas na administração pública”.

Para o socialista da ala esquerda do partido, “é positiva a redução da dívida”, mas o país “precisa de ter uma economia capaz de produzir” para que possa manter o uma linha de continuidade no investimento público, “pôr a economia a funcionar melhor e arrecadar mais receitas”.

Já sobre os dois exemplos que deu e que podiam ter beneficiado de uma utilização imediata de parte do excedente, Pedro Nuno considera “fundamental que o Governo consiga fazer as pazes com grupos profissionais que estão em guerra”. E começou pelos médicos, que tiveram “perdas reais do poder de compra superiores a 20%” nos últimos anos, afirmou. “Podemos investir na Saúde dignificando a carreira dos médicos”, defendeu o socialista quando analisava a previsão da existência de um excedente orçamental este ano e no próximo.

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Para os professores também considera que era importante investir na atração e retenção na profissão. “O Estado tem de perceber que tem de pagar para conseguir atrair e reter professores”, disse, defendendo mesmo que “o Governo deve procurar repor o que foi congelado em determinado momento”. Quando a jornalista perguntou se se referia à totalidade do tempo que ainda não foi descongelado (seis anos, seis meses e 23 dias), Pedro Nuno foi claro: “Sim”.

A terceira aplicação para a margem orçamental de que o Governo dispõe é no investimento em investigação e desenvolvimento, onde o país está abaixo da média da OCDE, argumentou ao mesmo tempo que defendia a importância da “qualificação da economia”.

Quanto ao fundo de investimento estruturantes que Medina propõe criar para guardar o excedente deste ano, Pedro Nuno Santos admite que “a ideia é boa, mas se não se reduzir a um fundo de títulos da dívida pública e se servir para financiar novo investimento público”. “O país precisa de um nível de investimento público que não tem há muito tempo, precisa de um fluxo constante”, afirmou neste ponto.

Ainda que o ministro das Finanças tenha anunciado o fim da necessidade de uma autorização das Finanças sobre a tutela setorial para alguma despesa pública, o deputado do PS diz que os verdadeiros problemas estão na lei de execução orçamental. “Desde a troika que foi construído todo um aparelho de controlo que tem vindo a ser desconstruído mas tem de continuar porque permanentemente são precisas autorizações das Finanças”, garante o ex-ministro das Infraestruturas, avançando com exemplos — incluindo a saída do presidente da CP Nuno Freitas, em 2021, devido a problemas burocráticos da gestão pública.

O comentário terminou com uma pergunta sobre as declarações do presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, ao PCP e ao BE na reação ao ataque do Hamas a Israel. Moedas disse que “antes o racismo estava só na extrema-direita. Mas temos visto uma extrema-esquerda racista, que apoia organizações terroristas que decapitam bebés”, dirigindo-se à falta de uma condenação do ataque nomeadamente pelo PCP. Para o socialista comentador, o ataque deve ser “condenado sem mas. Não deve haver nenhum humanista que não faça esta condenação”. E cita Francisco Assis: “Não se responde à barbárie com a barbárie”. No entanto, atirou a Moedas, considerando a sua afirmação “inaceitável”: “Percebe-se a tentativa de equiparar o BE e o PCP ao Chega. Mas não há nenhum cidadão português que diga que são partidos racistas e xenófobos”, afirma, defendendo os antigos parceiros do PS na geringonça.

Um ataque que volta a dividir partidos em Portugal. Mas desta vez PCP não está isolado no silêncio sobre violência do Hamas