O Banco Central Europeu (BCE) decidiu nesta quinta-feira baixar a taxa de juro de referência para 0,05%, novo valor mínimo em toda a história da moeda única europeia. Os governadores da autoridade monetária da zona euro optaram, assim, por reduzir em dez pontos-base a taxa diretora que estava fixada em 0,15% desde 5 de junho.

A taxa a que o BCE remunera os depósitos efetuados pelas instituições financeiras da zona euro foi baixada para um valor negativo de 0,2%, num movimento que tem por objetivo incentivar os bancos a procurarem aplicações mais atrativas, nomeadamente através do financiamento das empresas. estimulando a atividade, o investimento e a criação de empregos.

Os governadores analisaram, de acordo com a Reuters, o lançamento de um programa de compra de títulos de dívida que atingiria o valor de 500 mil milhões de euros. O programa teria a duração de três anos e as aquisições começarão a ser concretizadas já em 2014, segundo as fontes citadas pela agência.

Numa decisão que não conseguiu recolher a unanimidade dos 24 participantes na reunião, o BCE confirmou ter decidido começar a comprar ativos e injetar, desta forma, liquidez na economia. “O eurosistema vai comprar uma ampla carteira de títulos simples e transparentes”, afirmou Mario Draghi durante a conferência de Imprensa que se seguiu ao encontro dos responsáveis da autoridade monetária, medida que se soma àquelas que foram anunciadas a 5 de junho de 2014.

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A propósito das medidas tomadas pelo BCE, Christine Lagarde, diretora do Fundo Monetário Internacional (FMI), afirmou: “consideramos muito bem-vindas as decisões assumidas” que “ajudarão a combater os perigos suscitados por um longo período de baixa inflação”. Em meados de julho passado, o FMI reviu ligeiramente em baixa a previsão de crescimento da zona euro em 2014, de 1,1% para 1%, e considerou que a recuperação económica “não é suficientemente forte”.

Uma diminuição da taxa de referência era esperada apenas por seis num grupo de 57 economistas que integram um painel da Bloomberg.

As decisões do conselho de governadores, reunido em Frankfurt, apanharam de surpresa economistas e analistas, mas trata-se de mais medidas que visam afastar a ameaça de deflação que pesa sobre a economia da moeda única. Uma diminuição da taxa de referência era esperada apenas por seis num grupo de 57 economistas que integram um painel da Bloomberg.

Também alguns analistas contactados pela Lusa tinham a expetativa de que o BCE não mexesse na taxa de juro de referência. Filipe Garcia, economista e presidente da IMF — Informação de Mercados Financeiros,  disse que “seria normal a manutenção das taxas de juro, uma vez que em junho foram anunciadas novas medidas de estímulo e de apoio à economia “. Teresa Gil Pereira, economista do BPI, afirmou ser “esperada a manutenção das taxas de juros nos níveis em que estão”. No mesmo sentido pronunciou-se Rui Serra, do Montepio, que acrescentou: “os nossos modelos para a condução da política monetária continuam a apontar para o mínimo de ciclo nos atuais 0,15%”.

O anúncio da instituição sediada em Frankfurt surge numa altura em que a zona euro e a maior economia da região dão sinais de debilidade. Na Alemanha, o segundo trimestre de 2014 foi marcado por uma contração de 0,2% mas, além do fraco desempenho da maior potência da zona, a economia da moeda única registou uma estagnação no mesmo período, quando a variação do produto é medida em relação ao período que decorreu de janeiro a março deste ano.

Os valores finais para agosto da taxa de inflação anual na zona euro, a variação do nível de preços entre um mês e o mesmo mês do ano anterior, serão divulgados pelo Eurostat a 17 de setembro.

A taxa de inflação ter-se-á ficado por 0,3% em agosto, de acordo com as estimativas do Eurostat, gabinete de estatísticas da União Europeia, longe do objetivo de 2% definido pelo BCE e agravando a ameaça de um período longo de baixo ritmo de evolução dos preços. Os valores finais para agosto da taxa de inflação anual, a variação do nível de preços entre um mês e o mesmo mês do ano anterior, serão divulgados pelo Eurostat a 17 de setembro.

A 23 de agosto, em Jackson Hole, nos Estados Unidos, onde a Reserva Federal de Kansas City acolhe, desde 1982, um encontro anual destinado a discutir políticas económicas, Mario Draghi, presidente do BCE, afirmou perante os representantes dos maiores bancos centrais do Mundo que, nos países da zona euro, o centro das preocupações está no elevado desemprego e na baixa inflação. Draghi adiantou que a flexibilidade das regras orçamentais poderia ser “usada para dar resposta à fraca recuperação e para abrir espaço aos custos das reformas estruturais necessárias”. Draghi defendeu que a grande procura de títulos da dívida tem de ser apoiada por uma política orçamental e por reformas estruturais que reforcem a recuperação da região.

As declarações de Mario Draghi foram bem recebidas em Itália e em França, países que têm apelado à flexibilização das condições de aplicação do Tratado Orçamental e do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Mas Berlim não gostou. O ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, afirmou que o presidente do BCE foi mal interpretado. “Conheço bem Mario Draghi”, afirmou.

A 5 de junho, a instituição liderada por Mario Draghi determinou a realização de duas injeções de liquidez de longo prazo, a quatro anos, em setembro e dezembro deste ano, no valor de 400 mil milhões de euros.

A 5 de junho, o BCE cortou a taxa de juro diretora para 0,15%, na altura um mínimo histórico que foi hoje superado, e colocou em valor negativo a taxa de depósitos. A instituição liderada por Mario Draghi decidiu, também, cortar em 10 pontos base a principal taxa de refinanciamento da zona euro, que estava desde novembro do ano passado nos 0,25%. Além disso, manteve em valores negativos (-0,10%) a taxa de depósitos, que estava em zero, para penalizar os bancos que depositam dinheiro na instituição, numa medida inédita com o objetivo de impulsionar o crédito. Manteve ainda nos 0,40% a taxa da facilidade permanente de cedência de liquidez, através da qual o banco central empresta dinheiro aos bancos a um dia.

Naquela data, a instituição liderada por Mario Draghi determinou a realização de duas injeções de liquidez de longo prazo, a quatro anos, em setembro e dezembro deste ano, no valor de 400 mil milhões de euros. “A primeira consistiria na realização de várias operações de refinanciamento de prazo alargado (ORPA), com maturidade até setembro de 2018, mas com a particularidade de estarem relacionadas com a concessão de crédito a particulares por parte dos bancos”, conforme explicou na altura a economista Inês Domingos, da Macrometria.

As duas operações iniciais, a realizar em setembro e dezembro de 2014, permitiriam aos bancos receberem liquidez até 7% do stock de crédito que concederam ao setor privado até dia 30 de Abril de 2014, excluindo crédito hipotecário. “No caso dos bancos comerciais portugueses”, explicou a economista, “os dados do Banco de Portugal sugerem que o montante que poderá ser alocado inicialmente se eleva a cerca 6.800 milhões de euros, enquanto na zona euro o montante inicial rondará os 400 mil milhões de euros”.

Numa segunda fase, entre março de 2015 e junho de 2016, “o BCE realizará operações trimestrais podendo os bancos solicitar liquidez até um máximo de três vezes o montante de crédito líquido de redenções que tenham concedido ao setor privado, excluindo hipotecas, entre 30 de abril de 2014 e a data da operação de refinanciamento, acima de um valor mínimo que será definido individualmente para cada banco”, disse Inês Domingos.