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Abel Xavier e o castigo depois do penálti no Euro 2000: "Não tive uma chamada por parte de ninguém da Federação, nem sequer de colegas"

Abel Xavier fala da seleção, de Ronaldo (e Messi), de Paulo Bento (e da Coreia do Sul) e por arrasto do Mundial 2002. Mas não esquece o momento que lhe marcou carreira, a mão para o penálti de Zidane.

Com 50 anos acabadinhos de fazer — nasceu a 30 de novembro de 72 em Nampula, Moçambique —, Abel Xavier ainda carrega consigo duas imagens: a do rebelde com o cabelo pintado de louro que manteve sempre ao longo da carreira; e a do jogador que, nas meias-finais do Euro 2000, caído na grande área, viu um remate do francês Wiltord bater-lhe na mão, numa jogada que acabaria num penálti convertido por Zidane, o famoso Golo de Ouro que colocou Portugal fora da final. Mas o defesa direito que fez toda a formação das seleções nacionais, foi Campeão do Mundo sub-20 em 91 com Carlos Queiroz, começou no Estrela da Amadora, saiu para o Benfica, passou pelo Roma, pelo Everton e Liverpool, pelo Hannover, pelo PSV, pelo Galatasaray e acabou ao lado de Beckham no projeto do LA Galaxy, somou uma carreira de 17 anos recheados de histórias.

Em vésperas do jogo de Portugal com a Coreia do Sul de Paulo Bento, que definirá se a equipa nacional passa em primeiro ou segundo do grupo, Abel Xavier fala do agora selecionador coreano que foi seu colega no Estrela, no Benfica e no Oviedo, mas também na seleção. Recorda o jogo com a Coreia em 2002 que eliminou Portugal logo na fase de grupos e as polémicas desse Mundial que começaram logo no estágio em Macau.

Ouça aqui a entrevista a Abel Xavier. 

Abel Xavier: “Fecho-me na casa de banho a chorar”

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Mas desfila também as memórias de toda a carreira, a começar na falta de apoio que sentiu da FPF e dos colegas, depois do castigo com que foi punido pela UEFA por incidentes em que garante não ter estado envolvido no pós penálti no Euro 2000. Fala da sua conversão ao islamismo como algo absolutamente tranquilo e uma opção tomada até pelas bases familiares, tendo já ido a Meca com a família real saudita, de quem é amigo.

Algo que não o impede de defender liberdade de escolhas — que quer para os dois filhos, um futebolista no Estrela da Amadora, outro formado em informática e a trabalhar numa secção do Banco de Portugal –, nem de dizer que o futebol devia ser um palco privilegiado para mostrar todas as diversidades, algumas das quais é embaixador. Ou sequer de criticar a escolha do Qatar para a realização do Mundial.

Mundial onde vê novamente uma grande geração de jogadores portugueses, acredita em Portugal na final, de preferência contra a Argentina. Porque Ronaldo e Messi a merecem, diz.

Começamos pela mão mais famosa do futebol português: a mão que deu a grande penalidade e o Golo de Ouro a França nas meias-finais do Euro 2000. Se o prolongamento tivesse continuado, a história do jogo poderia ter sido outra?
Sim, acredito que sim. Era uma geração muito especial, intitulada pelo povo português como a geração de ouro. Costumo dizer que é ouro escovado porque a geração de ouro polido foi esta que ganhou, a geração do Cristiano Ronaldo, que tem muito mérito, liderada pelo Fernando Santos. Claro que as pessoas estabelecem comparações entre gerações, mas depois existe o processo evolutivo do futebol, que faz a diferença. Temos de respeitar sempre porque, até na minha geração, existia uma anterior que também foi muito forte e muito falada. Acho que nunca tivemos um problema de matéria-prima, a meu ver a matéria-prima esteve sempre presente. O que aconteceu em 2000 foi um cruzamento, uma junção de duas seleções campeãs do mundo de Sub-20, em 1989 e 1991. Nós fomos vencedores a nível da formação durante 10 anos, desde os Sub-15 até aos Sub-20, mas depois de 1991 para 2000 ficámos nove anos num interregno. E, nesses mesmos nove anos a França ganhou dois Europeus e um Mundial.

E como é que se saltou daí para o sucesso no Euro 2000?
Houve um crescimento, tivemos de aprender por que é que perdíamos mais vezes. E penso que, em 2000, houve uma crença, até mais de balneário do que propriamente a partir das condições estruturais que tínhamos na altura. Foi mais balneário. Porque a junção foi muito feliz, quebrámos a clubite instalada em Portugal, os jogadores estavam a jogar nas melhores equipas da Europa e fizemos um voto de compromisso, de que fazia sentido olhar para aquilo que nos unia em termos de objetivos e fizemos a força do grupo. Que só foi quebrada, infelizmente, com a situação do lance do penálti. Porque o destino daquela geração era ir à final.

Quando o Wiltord remata e a bola vai mesmo bater na sua mão percebeu logo que ia dar penálti?
Esse Campeonato tem particularidades que vistas agora… Porque no momento é tudo muito rápido, tudo muito intenso. Com a Inglaterra, nós entramos logo a perder 2-0 aos 20 minutos. Recordo-me de que estávamos um pouco descrentes, com aquela mentalidade de apalpar o jogo, estudar o adversário, não ter um perfil dominante. É uma coisa que tem raízes quase culturais. E é engraçado porque não devia ser assim, em termos de mentalidade, porque já estávamos nos melhores clubes do mundo a lutar por títulos. Então porque é que no espaço da Seleção Nacional não tínhamos esse domínio em relação aos adversários? E é algo que ainda deixa vestígios, sequelas, para sermos verdadeiramente dominantes. Recordo-me de que, nesse jogo, estava na defesa e olhei para os meus colegas — Jorge Costa, Fernando Couto, Dimas e Baía — e tivemos uma conversa de “pessoal, vamos juntar-nos porque vamos ser goleados”. E é engraçado porque a mudança de abordagem, de confiança, foi através do golo do Figo. Se existe momento mais marcante do Euro é aquele pontapé incrível do Figo que faz o 2-1. A partir daquele momento há um desbloqueio mental em relação à nossa equipa. Chegámos ao intervalo e pedimos à equipa técnica que se ausentasse por 10 minutos, para nós ficarmos só a falar entre nós. E foi aí que dissemos “vamos até ao fim e vamos ganhar este Europeu”. Cresceu a força interior e o futebol que nós apresentámos foi um futebol de extrema qualidade, foi um futebol até dominante.

Fui castigado de forma indevida e numa situação onde tudo o que foi visível foi o lance do penálti. Mas o que aconteceu no balneário e o consequente castigo de nove meses sem ter feito nada. Entro no túnel e vou para a casa de banho, fecho-me na casa de banho a chorar. Depois, passado um mês e meio da situação, houve alguém que me ligou a dizer que tinha sido castigado nove meses. falei com o Jean-Louis Dupont, o advogado que ganhou a Lei Bosman, para perceber em que tipo de caso é que estava envolvido. E era uma coisa muito grande, como é que eu estava envolvido numa embrulhada daquelas?

E depois há aquele lance no último minuto.
E depois há o lance no último minuto. Esse lance tem muita história para se contar. Costumo dizer que sou suspeito porque sempre que digo que não tive intenção as pessoas dizem “epá, lá estás tu, não queres assumir”. De facto, a bola bateu-me na mão. Mas não tive intenção. E o que é que é a intencionalidade hoje em dia no mundo do futebol? Vemos situações surreais. Mas, naquela altura, a bola bateu-me na mão. E, se repararem nas imagens, estou dois ou três segundos no chão e estou a dizer “meu Deus, não marques”. Porque tenho noção de que a bola bateu na mão. Mas depois tenho noção também de que o árbitro não vê o lance, porque o árbitro não apita logo. A bola bate-me na mão, caio, peço para não marcar, ele não marca o penálti e o penálti só é marcado dois minutos depois. Através do fiscal de linha. E aí levantam-se várias questões que nunca foram apuradas concretamente, porque o lance acontece, o árbitro apita e o jogo acaba. Tinha havido a alteração da morte súbita, do Golo de Ouro, e nós nem tivemos tempo para reagir. Costumo dizer que há algumas alterações pontuais em que saímos valorizados, de certa maneira, há margem para reagir; mas no meu lance nem sequer tivemos margem para reagir. Portugal foi campeão da Europa em 2016 e passou em terceiro na fase de grupos, passou porque houve uma alteração nos regulamentos. Se não fosse assim, não tinha sido Campeão Europeu. Naquela altura, era morte súbita. E foi demasiado cruel para aquilo que nós tínhamos produzido, para o que tínhamos feito. E o que não entendo é: se o árbitro não viu, se o fiscal de linha foi pressionado pelos jogadores franceses e assinalou penálti, se o Trezeguet que chutou no enfiamento da jogada estava à frente do fiscal de linha a tirar-lhe a visão, como é que foi penálti? Há um conjunto de coisas que me leva a crer, sem dúvidas nenhumas, que há vários jogos dentro do mesmo jogo.

Portugal protest

O momento após a marcação do penálti que afastou Portugal da final do Euro 2000

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Já perdoou o que se passou e aquela suspensão de nove meses pela confusão no túnel depois do fim do jogo?
Sou uma parte menor no meio de um assunto que é nacional. Nós falamos sempre das coisas que nos marcam enquanto jogadores, quando estamos a construir uma carreira, um sonho, quando estamos a constituir família, mas depois deparamo-nos no meio de uma situação em que só me perguntava como é que era possível estar ali metido. Fui castigado de forma indevida e numa situação onde tudo o que foi visível foi o lance do penálti. As pessoas podem achar que fiz ou que não fiz mas está lá, são imagens públicas. Mas o que aconteceu no balneário e o consequente castigo de nove meses sem ter feito nada… Entro no túnel e vou para a casa de banho, fecho-me na casa de banho a chorar pelo momento em si, porque somos humanos, sentimos as situações. Estava envolvido numa situação que já era traumática, fui para a casa de banho e fechei-me a chorar. Depois, passado um mês e meio da situação, houve alguém que me ligou a dizer que tinha sido castigado nove meses.

Ouça aqui o episódio do podcast “A História do Dia” sobre os bastidores da seleção nacional de futebol.

Qual é a cola que une a seleção nacional?

Foi o momento mais marcante da carreira?
Posso dizer que foi o momento mais marcante por vários aspetos. Há poucos jogadores que vieram desde o associativismo, da Associação de Futebol de Lisboa, até à Seleção Nacional. Se forem ver isso, não chegam para os dedos de uma mão. E eu sou um eles. Conheço muito bem o aparelho federativo, conheço a formação toda, tive o mérito de passar por essas etapas todas e o objetivo do crescimento de um jogador é chegar à Seleção, aos Europeus, aos Mundiais. E esse momento foi marcante porque, enquanto fui castigado injustamente e a causa envolve coisas muito grandes de que nunca falei, não houve uma preocupação com a pessoa. Acima de tudo. Fiz 75 internacionalizações a vários níveis e o momento mais importante quando estás a representar o país, o momento mais solene, é o momento do hino. E naqueles três minutos do hino nós navegamos por muitas coisas, não só aquilo que tem a ver com o jogo, outras coisas sociais também. Não é uma coisa menor, é uma coisa grande para a carreira de um jogador. E o facto de não ter sido apoiado, de não ter havido preocupação por parte de algumas pessoas. Também é difícil falar da instituição Federação Portuguesa de Futebol, porque envolve muita gente e o tempo passa. Falamos sempre do tipo de pessoas que estavam a gerir essa mesma federação e é por isso que não gosto de trazer a instituição — porque não tem nada a ver com a instituição, tem sempre a ver com pessoas. Foi um processo duro, muito difícil.

Sentiu-se sozinho? Abandonado?
Completamente. Fiz defesa própria. Recordo-me de que, logo duas ou três semanas, depois falei com o Jean-Louis Dupont, o advogado que ganhou a Lei Bosman, para perceber em que tipo de caso é que estava envolvido. E era uma coisa muito grande, como é que eu estava envolvido numa embrulhada daquelas? Ele ligou-me de Bruxelas e disse que a equipa de advogados que ele liderava ia defender o meu caso porque era importante.

A minha família deu-me aquilo que podia dar, deu-me educação, deu-me a Igreja [católica], fiz a catequese, fui batizado, segui os meus pais que por sua vez tinham seguido os meus avós. Mas tenho família muçulmana, nasci na parte muçulmana de Moçambique. Quando acabei a minha carreira, depois passava grande parte das minhas férias no mundo árabe, tenho amigos naquela região, houve apenas um manifesto. Foi simplesmente isso que aconteceu, mais nada. Nasci numa zona predominantemente muçulmana, tenho família muçulmana e só revelei isso quando acabei a carreira.

Mas foi acusado de quê, especificamente?
Houve relatórios, na sequência dos confrontos que existiram no túnel. Não era como hoje, em que temos câmaras espalhadas por todo o lado. Tinha havido confrontos no túnel e o árbitro escreveu no relatório que tinha sido agredido por jogadores e outras pessoas. E um deles era eu. O que é mentira. Nunca estive no túnel, passei pelo túnel para ir para a casa de banho. Logo aí, estavam a faltar à verdade. Fui castigado e fui notificado do castigo quando estava de férias no Algarve. Quando eu sabia que pessoas é que tinham estado envolvidas e que pessoas tinham sido protegidas. Recordo-me de que tive uma reunião na Praça da Alegria, na antiga Federação, com os outros castigados, o Nuno Gomes e o Paulo Bento. Eu tinha levado nove meses, eles tinham levado seis meses. E foi quando a Federação me disse que achava que era melhor não recorrer, aceitar os castigos. Disse que não, disse que ia defender-me. Defender-me pela minha dignidade, porque não era justo, porque era mentira, porque não tinha estado envolvido. E disse que ia defender a minha honra, a minha dignidade e a minha carreira, nem que fosse com os meus próprios recursos. E foi o que fiz. Estive seis meses em tribunal, na jurisdição da UEFA, tudo tutelado pela UEFA, e fui ao Tribunal Arbitral do Desporto contra a UEFA. E deram-me razão.

E a pena foi reduzida de nove para seis meses.
Fiquei com seis meses de pena suspensa. Ou seja, no final de contas, fiquei seis meses sem jogar em jogos internacionais, podia jogar no estrangeiro por clubes, porque a justiça desportiva tem esta coisa em que já estás castigado antes de teres direito ao contraditório. É uma coisa surreal mas é a verdade, estás castigado e depois vais defender-te. Defendi-me e durou seis meses. Não tive uma chamada por parte de ninguém da Federação, nem sequer de colegas. E isso deixou-me triste. Durante aquele processo todo, a Seleção continuou a fazer as suas campanhas e esqueceram-se de mim.

Foi notícia há alguns anos quando anunciou a conversão ao islamismo. O que é que o levou a tomar essa decisão?
Falar de religião abre logo um cenário enorme. Tenho uma visão muito própria sobre a aceitação, seja ela qual for. A integração. Sempre defendi essas causas, causas que vivi e pelas quais passei, racismo e xenofobia. A questão religiosa? Nasci em Moçambique. Em Moçambique, 60% da população, principalmente no norte, é muçulmana. Saí de Moçambique em 1975, tinha três anos, quando Portugal abriu a porta a milhares e milhares e milhares de retornados. Depois, segui uma educação social com muitos problemas, estrutural com muitos problemas, porque vivemos em bairros clandestinos, degradados, porque era a difícil a integração e a aceitação no espaço da comunidade portuguesa. A minha família deu-me aquilo que podia dar, deu-me educação, deu-me a Igreja [católica], fiz a catequese, fui batizado, segui os meus pais que por sua vez tinham seguido os meus avós. Mas tenho família muçulmana, nasci na parte muçulmana de Moçambique. E depois também tenho esta questão do futebol, que me permitiu ir para culturas diferentes, idiomas diferentes, religiões diferentes, formas de pensar diferentes.

Soccer - Friendly - FC Wacker Tirol Innsbruck v Galatasaray

No Galtasary, na Turquia, clube e país que o marcou

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Encontrou tudo isso na Turquia, principalmente?
Sim, tive uma experiência muito feliz na Turquia, foi mesmo muito bom. É preciso viver com as pessoas, é preciso partilhar com as pessoas, perceber o outro lado. E, quando acabei a minha carreira, depois passava grande parte das minhas férias no mundo árabe, tenho amigos naquela região, houve apenas um manifesto. Foi simplesmente isso que aconteceu, mais nada. Nasci numa zona predominantemente muçulmana, tenho família muçulmana e só revelei isso quando acabei a carreira. Nada mais.

Mas já chegou a ir a Meca? E sempre foi com a família real saudita, como queria?
Sim. Conheço muitas famílias nos Emirados.

E ainda tem casa no Dubai?
Sim. Tenho algumas casas fora, mas é mais pelo convívio, pela partilha. Mas claro que isso pode acontecer em qualquer local, em qualquer lado. É por isso que me considero um cidadão do mundo. Não sou saudosista, nada me prende. Obviamente que tenho responsabilidades familiares, porque constituí família, mas quero que os meus filhos tenham mente aberta, mente de viajar, de observar, de compreender outras situações e fenómenos, da mesma forma que tive esse privilégio através da melhor escola que existe: o futebol.

No Qatar, por causa da religião há algumas limitações relativas aos direitos das mulheres, dos homossexuais, de outras minorias. Como é que, como muçulmano, vê essas limitações?
É importante que se usem instrumentos com visibilidade e mediatismo que consigam fazer a mudança. E que ela seja progressiva, natural e que compreenda as culturas e o passado delas. E que haja igualdade, é o que defendo. O futebol pode contribuir para isso. Acho que o tem feito, em muitas questões, como por exemplo, o racismo. Fui dos primeiros jogadores negros a jogar na cidade de Liverpool, no Everton, e foi há 20 anos. Num clube centenário. E um ou dois quilómetros ao lado, quando fui jogar mesmo para o Liverpool, já era diferente, tínhamos um clube multi-racial, que até tinha John Barnes como capitão.

Mas sentiu ou sofreu racismo em Inglaterra?
Não, senti que o futebol fez a sua parte. Por isso é que digo que não podemos ter simplesmente palas nos olhos. Temos de ter a noção de que existem países com culturas diferentes e que levam tempo a fazer a mudança. Mas que ela existe, de forma positiva. Em Inglaterra, quando olhava para os adeptos, dificilmente via adeptos negros. E neste momento já existe integração. Houve mudança.

O Qatar que conhece, com a religião que conhece, pode também evoluir nessa perspetiva?
Não tenho dúvidas que sim. Por isso é que acho que não é só uma questão do momento, do mediatismo, de usarmos o futebol para o lado positivo. Até porque o futebol é muitas vezes usado pela negativa. A questão é este movimento ser constante, que seja um movimento contínuo. Que as poucas pessoas que possam ser minoria neste momento, um dia possam ser maioria. E sendo maioria, que tenham força suficiente para mudar politicamente um país.

Como está a acontecer com o Irão?
Acho que está a acontecer um pouco por todo o mundo. Simplesmente, às vezes, não temos acesso a certas realidades porque os media não estão lá. Mas acho que todas as pessoas que tenham mais ou menos visibilidade, capacidade de aglutinar, capacidade de mexer com a consciência das pessoas são importantes. Isto tem que ver com pessoas.

A equipa do Irão fez bem esse papel?
As manifestações podem ser feitas de várias formas e maneiras. Acho que aquilo que eles fizeram foi positivo. Foi positivo. Agora tem é de ser dada continuidade.

Nós, que estivemos lá dentro [Mundial 2002], sabemos porque é que a equipa não correspondeu. E aqui estamos a falar desde condições estruturais, de liderança, de escolhas e decisões, até às condições de um plantel fortíssimo em termos de personalidade individual e um coletivo extremamente forte que tem de ser orientado também com outro tipo de liderança. E depois chegamos, claro, à definição do próprio local de trabalho de treino. De facto, não havia condições para trabalhar.

Mas acha que o futebol devia ter deixado uma imagem mais forte em relação a este Mundial?
Cada vez mais estamos a ter consciência de coisas de que não tínhamos há 10 ou 15 anos. Porque víamos sempre o lado bom e puro do futebol. E agora temos consciência de que estamos a ver outro lado. Estamos a ter conhecimento de coisas, como os moldes da atribuição do Mundial ao Qatar. Mas isso não tem nada que ver com os treinadores e jogadores e os seus sonhos. Nem com resultados desportivos. Tem a ver com outras coisas. Mas tal como acontecem coisas destas no futebol, também acontecem noutras indústrias, infiltrações de pessoas que tiram partido de determinadas situações para encapotar outras. Isso acontece. Mas a partir do momento em que se identificam as coisas, só há tendência a melhorar. Há que retirar o peso do futebol e direcioná-lo para as coisas mais positivas.

Por falar em Qatar: para este Mundial muito se falou do clima, da preparação atribulada. Em algumas coisas, acaba por ser parecido com as dificuldades do estágio do Mundial de 2002, da Coreia e Japão…
2002 dava um bestseller (risos).

E qual de vocês é que um dia vai escrever esse livro?
Não sei, mas sabem qual é o livro que defendo? Não tem nada que ver com autobiografias, que até são giras. O livro que defendo tem de ter a parte didática, do drama e da comédia. E este livro tem tudo.

Qual é a parte da comédia, no caso de 2002?
A parte da comédia sempre foi o espírito que reinava no grupo. Não digo que fôssemos um grupo indisciplinado, talvez não seja a palavra certa. Mas houve coisas muito engraçadas, dentro da seriedade que é representar um país. Mas de facto, o Mundial 2002, logo à partida, desde a preparação até ao término, não foi bem planeado.

Os jogadores queixavam-se muito da humidade, das más condições de treino. Isso foi essencial para o falhanço?
Temos a tendência a aprender com más decisões. E nós aprendemos muito. A vários níveis, até do ponto de vista da preparação da equipa, a nível fisiológico, da ciência do futebol. Há muitas coisas que se aprendem de más campanhas. Porque é que foi mau? Não foi simplesmente porque a bola não entrou. Ou porque a equipa não rendeu. Porque é que a equipa não rendeu? O campo visual que passa para as pessoas é só o do resultado. Mas nós, que estivemos lá dentro, sabemos porque é que a equipa não correspondeu. E aqui estamos a falar desde condições estruturais, de liderança, de escolhas e decisões, até às condições de um plantel fortíssimo em termos de personalidade individual e um coletivo extremamente forte que tem de ser orientado também com outro tipo de liderança. E depois chegamos, claro, à definição do próprio local de trabalho de treino. De facto, não havia condições para trabalhar.

Abel Xavier and Portugal team mates

Abel no Mundial 2002

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Ao contrário de agora, que o estágio teve apenas uma semana, em 2002 foram com imenso tempo para Macau, que afinal nem tinha o clima parecido com o do Japão. A escolha de Macau foi feita por dinheiro?
Não sei, não sei se foi por uma questão política. Macau pertenceu a Portugal. São decisões que ultrapassam os jogadores. E nós deparámo-nos com uma má preparação porque o cenário que encontrámos três semanas antes de um Mundial era de adversidade climatérica. Nós agora sabemos que se um atleta estiver exposto a um grau de humidade que vá afetar a parte muscular a equipa não vai corresponder aos mesmos estímulos de intensidade que um jogo pede. A decisão de irmos para Macau foi errada, porque de facto houve uma agressão do ponto de vista da preparação, que fez com que nós não treinássemos sequer. Porque não tínhamos condições para treinar. O treino é sempre treino, o jogo é uma coisa diferente. Mas nós temos de ter um trabalho do ponto de vista neuromuscular que permita estímulos semelhantes aos dos jogos, que nós não tivemos. Por isso é que quando perdemos com os EUA da forma que perdemos, as pessoas só falaram da qualidade da equipa. E a parte física? Nós não tínhamos condições para competir. Nós competimos mais por um instinto de reação.

Os jogadores ainda falam sobre isso quando se cruzam? Foi quase uma experiência coletiva ou ficou para trás das costas?
Foi uma experiência coletiva, até porque evoluiu para algo semelhante no Mundial do Brasil. Cometemos o mesmo erro, aproximado. Se bem que repetimos o erro de outras equipas europeias, que foi estagiar nos EUA. Mas quando chegámos ao estádio para jogar, o estímulo de que o corpo precisa é muito importante para a equipa render não estava lá. É um cenário completamente diferente do deste Mundial do Qatar. Não só no tempo de preparação, que foi menor, mas também pelo tempo de exposição e porque todas as equipas estão uniformes.

Mas o que é que sentia em Macau? O Nélson e o Caneira contaram-nos que emagreceram. O Abel também? Ou sentia-se cansado?
Sim. A maior parte do grupo estava em défice, muitos jogadores estavam condicionados.

E havia discussões no grupo? Havia muitas lutas pelo lugar no plantel, Vítor Baía, Rui Costa…
Não. Uma coisa são as opções, que devem ser respeitadas. Outra coisa é teres um grupo de jogadores com um perfil muito forte em termos de carácter e não aceitarem determinadas decisões. Aí já estamos a falar de outro tipo de problema.

Mas isso desestabilizou o grupo?
Não. O que acontece é que numa equipa de futebol não deve haver seguramente lugares garantidos para ninguém. Toda a gente deve competir pelo lugar. Mas é lógico que há jogadores que ganham estatuto ao longo dos anos. E as próprias lideranças técnicas necessitam desse núcleo duro de jogadores, que possam personalizar as ideias e orientações do treinador. Porque na prática são as ideias do treinador que têm de fazer sentido para que os jogadores as possam compreender e fazerem um jogo coletivo. A única questão que nós tínhamos é que havia um grande grupo de pesos pesados e não podiam jogar todos.

David Beckham era o nome e a imagem global, como era óbvio; e eu, como afro-americano, ia fazer a comunidade toda mexicana, já que 20% da classe laboral em Los Angeles é mexicana, já que dominava o espanhol e podia ser o jogador-marketing dessa comunidade hispânica, e também o da comunidade afro-americana, pela imagem. E foi uma aventura fantástica.

Portugal começou esse Mundial com uma derrota frente aos Estados Unidos, país para onde o Abel foi jogar em 2007, cinco anos depois. Quando lá chegou ainda falavam desse jogo?
É engraçado falarem disso, vou contar-vos uma história engraçada. Ao longo da carreira, encontrei o Alexi Lalas, o central norte-americano, em três momentos: na Serie A, num Bari-Padova; nesse Mundial de 2002; e anos depois, quando ele chegou à parte administrativa dos LA Galaxy. Nessa altura, estava no Middlesbrough, de Inglaterra. Um dia toca-me o telefone: “Abel, how are you? I’m Alexi  Lalas”. Isto foi na altura em que estava a ser implementado o novo projeto da MLS, com o Beckham como main-marketing player, em que cada clube tinha dois jogadores-marketing para chamar a atenção dos franchisings. Eu estava no Boro, já até um pouco saturado, a precisar de um novo desafio, e ele liga-me e faz-me a seguinte proposta, numa abordagem muito americana: “Abel, vou precisar de ti. Nós contratámos o Beckham, está tudo fechado. Vamos anunciá-lo em seis meses, numa grande campanha de lançamento. Mas precisamos de um segundo jogador-marketing. E gostávamos que fosses tu”. Respondi: “Mas por causa das minhas capacidades técnicas ou por outro motivo?”. É que era uma abordagem muito diferente. E ele explicou-me que eles lá no clube, na “enterprise”, tinham “uma personagem” para cada modalidade. No basquetebol tinham o Dennis Rodman, e precisavam de uma para o mundo do futebol.

Ou seja, precisavam da tua figura também?
Sim. Quando falamos dos direitos de imagem, os norte-americanos já estavam muito à frente nisso.

Soccer - Friendly - England v Portugal

Abel Xavier foi Campeão do Mundo sub-21 com Carlos Queiroz na Luz, em 91

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E foi ser o Dennis Rodman do futebol?
Fui abordado de uma forma que na Europa jamais seria possível. A imagem que, para o bem e para o mal, me fez refém de algumas questões — aliás, a imagem que eu sempre mantive na íntegra, tem a ver com o castigo do Euro, porque mentalizei-me que seria muito mais fácil as pessoas manterem-me vivo no mundo do futebol se mantivesse a minha própria imagem, mas depois essa minha imagem no Euro fez-me refém ao longo da minha carreira.

Mas, depois, nos EUA, percebeu que valia dinheiro?
Só quando fui para os EUA é que percebi que, bom, se tivesse tido uma equipa a trabalhar por detrás de mim a trabalhar a minha imagem tinha tido muito mais rentabilidade na Europa. Porque aquela abordagem em termos de imagem fazia algum sentido. Atualmente estamos a ver contratos de imagem a valerem muito mais dinheiro do que os contratos desportivos. Quando ele ligou para mim fiquei um bocado espantado pela abordagem, mas depois ele explicou-me o planeamento: David Beckham era o nome e a imagem global, como era óbvio; e eu, como afro-americano, ia fazer a comunidade toda mexicana, já que 20% da classe laboral em Los Angeles é mexicana, já que dominava o espanhol e podia ser o jogador-marketing dessa comunidade hispânica, e também o da comunidade afro-americana pela imagem. E foi uma aventura fantástica.

Muito para além do futebol?
Sim. Porque é uma forma de não deixar de ser profissional em campo, mas depois é o cruzamento das indústrias. Foi algo que aprendi também na cultura norte-americana, cruzar indústrias.

Acha que eles vão chegar a algum lado algum dia no futebol? Estão muito bem, para já, neste Mundial, vão ser um dos organizadores do próximo.
Há uma coisa que às vezes se diz, que aparece por aí, umas folhas soltas de que mal se fala, mas que é planeamento. Fui para o Galaxy em 2007 e estamos em 2022. O Beckham não saiu de lá, dos EUA. É CEO do Miami, do franchising que já tinha planeado em 2008. É para se ver o que está por detrás do desenvolvimento do futebol nos EUA. A volta que o Mundial agora está a mostrar vai terminar no próximo Mundial em três países, México, Canadá e EUA. Nada é feito por acaso. Enquanto não houver planificação, visão, há mais dificuldades para competir com certas realidades e certos mercados. Mas acredito que no mercado livre do futebol, ele não vai ficar centralizado só naquilo que agora pensamos, sobretudo a Europa, os big 5, vai ter tendência a alargar, o mercado tem tendência para ser muito mais competitivo, os direitos de imagem vão ser difundidos a uma escala maior, e obviamente vai haver maior receita, mais dinheiro a circular e provavelmente mais interesses que não são propriamente do futebol, mas vejo, neste caso específico do mercado americano, uma grande realidade, que tem um sentido e está planeado. O crescimento da nova MLS foi em 2017, analisando os quadros competitivos vê-se que está a crescer, a abrir pelo país inteiro, e vai culminar com êxito.

LA Galaxy Press Conference

Abel Xavier e David Beckham no projeto do LA Galaxy

Getty Images

Ainda tem casa lá?
Tenho. Aliás, a minha saída de lá só peca pela questão do tempo porque não consegui ficar com aquilo que queria, que era o green card. Infelizmente aos 35 anos, quando o futebol era diferente, acabei pela primeira vez na minha carreira a ter uma relação não tão feliz com um treinador.

Voltando um pouco atrás, ao Mundial de 2002, já falou de liderança, que é falar do selecionador, de António Oliveira. Conheceram-se histórias: as crendices, os alhos no balneário, a polémica sobre a lesão do próprio treinador, os treinos muito questionados, vários problemas. O que se passou de facto? Tudo isto foi verdade? Que relação havia com o selecionador?
Nós sempre tivemos respeito por todos os selecionadores, todos têm a sua personalidade e forma de estar, crenças, só que nós éramos um grupo difícil, um grupo muito difícil. Nós tivemos uma emancipação, desde o futebol de formação, muito precoce, através do modelo de Carlos Queiroz. Enquanto adolescentes, crescemos muito rápido. E quando houve a internacionalização, esfumou-se a clubite. Fomos beber de muito lá fora e quando chegávamos à realidade nacional olhávamos e víamos que faltava muita coisa.

António Oliveira não tinha mão em vocês?
Não, não é essa a questão. Houve sempre respeito, houve sempre uma hierarquia estabelecida na seleção. O mister António Oliveira vinha de um aparelho protetor muito forte, uma estrutura vencedora, onde fez um grande trabalho, que era o FC Porto. O que aconteceu é que nós tínhamos um balneário difícil de ser liderado. Se fossemos individualizar… Era cada caráter. Um balneário muito difícil. Para qualquer treinador. Hoje em dia falamos sempre na quantidade e qualidade. É bonito. Agora também o dizemos, ‘essa geração é quantidade e qualidade, uma geração é fantástica’. E é, não está em causa. Mas quando toca a tomar decisões, não é fácil.

Um dos jogadores que estava nessa seleção era Paulo Bento. Paulo Bento com quem jogou, em vários clubes. E que treina agora a Coreia do Sul, que nos eliminou nesse Mundial de 2002 e joga esta sexta-feira, 20 anos depois, com Portugal o terceiro jogo da fase grupos que pode decidir se passamos no primeiro ou segundo lugar.
Uma carreira fantástica. Tenho uma afinidade muito grande com o Paulo Bento e a sua própria família porque evoluímos juntos, até em termos familiares. Se há colega com quem joguei em mais clubes foi com o Paulo Bento: joguei no Estrela da Amadora, no Benfica, no Real Oviedo, e no clube mais importante, que é a Seleção. E estou muito contente com o percurso que ele fez. Foi para uma realidade completamente diferente, encontrou uma cultura muito específica, com um grande sentimento de obediência, a asiática. E ele, com o seu cunho pessoal, introduziu a sua metodologia, a sua forma de trabalhar, e nota-se uma equipa extremamente forte e competitiva, talvez no jogo jogado os pontos não deem a dimensão da prestação coletiva desta Coreia do Sul. O Campeonato do Mundo permite-nos verificar a evolução de determinados países. E o Paulo Bento, independente do que vá acontecer, cruzou-se com Portugal e, infelizmente, se calhar não vai chegar onde queria, mas o trabalho fica.

Manchester United v Benfica

Abel Xavier no Benfica, um dos clubes onde jogou com Paulo Bento (também se cruzaram no Estrela e no Oviedo, além da seleção). Em 2002 foram eliminados pela Coreia do Sul agora treinada por Bento

Getty Images

Ele fez uma malandrice para não estar no banco no jogo frente a Portugal.
Era muito difícil, para nós, portugueses, que somos muito emocionais, depois do que estava a dar o jogo, que ele não tivesse tido aquela abordagem. Porque nós que estávamos de fora, ver um árbitro acabar um jogo antes de um pontapé de campo quando se sentia que a Coreia estava perto de marcar. Como costumamos dizer, só não sente quem não é filho de boa gente. Aquilo foi emocional.

E que diferenças há entre esta Coreia do Paulo Bento e a Coreia de 2002, em que aquele golo do Park nos eliminou ainda na fase de grupos?
É diferente, diferente. Com o devido respeito, até temos de analisar que o próprio futebol também está diferente, tudo mudou do ponto de vista técnico, tático, até a bola mudou. A única coisa que não mudou no mundo do futebol acho que foram as medidas do campo. O resto tudo mudou.

Está surpreendido com a prestação de Portugal? Já estarmos apurados sem sequer ser necessário estar a fazer contas.
Esta geração tem crescido dentro das competição. Com alguma lógica, até o discurso do próprio mister Fernando Santos foi muito mais afirmativo.

Foi dos poucos com quem não se cruzou no Estrela da Amadora: tinha saído já quando ele foi treinar o clube.
Gostava de me ter cruzado com o mister Fernando Santos, mas não aconteceu, já tinha saído. Mas temos muito que lhe agradecer. Foi o treinador vencedor. O selecionador campeão. Que permitiu que Portugal de alguma forma desenterrasse o machado da rivalidade com a França, que vinha desde a formação. Para mim foi reconfortante.

Foi também uma espécie de vingança pessoal?
Um dia antes [ndr: da final do Campeonato da Europa de 2016] um jornalista francês fez-me uma pergunta — a pergunta que me faziam  sempre, e ainda me continuam a fazer, é sobretudo a do penálti, mas ele não. Perguntou-me se me recordava do lance dois minutos antes ao do penálti, em que se o Barthez não tivesse defendido um cabeceamento meu depois de um cruzamento do Figo, e a bola entrasse o penálti não existia e tínhamos ido à final, porque o jogo também tinha acabado ali. Até lhe respondi que era ‘fantástico’, era a primeira vez que tinham a ideia de me fazer aquela pergunta. Porque é depois desse lance que há um contra-ataque e se dá o lance polémico.

Sentiu-se vingado pelo Éder?
Por isso é que digo que foi reconfortante. Como se tivesse estado lá. Mesmo que não tivesse sido a minha geração. Disse ‘obrigada’. Tiraram-me um bocadinho do peso. Porque não é só uma questão social, dos emigrantes, e todas essas coisas que envolvem o futebol sobre conquistas. É finalmente termos ido espetar o punhal mesmo na França, mesmo lá.

Cristiano Ronaldo, por aquilo que produziu, e da forma como produziu, é do melhor. Para quem esteve no mundo do futebol, estar 20 anos o mais alto nível, no topo, é impressionante. É pena que no mesmo período tenha aparecido outro grande jogador, como é o caso do Messi, porque normalmente só aparece um, aqui apareceram dois.

E agora nos oitavos, quem é que escolheria como ‘melhor’ adversário para Portugal? Sérvia, Camarões, Suíça ou, um pouco menos provável, Brasil?
O sentimento de afirmação existe, Portugal não deve temer ninguém e respeitar todas as seleções, até esse possível cruzamento com o Brasil. A dimensão dos nossos jogadores é tal que não têm que temer ninguém. É uma seleção que umas vezes denota dificuldades em jogar com equipas que não tão poderosas, do que jogar com equipas que são poderosas.

Isso é bom, por exemplo, se a seguir nos calhar uma Alemanha ou uma França?
O jogo dos ‘poderosos’, entre aspas, o jogo dos candidatos, permite de alguma forma à nossa seleção expressar um futebol completamente diferente. Algumas vezes temos problemas para bater equipas de ‘bloco baixo’. Com os candidatos são jogos muito mais abertos, são jogos estratégicos. Temos é que evitar andar com a máquina calculadora a fazer contas. Esta geração merece fazer um feito importante neste Mundial. E espero que consiga.

Esta geração tem um Ronaldo a acabar a carreira. Acha que Ronaldo está a gerir bem estes seus anos finais? Há muitas críticas sobre a forma como geriu a saída do Manchester.
Sim, mas há uma coisa que é indiscutível: nós temos de saber valorizar as tantas coisas boas que temos. E Cristiano Ronaldo, por aquilo que produziu, e da forma como produziu, é do melhor. Para quem esteve no mundo do futebol, estar 20 anos o mais alto nível, no topo, é impressionante. É pena que no mesmo período tenha aparecido outro grande jogador, como é o caso do Messi, porque normalmente só aparece um, aqui apareceram dois. Mas este desafio até foi muito interessante. As duas seleções surgem neste Mundial a não depender da individualidade, mas do coletivo, quando há dez anos dependiam da individualidade deles. Mas o Cristiano Ronaldo tem noção, como todos nós, que já não tem menos dez anos, que já não pode render o que rendia, o que é normal, não só pela idade, como pelas características do futebol hoje em dia. É preciso saber usá-lo da melhor forma, inserido no coletivo, e que o coletivo também o possa suportar, para que assim ele possa continuar a dar um passo na sua carreira, porque acredito que ainda vai jogar mais algum tempo.

Na Arábia Saudita?
É possível. Porque o envolvimento dele é de uma grandeza tremenda, que não está associado só às questões desportivas. Ele continua a ser um valor seguro, a ser um exemplo para as novas gerações. Vemos o reflexo dele alastrado pelo mundo inteiro. Este Mundial dá para vermos adeptos de todo o lado, alguns disfarçados com a sua imagem, a cantarem o seu nome. Acredito, e gostava que isso acontecesse, que por aquilo que este dois jogadores, Ronaldo e Messi, fazem e fizeram, que no dia que um ou outro terminassem as carreiras, que fossem aplaudidos em todos os estádios onde passassem.

Um pode ir ajudar a desenvolver o futebol nos EUA, Messi. E outro o da Arábia Saudita, Ronaldo.
É possível. E não tem necessariamente a ver com questões financeiras porque quando eles atingem a dimensão que têm tudo é subjetivo. O contributo deles para desenvolver novas realidades, abertura de novos mercados, é aliciante, é desafiante, porque o futebol para ser mais competitivo talvez careça de uma compreensão melhor.

Pergunta então para jackpot: até onde pode ir Portugal no Mundial? E contra quem?
Espero que até à final. E gostava que fosse a Argentina.

Ronaldo contra Messi?
Porque já foi pedido, já foi falado. E seria muito bonito, o último Mundial dos dois. O Lewandowski abraçou-se a Messi depois da derrota da Polónia, que soube a vitória. Queremos é que estes protagonistas continuem até ao fim, queremos vê-los em campo. Gostaria de uma final Portugal-Argentina.

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