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Uma cliente num hipermercado, no dia em que entra em vigor a lei que procede à aplicação transitória de isenção de IVA a certos produtos alimentares, em Lisboa, 18 de abril de 2023. ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA
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Depois de anunciado a 24 de março, o IVA Zero para um cabaz de bens essenciais só entrou em vigor a 18 de abril.

ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

Depois de anunciado a 24 de março, o IVA Zero para um cabaz de bens essenciais só entrou em vigor a 18 de abril.

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Apesar dos receios de Medina, supermercados fizeram (mesmo) o IVA Zero chegar às famílias

Medina sempre viu IVA Zero com ceticismo – até o anunciar. Mas, ao contrário do que temia, a redução de preços não foi aproveitada pelo setor, conclui estudo publicado no site do Banco de Portugal.

Os receios de Fernando Medina sobre o IVA Zero revelaram-se infundados. Um estudo académico publicado no site do Banco de Portugal conclui que a redução do imposto foi “quase completamente” passada às famílias – em vez de beneficiar só os supermercados. A teoria económica avisa que é isso que frequentemente acontece quando há reduções de imposto num dado setor, mas neste caso o escrutínio mediático terá sido decisivo para baixar a fatura paga pelas famílias. Porém, o estudo revela que os preços subiram (mais de 1%) quando a medida foi anunciada e, na reta final do ano, houve alguma derrapagem.

É um resultado pouco normal, à luz da literatura económica“, diz ao Observador Tiago Bernardino, economista ligado à Universidade de Estocolmo que é um dos académicos que assinam este estudo que identifica uma passagem “quase completa” da redução do IVA em alguns alimentos essenciais. Várias pesquisas científicas, como aquela que há uns anos estudou a redução de imposto nos cabeleireiros na Finlândia, demonstram que a “transmissão” do alívio fiscal costuma estar longe de ser perfeita – ou seja, por regra o Estado abdica do imposto mas os consumidores não são beneficiados em igual medida.

Era esse o receio de Fernando Medina e do anterior Governo. Em outubro de 2022, em plena apresentação do Orçamento do Estado para 2023, o então ministro das Finanças justificava, ao Observador, porque é que o Governo não tinha incluído nesse documento o chamado IVA Zero (num cabaz de bens essenciais). Essa teria sido uma opção que “não dava a garantia de se traduzir em alguma contenção do preço dos produtos alimentares, porque é um mercado muito livre, é um mercado com operadores muito fortes”.

Entrevista a Medina. IVA dos alimentos não baixa porque dinheiro pode ir parar a acionistas de grupos de distribuição e não a quem precisa

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Por outras palavras, o receio era reduzir-se o IVA e, pouco tempo depois, os preços subirem novamente para os mesmos níveis, ou perto disso. Isso poderia acontecer porque, dizia o ministro, em Portugal há um mercado da distribuição onde existem “operadores muito fortes”. Medina mostrava-se, assim, pouco confiante de que a concorrência seria suficiente para garantir que as retalhistas não aproveitariam a descida do imposto para aumentar as suas margens, sem medo de perderem clientes.

A preferência do Governo nesta fase, dizia Medina, era manter o IVA na mesma e, em alternativa, aproveitar a folga orçamental gerada pela inflação para estimular os rendimentos, essencialmente por via do IRS). Mas antes do final de março o governo de António Costa acabaria por ceder e lançou o IVA Zero (para 46 produtos alimentares essenciais), três meses depois de ele estar em vigor em Espanha e noutros países europeus.

Transmissão quase perfeita, mas preços subiram antes de IVA Zero entrar em vigor

Apesar de o estudo considerar que houve uma “passagem quase completa [do IVA Zero] para os preços no consumidor“, a pesquisa revelou que assim que a medida foi anunciada (depois da resistência na sua aplicação) houve um “ajustamento dos preços em antecipação” à entrada em vigor. Entre um momento e outro passaram mais de três semanas, e o estudo indica que houve um aumento médio de 1,27% nos preços dos bens em questão, em comparação com os bens não abrangidos.

Depois de anunciado a 24 de março de 2023, o IVA Zero para um cabaz de bens essenciais só entrou em vigor a 18 de abril, ou seja, baixar o imposto de 6% para 0% levou a uma redução do preço mas um pouco menor do que teria sido se não tivesse havido esse aumento superior a 1% dos preços entre o momento do anúncio e a entrada em vigor.

A partir desse momento, a pesquisa revela que houve, de facto, a tal transmissão “quase completa” da descida dos preços, que é estimada em cerca de 99% pelos modelos econométricos usados pelos investigadores.

Além de Tiago Bernardino, ligado à Universidade de Estocolmo, o estudo é da autoria de Ricardo Duque Gabriel, que trabalha na Reserva Federal norte-americana, João Quelhas, economista do Banco de Portugal, e Márcia Silva Pereira, investigadora da Nova SBE. “A Temporary VAT Cut In Three Acts: Announcement, Implementation and Reversal” está publicado em inglês, sendo que o título se pode traduzir por “Uma Descida Temporária do IVA em Três Atos: Anúncio, Implementação e Reversão”.

O estudo não é da responsabilidade do Banco de Portugal mas foram usados alguns dados recolhidos pelo supervisor e, além disso, foi agora publicado como working paper no site do Banco de Portugal. Ainda assim, já em outubro de 2023, quando a medida estava em vigor, o próprio Departamento de Estudos Económicos do Banco de Portugal indicava oficialmente haver “evidência da transmissão da redução do imposto aos preços no consumidor”.

Escrutínio mediático e descida dos preços no produtor travaram preços

O estudo agora publicado no site do Banco de Portugal revela não só uma transmissão sólida da descida do IVA como diz, também, que essa transmissão se manteve praticamente estável ao longo do tempo (limitado) em que o IVA Zero esteve em vigor. Quando foi inicialmente apresentado, o programa tinha uma duração prevista de seis meses, até outubro, mas acabou por ser prolongado até ao final do ano passado (extinguindo-se na viragem para 2024).

FONTE: Estudo publicado como "working paper" no site no Banco de Portugal

A divergência entre os preços dos produtos abrangidos pelo IVA Zero e aqueles que não estavam abrangidos, que se alargou quando o programa entrou em vigor, manteve-se praticamente estável ao longo de quase todo o programa. Ao Observador, Tiago Bernardino atribui esse facto a duas grandes razões possíveis:

  • Em primeiro, “poderá ter sido por causa do impacto mediático que a medida teve, com os jornais, as televisões e associações do defesa do consumidor a publicarem notícias frequentes sobre a evolução dos preços, alguns com “trackers” [mecanismos de monitorização] regulares”. Para o investigador, “isto gerou um escrutínio que, no fundo, poderá ter levado a que os supermercados não quisessem sofrer custos reputacionais que poderiam sofrer se decidissem ser os primeiros a aumentar os preços”.
  • Uma segunda razão, acrescenta Tiago Bernardino, poderá estar relacionada com o facto de “os preços no produtor terem estado a cair, o que fez com que os supermercados pudessem manter ou dilatar algumas margens e, como tal, não precisaram de aumentar preços para agradar aos acionistas“.

Retalhistas aumentaram lucros (e dividendos) em 2023

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A Jerónimo Martins, dona do Pingo Doce (e da Biedronka na Polónia) subiu os lucros em 28% em 2023, para 756 milhões, aumentando o dividendo acionista para 0,655 euros por ação.

Outra empresa importante neste setor, a Sonae MC, dona do Continente, faturou 6,6 milhões de euros em 2023, tendo sido o principal motor do aumento de 9,2% das receitas do grupo (e de 6,4% dos resultados líquidos, que subiram para 357 milhões de euros). O dividendo pago pelo grupo aos acionistas aumentou 5%.

Nos últimos meses da aplicação da medida IVA Zero, que foi prolongada poucas semanas antes da queda do Governo, notou-se, porém, um estreitamento relativamente importante da tal diferença entre os preços dos produtos abrangidos e não abrangidos. Tiago Bernardino diz “suspeitar que a atenção mediática se dirigiu, nessa altura, para outras coisas“, o que poderá ter levado a uma menor pressão mediática sobre as retalhistas.

Em Espanha preços também caíram mas subiram mais rapidamente

O estudo baseou-se na observação diária dos preços das “principais retalhistas portuguesas” para o conjunto dos bens abrangidos, permitindo a comparação com os preços dos outros produtos. Porém, para tornar mais robustas as conclusões, os investigadores também compararam a evolução dos produtos abrangidos com a trajetória dos preços em Espanha, onde foi aplicada uma medida semelhante no início de 2023.

Esse trabalho permitiu tirar outra conclusão: “Num estudo preliminar comparável com o nosso feito para Espanha, a transmissão da descida do IVA para os preços no consumidor é estimada também ter sido bastante elevada mas muito menos persistente“, diz Tiago Bernardino. Por outras palavras, os preços em Espanha também baixaram imediatamente mas, em contraste com o que aconteceu em Portugal, “algumas semanas depois o efeito começou a desaparecer“, explica o investigador.

Depois do fim do programa em Portugal, na viragem do ano, as estimativas do estudo “apontam para um aumento [médio] de 4,2% nos preços, em comparação com os preços na última semana de vigência”. Tiago Bernardino afirma que “quando há a reversão da medida, e os preços voltam ao valor anterior, os preços retomam a trajetória que os outros bens alimentares”, o que, para os autores, significa que a política surtiu o efeito desejado.

“Nós não dizemos nada sobre se foi uma boa medida ou não, em comparação com outras formas de aplicar aquele dinheiro”, diz Tiago Bernardino. “O que dizemos é que, ao contrário do que é comum acontecer neste tipo de programas, o dinheiro aqui aplicado chegou, de facto, às famílias”, afirma o investigador, concluindo que “as preocupações que existiam, de haver oportunismo, aparentam não se ter concretizado“.

No Orçamento para 2024, que está em vigor, o governo de António Costa decidiu extinguir o IVA Zero, uma medida que terá subtraído 0,7 pontos percentuais à taxa de inflação, segundo os cálculos agora publicados. Os 550 milhões de euros que poupa com o fim da medida serão canalizados para “reforçar os apoios sociais”, apontou o então ministro das Finanças, Fernando Medina.

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