Nestes tempos de novas estratégias, à floresta tem sido entregue o papel de “armazém” de carbono. Penso que ninguém nega essa importância e que tal papel de relevo deveria ser reforçado e compensado. O que é questionável é a forma como todas estas novas estratégias “determinam que a floresta deve ser um mero armazém eterno de carbono”, simplificando o seu papel fundamental na coesão territorial, social e ambiental do país.
Todas estas iniciativas políticas tornaram o discurso florestal numa monotonia temática, sobrevalorizando a importância do “carbono e do fogo” de tal forma, que a sua gestão substituiu todas as técnicas de gestão florestal propriamente ditas.
Estas estratégias erradas, ao simplificarem o papel da floresta a um “simples armazém de árvores”, perdem o contributo de toda a fileira florestal, desde a plantação até ao produto final. A floresta sequestra carbono, mas parte desse carbono vai ser armazenado nos produtos e não devem, por isso, ser consideradas apenas as árvores.
Basta pensar no tempo de vida de um móvel, de um livro ou de uma rolha de cortiça e todas as formas que temos para reutilizar esses recursos, para percebermos que estes não deverão ser menosprezados nas contas de balanço de carbono.
Esta simplificação ideológica da floresta a um mero armazém de carbono quando conjugada com a sobrevalorização do “risco de incêndio” enquanto estratégia para a floresta, é algo estranha e mesmo contraditória. Por um lado, deseja-se que a floresta cresça e projeta-se a diminuição dos cortes, a bem do carbono, enquanto, por outro, entrámos numa espiral esquizofrénica de “cortar mato e biomassa” para contrariar o “fogo”. Ora, afinal de contas, cortamos ou não cortamos?
Esta escolha política pela floresta enquanto um mero “armazém de carbono”, não considerando todo o ciclo dos diversos produtos, está bem vincada hoje em muitas propostas estratégicas. Basta, por exemplo, perceber a “intervenção política em matérias florestais” e perceber a ineficácia dos instrumentos de política em melhorar a nossa gestão florestal e em potenciar as fileiras florestais como um todo.
Ou seja, a floresta não deve ser encarada como um apêndice destas estratégias, completamente dependente dos objectivos “externos”. A Estratégia Florestal, europeia e nacional, deve ser independente e estar coordenada como as restantes. A transição verde, digital, justa e solidária só será possível com o contributo fundamental da floresta enquanto geradora de emprego, de rendimento, produtora de biodiversidade e “sequestradora de carbono”, mas não enquanto um “armazém eterno” do carbono de outras indústrias.
Ao mesmo tempo, perdeu-se a capacidade de reforçar o papel dos proprietários florestais no mercado, em especial diminuindo “distâncias” entre os diversos elos do sector. Por exemplo, a capacidade da primeira transformação local dos produtos florestais contribui de forma significativa para a criação de emprego nas regiões rurais, mas também pode contribuir para a pegada ambiental dos mesmos.
Nesta matéria do “acesso ao mercado” interessa relembrar o papel importante que as mais de 450 cooperativas agrícolas e florestais têm na economia rural. Estas cooperativas estão presentes em todo o país, representam mais de 250 mil cooperadores, assegurando mais de 5 mil postos de trabalho directo e gerando anualmente mais de 1.400 milhões de euros em volume de negócios. É um capital que não pode ser menosprezado.
É importante, por isso, recuperar o esforço na plantação de “mais florestas”, mas ainda mais relevante será investir e apoiar quem gere a floresta e o faz com ganhos a nível social, ambiental e económico. Sem valorizar e apoiar a gestão florestal sustentável, plantar árvores para carbono não será suficiente para atingir os objectivos pretendidos.
Para que as nossas florestas possam dar um contributo essencial para todas estas “novas problemáticas”, primeiro temos de as adaptar às novas condições, ou seja, dar-lhes o valor e geri-las para que possam sequestrar carbono, produzir matérias-primas essenciais, potenciando a nossa biodiversidade e paisagens, ou seja, contribuindo desta forma para a mitigação das alterações climáticas.
E tudo poderá ser alcançado contribuindo para a estratégia da biodiversidade, reforçando o papel da Gestão Florestal Sustentável enquanto vector da coesão territorial, mantendo postos de trabalho e dinamismo económico em regiões rurais com problemas de despovoamento. Encarar a floresta como uma fonte de produtos diversos, desde alimentares até energéticos, renováveis, é fundamental para manter as nossas paisagens rurais mais resistentes a incêndios rurais. Ou seja, a floresta é fundamental para o desenvolvimento equitativo de todas as regiões europeias.
De outra forma, ou seja, tornando a floresta num “armazém de carbono”, seremos confrontados com vastas áreas “abandonadas”, sem gestão, a emitirem todo o carbono armazenado como aconteceu em 2017.