Em setembro do ano passado, em vésperas do início do ano letivo, o ministro João Costa, numa entrevista à Lusa, disse que a pasta relativa à recuperação do tempo de serviço estava fechada e que, por conseguinte, era escusado “empatar tempo” com a negociação. Entre algumas inverdades a que já nos habituou, aponto uma que, se não fosse triste, daria para rir. A certa altura diz o ministro que “durante o período de assistência financeira da ‘troika’, a carreira dos professores esteve congelada durante nove anos, quatro meses e dois dias, dos quais o Governo aceitou recuperar quase três anos.”

Ora, como se sabe, Portugal esteve sobre assistência financeira durante sensivelmente quatro anos e o tempo de serviço estava congelado desde do tempo de Sócrates. Sim, o Primeiro-Ministro do PS que faliu o país.

Que João Costa faça alguns jogos com as palavras e baralhe, propositadamente, as datas, dou de barato, que o PSD não venha a público repor a verdade dos factos já me parece pouco conveniente. Será por desconhecimento? Em janeiro de 2022, nas eleições legislativas, tive o cuidado de ler o programa do PSD porque ouvi por diversas vezes o líder, à data Rui Rio, dizer que o tempo de serviço dos professores era para ser recuperado. Que essa exigência era da mais inteira justiça! Por essa razão, fiz questão de me certificar se esse desígnio constava nas mais de 160 páginas do Programa Eleitoral do PSD.

Confirmei, à época, que estava escrito, logo na página 4, o seguinte: “Recuperação do tempo de serviço dos docentes para efeitos de aposentação, despenalizando as aposentações antecipadas e majorando o valor das respetivas pensões.”. Foi, portanto, com este programa que o PSD foi a eleições, pelo que estranho que até ao momento não se tenha ouvido ninguém do PSD reagir ao que o ministro disse na entrevista que referi inicialmente. Poderá estar a pensar que talvez devido à mudança de líder que, entretanto, houve no partido, a estratégia tenha sido alterada. Mas se um partido concorre a umas eleições com um programa eleitoral, deixa depois de seguir o programa só porque muda de líder ? O Programa era do PSD ou era do Rui Rio? Ainda assim, Luís Montenegro, líder do PSD, escreveu na sua Moção de Estratégia: “É essencial valorizar a profissão do Professor, ao nível de toda a sua carreira. Recompensar os bons professores, atrair talento para a profissão, encorajar a aprendizagem e desenvolvimento do corpo docente. É preciso também dar incentivos às escolas para melhorarem, seguindo exemplos como Singapura ou o Canadá”, afirmação que vai ao encontro do que consta no Programa Eleitoral na sua página 121, que cito: “Dignificar a profissão docente – é preocupante a progressiva degradação da condição docente. Educadores e professores têm assistido, especialmente na última década, a uma perda significativa do nível remuneratório em comparação com outras profissões da administração pública, acompanhada de um desgaste das condições de exercício da sua atividade e da banalização do acesso à profissão. O PSD entende que a qualificação da escola pública exige da parte do Estado, maior critério e rigor na admissão dos novos profissionais e maior empenho na sua formação ao longo da respetiva carreira. Se ambicionamos ter melhores escolas, tal só é possível se escolhermos os melhores professores e os capacitarmos para uma melhoria contínua do seu desempenho.”

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Perante estas afirmações dos líderes do, ainda, maior partido da oposição, interessa perguntar se a total recuperação do tempo não é por si só uma forma de dignificação da profissão? Considero que sim. Por essa razão, estranho como, passado quase um ano, o PSD não só não tenha reagido a essa e a outras entrevistas do ministro, repondo a verdade dos factos e apresentando alternativas, como continue a mostrar um enorme vazio de ideias para a Educação. Qualquer professor que votou no PSD sentir-se-á enganado, desprotegido e até desorientado.

Que os partidos à esquerda do PS não digam nada, atendendo a que fizeram parte de uma solução governativa e a que nada foi feito, posso perceber. Que o PSD não se posicione, parece-me talvez alguma falta de estratégia. Tivemos, no passado dia 17 de dezembro, a segunda maior manifestação de professores de sempre, quase 30 mil professores na rua. Estamos prestes a ter outra no dia 14 de janeiro, que se prevê ainda maior,  e o PSD parece continuar alheado do momento, ignorando o contexto e a circunstância.

Num momento de pré-crise política, não seria necessário que o PSD, querendo ser alternativa, viesse a público apresentar ideias para a Educação, para a Saúde, para os impostos, para o emprego, para as PME, para todos os assuntos que interessam de facto aos portugueses? As alternativas constroem-se através do debate público de ideias, explicando às pessoas que projeto se tem para o país e depois, obviamente, cumprindo.