1. Imagine que está a correr uma mini maratona de 10 km, e que ainda faltam 3,75 km para a meta. Mesmo que vá na posição da frente, e que isso o faça sentir bem, é tão irracional fazer um sprint como achar que já ganhou. Do mesmo modo, quem vai em 2º, em 3º, ou em 4º lugar, ainda não perdeu. Essa é a distância aproximada a que estamos das eleições de 2019, pelo que há ainda muito caminho a percorrer. As sondagens que agora foram divulgadas, colocando o PS em primeiro, alimentam análises de cenários pós-eleitorais manifestamente prematuros e podem ter efeitos perversos. No PS podem ter um efeito de adormecimento, de que “isto já está ganho”, que espero que António Costa e, sobretudo, Ana Catarina Mendes combatam, ativando a necessária preparação programática para 2019, já a partir do congresso de Maio. No PSD podem ter um efeito de “isto já está perdido e vamos é pensar só no pós 2019”. Rui Rio está certo ao defender a estratégia de um “governo sombra”, mas veremos se é eficaz na sua implementação, sendo que já percebeu que Montenegro é o ausente-omnipresente  que lhe pretende suceder após as eleições. No PCP e no BE há o perigo de estratégias políticas baseadas na contabilidade do que se ganha e se perde com o apoio ao governo e de quem ganha mais e porquê.  A minha interpretação das sondagens é simples. O PS está a mostrar (nestes 6,25 km) que é possível governar à esquerda e gerir bem as finanças públicas. A larga maioria dos portugueses já percebeu que esta última é uma condição necessária de soberania nacional. O PS de Costa para além de ter inovado com a “geringonça”,  está em processo de liquidação do socratismo financeiro despesista da segunda legislatura que foi, e bem, punido nas urnas em 2011.

2. Em vez de olharmos para as sondagens devemos concentrar-nos na solução dos problemas que temos em mãos. Uma questão essencial é perceber, tendo em conta a desejável qualidade dos serviços públicos e o  nível de fiscalidade necessário para os financiar, qual o saldo orçamental que o país pretende alcançar. A polémica em torno da recapitalização da CGD contar, ou não, para o défice de 2017 esclarece-se com o Manual sobre o défice e dívida pública do EUROSTAT. Parece-me claro que parte deve ser considerado como injeção de capital (fluxo financeiro sem ir ao défice) e parte como transferência de capital (não financeiro, indo ao défice). O essencial é, porém, perceber como se alcançou este défice e se ele é sustentável.* Desta questão resulta uma outra que, não sendo fácil, exige análise, diálogo e sentido de responsabilidade: o processo de descongelamento das carreiras na função pública e a negociação em tudo o que tem impacto na massa salarial pública (emprego público, atualizações remuneratórias e suplementos). Um outro tema que testará a vontade política dos partidos é o pacote legislativo da transparência (enriquecimento injustificado, código de conduta de deputados, etc.) cujo debate será reiniciado esta semana na Assembleia da República (AR), depois de ter sido dado tempo ao PSD para após nova direção definir novas orientações. Este irá ser um dos grandes testes a Rui Rio. Será que quem tem vindo a defender a importância da reforma do sistema político e da ética na política irá recuar na altura de tomar decisões importantes? Irá ser também um teste ao PS esperando-se que apoie de forma sólida o que consta explicitamente do seu programa eleitoral. Também nesta semana a AR vai deliberar (em votação indiciária), após inúmeras audições e debates, sobre um direito humano fundamental: o direito a “ser-se quem se é”, uma expressão feliz de Agostinho da Silva, que aplico agora à condição das pessoas trans. Muita coisa importante se vai passar no país antes das eleições e o melhor é cada um, no seu lugar, assumir desde já as suas responsabilidades.

PS – A resposta a estas e outras questões está dada num livro que sairá esta  semana  “Uma Estratégia Orçamental Sustentável para Portugal”, na Almedina de P.T. Pereira, R. Cabral, L.T. Morais e J. A. Vicente, e será lançado a 10 de Abril no ISEG.     

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