Só há três soluções para o Brexit: um acordo de saída, uma saída sem acordo, ou continuar na União Europeia. O adiamento da saída ou um segundo referendo não são soluções. Apenas adiam a solução. Há uma boa imagem para perceber os dilemas britânicos. Uma casa tem três portas abertas, para os deputados entrarem por uma das portas, as outras duas têm que se fechar primeiro. Acabarão por entrar na porta que ficar aberta no fim, mesmo que o façam contrariados.

Uma das portas que está quase a fechar-se é a da saída sem acordo. A semana passada mostrou que há uma maioria clara nos Comuns contra a saída sem acordo. Se no dia 12 de Março, os deputados rejeitarem de novo o acordo assinado por Theresa May, no dia seguinte haverá uma votação a proibir uma saída sem acordo. Tudo aponta para um voto a impedir o chamado “hard Brexit”. A partir desse voto, a saída sem acordo fica afastada. Um adiamento da data do Brexit nada altera a esse respeito.

Ironicamente, só um segundo referendo poderia trazer de volta a hipótese do “hard Brexit”. Todos os que defendem um segundo referendo acreditam que desta vez o voto “Remain” ganharia. Mas muitas dessas pessoas esperavam o mesmo no primeiro referendo, e perderam. A história poderia repetir-se. Parece-me evidente que uma segunda vitória do voto “Leave” acabaria com um “hard Brexit”. Seria esse o mandato político de uma segunda derrota num referendo.

A decisão do partido Trabalhista de defender o segundo referendo parece sugerir que as hipóteses de uma segunda consulta popular aumentaram. Não estou convencido. Muitos deputados trabalhistas não querem um segundo referendo, especialmente aqueles que foram eleitos em localidades que votaram a favor do Brexit. O próprio Jeremy Corbyn não quer um segundo referendo. Politicamente, seria penoso ter que fazer uma campanha a favor do voto “Remain”, especialmente porque é a favor da saída da União Europeia. Corbyn tomou a decisão a favor de um segundo referendo apenas para evitar mais abandonos da bancada trabalhista no parlamento. Além disso, a maioria dos deputados britânicos percebeu que um segundo referendo seria um exercício político muito complicado. Como poderiam justificar perante os britânicos a sua incapacidade de executarem a decisão popular e democrática do primeiro referendo?

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Mas se não houver um segundo referendo, isso significa que a porta da manutenção na União Europeia também se fecha. Só um referendo poderia alterar o que um referendo escolheu. Mas mesmo que houvesse um segundo referendo, e no caso do voto “Remain” ganhar, quem pode garantir que não haveria um terceiro referendo? Foi um erro realizar um referendo sobre a Europa. Obviamente, seria um erro ainda maior fazer um segundo referendo.

Durante as próximas duas semanas podem fechar-se duas portas do Brexit: a porta da saída sem acordo e a porta da manutenção na União Europeia. Fica assim aberta apenas a terceira porta: o acordo de Theresa May. No próximo dia 12, para os Brexiteers do partido Conservador, a verdadeira escolha será entre o acordo de May e o risco do Reino Unido acabar por ficar na União Europeia. Os deputados conservadores a favor do “Remain” pensarão que um segundo referendo poderá resultar de novo na vitória do “Leave” e de um inevitável hard Brexit, risco suficiente para os levar a votar o acordo de May.

A política britânica está a passar por tempos de grande incerteza, e tudo pode ainda acontecer. As apostas não são seguras. Quase ninguém gosta do acordo de Theresa May. Mas, para ambos os lados dos Tory, por razões opostas, há riscos demasiado grandes. Apesar das divisões internas, o partido Conservador costuma mostrar nas horas difíceis um sentido de sobrevivência e um pragmatismo fortes. Veremos se ainda possui essas qualidades no dia 12. Mas o acordo de May ainda está vivo.