Informação não falta. Resta saber se vale alguma coisa ou se não se trata de propaganda. Depende de quem faz as sondagens… Mas não sabemos de quem dependem os gestores dos «cadernos eleitorais» nem quem são os inquiridores. Em Portugal, o rigor das estatísticas eleitorais continua a ser um mito alimentado pela comunicação social mas com pouca credibilidade pública. Mesmo sem «aldrabar» os resultados publicados, há múltiplos factores que afectam tais previsões, desde a dificuldade em construir amostras efectivamente representativas até ao abstencionismo nacional duplamente agigantado pelos falsos eleitores locais e pela incontrolável diáspora.

Com efeito, as sondagens eleitorais que nos são regularmente apresentadas não representam mais do que a convergência dos inquiridos que aceitam responder aos inquiridores, como se aqueles que recusam responder não tivessem opinião e como se os que responderam não viessem a abster-se quando chega o momento de votar ou mesmo a contrariar o voto predominante na comunicação social. Se a maioria dos inquiridos apoiar os vencedores anunciados pelas sondagens e pelos media, é inútil votar. Daí a abstenção em massa.

Tanto quanto se pode adivinhar, metade ou pouco menos dos eleitores abstém-se porque têm a ideia de que o resultado das eleições já está consumado. Segundo os resultados oficiais da eleição de 2019, 49% dos inscritos não votaram ou votaram branco ou nulo (quase 5%), ao todo, 50 e tal por cento de indiferentes. Os abstencionistas efectivos seriam claramente mais de metade dos votantes… Ora, que raio de democracia é esta? Para Rebelo de Sousa e António Costa, porém, este resultado CHEGA (é um jogo de palavras).

A culpa é dos abstencionistas? É e não é: parte deles já morreu e a maioria dos emigrantes é como se não existissem. Aliás, dar 4 lugares no parlamento a perto de 2 milhões de emigrantes é escarnecer deles quando os eleitores que efectivamente vivem em Portugal não passam de 8 milhões de pessoas. Há muitos anos, numa de muitas reuniões oficiais destinadas a actualizar o eleitorado (em número e residência), cheguei a sugerir que fosse refeito o recenseamento da população. Mas nem pensar!

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São as juntas e as câmaras dos dois partidos dominantes que controlam os cadernos eleitorais e, através destes, mais de dois terços dos votantes. Além disso, o financiamento às autarquias não corresponde à população efectiva mas sim ao número de eleitores. Se a actualização dos números iniciais tivesse sido feita ao longo de quase meio-século de eleições, outro galo cantaria, mas os representantes do governo da altura responderam à nossa proposta que «a maioria não se recensearia». É possível… mas não deixa de ser uma óbvia e grave deslegitimação das eleições.

Seja como for, a consequência mais evidente da crescente distorção do sistema eleitoral, para além da falsidade dos cadernos eleitorais e da enorme mas parcialmente falsa abstenção, é a queda da proporcionalidade entre o número de votos à escala nacional e o número de eleitos. A versão portuguesa do método de Hondt aplicado a distritos com populações de dimensão cada vez mais desigual, que vai de 2 deputados no distrito de Portalegre a 48 no de Lisboa, faz com que seja possível alcançar a maioria parlamentar com muito menos votos do que Cavaco Silva, que teve duas maiorias sucessivas de 50% em 1987 e em ’91. Em 2005, Sócrates já conseguiu essa maioria com apenas 45% e no próximo dia 30 não é impossível que 40% resultem em maioria parlamentar, coisa que até agora nunca sucedeu nem sucederia se a representação partidária fosse proporcional aos votos conquistados, mas isso muito longe de ser exacto.

Seja como for, o actual PS ficou em 2019 a oito deputados apenas da maioria absoluta com escassos 36% dos votos e não é impossível que 40% dos votantes – se lá chegar – lhe deem daqui a duas semanas 115+1 deputados como António Costa tem reclamado. Tal desproporção não só já não é aceitável como só poderá agudizar a luta política de um partido contra todos os outros. Conhecendo o manobrismo do actual PS, demonstrado na crise parlamentar em curso, é de ficar muito preocupado. Isto sem falar das políticas demagógicas e clientelares a que o primeiro-ministro nos habituou nos últimos seis anos com a inevitável desestruturação sócio-económica e ideológica do país.

A última sondagem apresentada até ao momento distingue-se por uma inabitual informação da empresa Aximage segundo a qual o líder do PS teria um «potencial de voto mediático» 14 pontos superior ao de Rui Rio… Tipicamente, uma ideia como este «potencial» constitui um novo ingrediente introduzido pelas empresas de sondagens que apontam com realismo ao eleitorado indeciso… Conforme sugeri, os resultados das próximas sondagens constituirão um indicador de voto favorável ao candidato com maior probabilidade de ganhar. Pode ser que assim não seja mas se for, a pescadinha terá metido o rabo na boca.