Desde as Eleições Europeias que o PAN constitui, para mim, motivo permanente de perplexidade e inquietude.

Faço já a minha declaração de interesses: Sou um indómito defensor da natureza e tenho e cuido de animais em permanência. A epagneul bretã e a dachshund que comigo vivem fazem, objectivamente, parte da minha família nuclear

Os cuidados animais e a defesa intransigente do ambiente com os olhos postos nos perigos crescentes das alterações climáticas devem constituir pressupostos civilizacionais do mundo moderno.

Claro que existem novos fenómenos como a política do alimento, a preservação do território e dos recursos endógenos, a gestão da água, a economia do mar, a agricultura biológica ou a economia circular que crescentemente merecem uma permanente interpelação e vigilância junto dos decisores para que as políticas públicas se conciliem com realidades que, cada vez mais, exigem intervenções mais prementes.

Julgo até que nenhum partido político pode, no programa que apresenta aos portugueses, em tempo de eleições legislativas, deixar de abordar de forma coerente e sistemática estas questões e chego a admitir que alguns destes problemas, pela novidade e emergência, exijam um olhar particular e especial, ao invés de ser meramente enquadrados em políticas estruturais mais amplas.

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Recordo – para os que não viveram ou não estudaram os primeiros anos dos Governos finalmente democráticos e não meramente revolucionários do “pós 25 de Abril” — que tivemos no Partido Popular Monárquico, sob a égide de Gonçalo Ribeiro Teles, e que integrava o arco governativo da Aliança Democrática, não só o primeiro partido verdadeiramente ambientalista, como aquele que liderou o único Ministério da história da democracia republicana verdadeiramente dedicado á “Qualidade de Vida” que era, de resto, o exacto nome do Ministério liderado por Augusto Ferreira do Amaral.

Tudo para poder dizer que partidos como o PAN meramente dedicados a causas específicas, por mais nobres que sejam, só se justificam por não parecer bem legislar para que tal não aconteça. Mas, entre esta inevitável tolerância e o risco de os partidos assim formados (o das tripas, ou da musica pimba) poderem ser levados a sério, fica a questão de perceber se não estamos já no plano da exploração das fragilidades sociais e culturais dos portugueses e da incontornável interrogação sobre o verdadeiro mérito, à luz do que se tem passado nas sociedades democráticas ocidentais, do sufrágio universal e das suas consequências.

Ouvir André Silva dizer inconcebíveis disparates sobre políticas económicas e sociais de extrema importância para o nosso futuro colectivo só pode ser ultrapassado, ao nível da diminuição do valor e responsabilidade da política e dos seus agentes, se corrermos o risco de ouvir o segundo, o terceiro ou o décimo candidato do PAN.

O Programa do PAN e as suas cerca de 1200 medidas (?) é um caótico repositório de ideias fragmentadas e incoerentes, formuladas de uma forma melodiosa ou, simplesmente, risível.

Da sua análise conjunta para a qual desafio o leitor, resulta o carácter esparso e fragmentado do documento e a sensação de uma gritante falta de fundamento que não resiste á simples e curial pergunta do “como se paga”?

A verdade é que a tolerância que a esquerda lhe tem dedicado não radica, como a maioria dos comentaristas tem avançado, na oportunidade de ter um partido espantalho que afugenta a maioria absoluta ao PS sem, no entanto, ter vida própria. A razão porque a esquerda parece dar um insólito “colinho” ao PAN tem a ver com o conhecido tique do “politicamente correcto” que não quer, junto da opinião pública, ficar colado à imagem de quem, por criticar o mensageiro, poder ser confundido com a crítica a causas que hoje podem ser consideradas de apoio universal.

O que releva nesta perplexa análise do pandemónio desconcertante de ideias que o PAN representa é o que isso significa de desprestígio e menoridade da política e de quem a representa.

Não muito diferente daquela que ainda recentemente ouvi de Rui Rio que não gosta de ser deputado porque reconhece que, quando o foi durante 10 anos, os parlamentares eram já de muito pior qualidade intelectual que os que lhe antecederam, mas também eram, inegavelmente superiores aos que hoje representam o Povo na Assembleia da Republica.

Moral desta triste História: ou mudamos as regras da Democracia ou um dia destes alguém acaba com ela!

(Presidente da AGAVI – Associação para a Promoção da Gastronomia, Vinhos e Biodiversidade)