O que caracteriza as sociedades democráticas é serem abertas à diversidade de ideias. Por seu lado, a imposição de ideias discutíveis, pela via da autoridade estatal, é característico de um género totalitário.

O País acordou com o despacho recente do Governo em matéria de educação para a promoção da identidade de género. É também de Agosto (do verão passado) a lei do chamado direito à autodeterminação da identidade de género, que aquele despacho pretende agora regulamentar.

A propósito da lei, a maioria julgou que se tratava apenas de uma questão de permitir aquilo que cada um quer para si. Para mais quando se estabeleceu um procedimento minimamente formal para a “legalização” da alteração de género, que pressupunha alguma maturidade — o pedido apenas é admissível a partir da idade adulta ou, com intervenção dos representantes legais, a partir dos 16 anos.

Mas no meio daquela lei, e muito para além do direito de um jovem ou adulto poder querer alterar no registo o seu nome e o seu género, já se previa que as escolas, desde o 1.º ciclo de estudo, tomassem medidas concretas para promover a comumente chamada ideologia de género.

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Se dúvidas houvesse bastaria esperar pela regulamentação da lei – esta tal que foi publicada agora — para que tudo ficasse claro.

E que ideologia é essa? Aquela que serve a ideia de que o género é matéria meramente volitiva ou de construção social. Que independentemente da idade e sem que se explique exatamente como é que isso se processa, a criança pode escolher (“autoatribuir”) um género, uma identidade, um nome, a casa de banho e o vestiário que pretende utilizar.

O entendimento subjacente à ideologia de género tem uma visão – chamemos-lhe filosófica, antropológica ou ideológica — que, por mais estranha que possa parecer à maioria dos mortais, certamente ninguém quer proibir de ser defendida. No entanto, deve ter o lugar que numa sociedade aberta se consagra a toda a diversidade: espaço para ser afirmada ou contestada, mas nunca imposta.

Ora o que se passa, pelo contrário, é que, na sua senda “educadora”, a lei determina que avance uma brigada de formação para as escolas para assegurar que ninguém se afasta daquela nova “ortodoxia”. E que a escola tem de se conformar com a linha ditada.

Da apropriação do combate à violência de género – combate que todos partilhamos — passou-se uma linha também ela violenta. E que linha é essa? A de que em matéria de educação, a liberdade tem de ceder diante de ideias que são no mínimo discutíveis. A linha de que basta a autoridade para se impor um caminho que assenta numa determinada concepção do corpo, da pessoa, da vontade e da liberdade. A de que o Estado se pode intrometer nas questões mais vitais, como se estivesse melhor colocado e soubesse avaliar melhor o que é bom para cada criança.

É natural que este combate indigne tantas famílias, pois o que está em causa são direitos elementares das crianças, que à família, em primeiro lugar, cabe proteger. É a Declaração Universal que determina que a família tem direito a ser protegida diante do Estado, Estado que, ao contrário do que estabelece a Constituição da República Portuguesa, está mesmo a programar a educação segundo diretrizes filosóficas, políticas e ideológicas.

Filipe Anacoreta Correia é advogado