Não é só a “Gravitas“, isso não chega. É também a “Autorictas“, sobretudo ela. Mas não se chega lá porque sim.

Com Isabel II, morre o último estadista com um papel histórico relevante no século XX.

Isabel viu, em vida, o seu tio e Rei abdicar do trono, que passou para seu pai, o que fez dela a improvável e inesperada herdeira da coroa britânica.

Assistiu à ascensão e queda de Hitler na sua juventude. Acompanhou os horrores da II Guerra Mundial, onde ainda serviu como condutora e mecânica de ambulâncias.

Muito jovem, por morte prematura do seu pai, tornou-se Rainha do maior império do mundo, o qual viu também desmoronar-se.

Testemunha viva da Guerra Fria e de muitos outros conflitos, da construção e queda do muro de Berlim, da chegada do homem à lua, da SIDA e da COVID, do assassinato de Martin Luther King e de JF Kennedy, Isabel II ouviu Maria Callas ou Pavarotti cantar ao vivo, viu o nascimento dos Beatles, dos Rolling Stones ou das Spice Girls, horrorizou-se com o atentado às Twin Towers…

Com Isabel II, morre uma das últimas memórias vivas de alguns dos principais acontecimentos do século XX. Morre uma era.

Não se chega a esta aura, na morte, porque sim.

Chega-se por uma vida de responsabilidade, da cada vez mais rara noção do dever, pela independência de que só os supra-partes verdadeiramente são capazes, pelo recato, pelo respeito pelos outros, por todos os outros, pela humildade, pelo fardo insustentável de servir, pela consciência plena do que é a honra.

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Tudo isto vivido em solidão, até face à própria família, porque a coroa pesa mais do que tudo.

Isabel II morreu.

Como monárquico, sinto a morte da Rainha. Sentiria também, como republicano, também devido a esta noção de que a soberana foi uma mulher rara, uma estadista que sempre se preocupou mais em cumprir o dever, do que em ser popular, e rejeitou sempre o caminho fácil do estrelato pop.

Respect.

God save the Queen