O Convicto. Este é o Marcelo das segundas-feiras. Aquele que, dizem, no seu segundo mandato, como já não precisa de ser reeleito, vai então dar mostra das suas convicções. E não menos importante impor-se ao PS. O problema de Marcelo, O Convicto, ou “Marcelo das segundas-feiras” é que as convicções de Marcelo não são conhecidas ou tornaram-se conhecidas precisamente por poderem ser uma coisa ou o seu contrário. Quanto ao segundo item de Marcelo, O Convicto – impor-se ao PS e à forma como este está a capturar o Estado – é do domínio do puro mistério (ou da fé) supor que num segundo mandato Marcelo fará o que nunca até agora fez, para mais quando, para ser eleito, precisa agora do apoio dos socialistas. Vai o PS apoiar a reeleição de Marcelo para que este lhe marque limites?

O que está em causa portanto não é a possibilidade de Marcelo afirmar as suas convicções, admitindo que as tem, perante quem quer que seja – sobretudo se esse quem for o PS. O que Marcelo, o Convicto, agora quer é que aquele eleitorado que o colocou em Belém e que ele desprezou como se lhe causasse urticária durante todo o seu mandato, o apoie qb para ele, Marcelo, não ficar fragilizado nas mãos dos socialistas.

O Hábil. Este é o Marcelo das terças-feiras. Um ser inteligentíssimo e habilíssimo que está sempre a meter no bolso alguém (a linguagem política em Portugal está cada vez mais uma conversa de miúdos: são as bazukas, o meter no bolso, o super isto e super aquilo…)

Neste mete e tira dos bolsos, Marcelo, o Hábil terá metido no bolso António Costa (o contrário também é válido) e é suposto que os demais, deslumbrados com o ilusionismo de tudo isto, apoiem Marcelo porque ele é um mestre da arte de meter políticos no bolso. Já se viu votar por piores razões mas nunca tão parvas.

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Para lá das consequências que esta leviana prestidigitação tem tido na vida do país, Marcelo sobrevaloriza a sua habilidade ao ponto de perder a noção do ridículo e do risco, como ainda agora se viu com as suas sucessivas declarações no caso Novo Banco-Mário Centeno ou sobre as comemorações do 1º de Maio. O reverso de tanta habilidade é que Marcelo nunca se considera responsável por nada.

O Popular. Este é o Marcelo das quartas-feiras. E é o lado mais nefasto do actual Presidente pois a popularidade para Marcelo deixou de ser um meio para se tornar um fim. Mas acontece que, ao procurar ser popular a todo o custo, Marcelo perdeu votos entre aqueles que o elegeram em 2016 e não se sabe quantos ganhou entre a esquerda. Marcelo, o Popular, conta agora com o apoio do PS. Mas ao certo esse apoio vale-lhe quantos votos? Os partidos não votam. Quem lesse os jornais esta semana até podia acreditar que sim, que António Costa estava já a depositar os votos dos eleitores socialistas numa qualquer urna colocada para o efeito na AutoEuropa. Mas há que perguntar: quantos socialistas vão sair de casa para votar em Marcelo Rebelo de Sousa? Recordo que o eleitorado socialista não tem um candidato presidencial para vencer desde 2006, ano em que, perante a candidatura de Cavaco Silva, o PS se dividiu entre Mário Soares e Manuel Alegre. Obviamente o PS perdeu. Tal como perdeu em 2011. E em 2016. Em 2021, votar Marcelo pode ser visto pelos dirigentes socialistas como voto útil – e realmente é! – mas para que milhares de socialistas se ponham numa fila no próximo mês de Janeiro com o objectivo de votar Marcelo é necessário mais, muito mais, que a vontade de quem manda no PS.

O Último Reduto. Este é o Marcelo das quintas-feiras. O homem que garante que o PS não controla tudo e todos. A imagem de Marcelo, Último Reduto pode ser tentadora mas é sobretudo uma perigosa miragem. Marcelo não só não foi reduto algum à hegemonia do PS como contribuiu activamente para a irrelevância da direita. Primeiro porque lida mal com a comparação com outros líderes do PSD, como são os casos de Cavaco Silva ou Passos Coelho. Depois porque dá como adquirido que aos eleitores de direita não se prestam contas. Daí a importância de uma candidatura à direita, uma candidatura que aproveite a oportunidade dada pelas presidenciais para romper o reduto que Marcelo realmente construiu e que não é o que contém a esquerda mas sim o que acantonou a direita numa espécie de terreno em pousio, à espera do momento certo que nunca o é, do líder certo que nunca tem e da estratégia brilhante que nunca brilha para se afirmar como alternativa.

O Transversal. Este é o Marcelo das sextas-feiras. Para Marcelo conseguir mobilizar os votos socialistas e recuperar os votos daqueles que agora dizem estar arrependidos por o terem eleito precisa de candidatos extremistas à sua esquerda e à sua direita. Nesse sentido o fantasma de André Ventura é-lhe útil. Uma candidatura com um discurso radical à esquerda faz-lhe igualmente falta para poder afirmar essa transversalidade. Marcelo, o Transversal, precisa de radicais para que a sua transversalidade aconteça.

… E a semana acaba aqui não porque não exista um Marcelo dos sábados e outro dos domingos mas sim porque dois dias devem ser reservados a reflectir no seguinte e por esta ordem: como é que Marcelo acabou a impor a sua candidatura em 2016? Como é que se pode evitar que um fenómeno semelhante aconteça de novo em 2026? Não, não me enganei, as presidenciais que há que preparar são as de 2026. E isso começa a tratar-se em 2021.