Os partidos uniram-se para fintar uma inconstitucionalidade da lei de financiamento dos partidos e apresentaram um projeto conjunto que dá ao Tribunal Constitucional (TC) poderes para controlar as contas dos grupos parlamentares e as subvenções pagas pelas assembleias legislativas regionais aos partidos. Mas esta nova legislação pode também ela voltar a encalhar no Palácio Ratton. É que a Entidade das Contas e Financiamento dos Partidos tem considerado nos últimos anos que as próprias subvenções são ilegais.

O início da imbróglio que os partidos tentaram agora resolver num projeto de lei conjunto, como noticiou o Diário de Notícias, vem de trás. O TC considerou em dezembro que uma norma interpretativa da lei de financiamento dos partidos violava a Constituição. A norma esclarecia que cabia àquele tribunal fiscalizar as ações “relativas às subvenções públicas auferidas por grupos parlamentares ou deputado único representante de um partido e aos deputados não inscritos em grupo parlamentar ou aos deputados independentes na Assembleia da República e nas assembleias legislativas das regiões autónomas, ou por seu intermédio, para a atividade política e partidária em que participem, cabe exclusivamente ao Tribunal Constitucional”. Mas o caso especial chama-se “jackpot da Madeira”.

Acontece que o Tribunal dizia que esta alteração tinha de ser feita por lei orgânica, ou seja, não passou por uma inconstitucionalidade formal. Com o chumbo, o Constitucional continuou de mãos atadas sem poder fiscalizar por exemplo o “jackpot da Madeira” – subvenção paga pela Assembleia Regional aos partidos regionais, aumentada por Alberto João Jardim. Entretanto, o aumento foi revogado por Miguel Albuquerque, o novo líder do PSD-Madeira que sucedeu a Jardim. Mas os partidos do continente decidiram assim apresentar um projeto lei conjunto em que alteram a lei orgânica do Tribunal Constitucional para lhe dar competências para fiscalizar quer esse dinheiro, quer o dinheiro auferido pelos grupos parlamentares da Assembleia da República.

Mas esta mesma alteração pode ela voltar a ser ilegal. Se no acórdão de dezembro, o TC considerava apenas uma inconstitucionalidade formal, como o Observador escreveu na altura, isto não quer dizer que não houvesse ilegalidades (ou mesmo inconstitucionalidades) de outra índole. O Tribunal pode considerar que as subvenções pagas pela Assembleia Legislativa Regional da Madeira são ilegais. É isso que também tem vindo a escrever em sucessivos acórdãos nas contas anuais dos partidos. Ou seja, esta alteração à lei proposta pelos partidos é uma alteração que, através de uma atribuição de competências ao TC, está a legalizar uma subvenção que o próprio Tribunal Constitucional considera ilegal.

Se o problema da legalidade das próprias subvenções se tem colocado, o mesmo não se aplica ao dinheiro recebido pelos grupos parlamentares. Neste caso, a discussão poderá ser semântica e jurídica. Ou seja, se um grupo parlamentar pode ou não ser considerado parte do partido. Se for, não haverá problema em ser fiscalizado pelo Tribunal Constitucional, que, através da Entidade das Contas, é a entidade que tem como competência a fiscalização das contas dos partidos e das campanhas eleitorais. Se não for, e for considerada entidade pública, recairá na alçada do Tribunal de Contas.

Mas além disso, a proposta dos partidos não estabelece a competência da Entidade das Contas. Dá apenas competência de fiscalização ao TC e não à entidade, o que deverá levar a nova alteração legislativa.

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