O papa Francisco desloca-se no sábado a Sarajevo, numa visita de um dia destinada a “encorajar o cruzamento” de mundos e religiões na Bósnia-Herzegovina, 20 anos após os acordos que puseram fim à guerra.

“Venho até vós (…) para exprimir o meu apoio ao diálogo ecuménico e inter-religioso e, sobretudo, para encorajar uma coabitação pacífica no vosso país”, escreveu o papa numa mensagem enviada na segunda-feira aos habitantes de Sarajevo.

Pouco mais de oito meses após uma visita à Albânia, outro país balcânico na “periferia da Europa”, Jorge Bergoglio confirma o seu compromisso em relação à coexistência dos povos e das religiões.

Na Albânia, como na Bósnia, o poder é partilhado entre representantes de diferentes tradições religiosas.

O país de 3,8 milhões de habitantes é composto por duas entidades, a Republika Srpska (República Sérvia), onde os sérvios (cristãos ortodoxos) são maioritários, e a Federação Croato-Muçulmana, na qual os muçulmanos são largamente mais numerosos que os católicos croatas.

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A Presidência bósnia, com quem o papa se reunirá durante a manhã, é alternativamente ocupada de oito em oito meses por um representante sérvio, muçulmano e croata. Neste momento, é o representante sérvio quem ocupa o cargo de Presidente.

É precisamente este sentido de comunidade que o papa Francisco tenciona promover, num país marcado pela história e onde a guerra intercomunitária deixou sequelas.

O papa vai a Sarajevo “para transmitir uma mensagem de paz, de reconciliação, de construção conjunta de um país” onde o “diálogo inter-religioso é essencial”, explicou na semana passada à imprensa o padre Federico Lombardi, porta-voz do Vaticano.

O momento alto da visita, que terá a duração de uma dezena de horas, será o encontro inter-religioso, na tarde de sábado. Francisco reunir-se-á com os representantes das religiões católica, ortodoxa, muçulmana e judaica.

Os muçulmanos são maioritários na Bósnia, onde representam cerca de 40 por cento da população. Seguem-se os ortodoxos sérvios, com 31 por cento, e os católicos, quase todos croatas, com 10 por cento. Os judeus são uma pequena minoria.

A minoria croata católica sente-se asfixiada no país dividido em dois pelos acordos de Dayton de 1995, que puseram fim a uma guerra (1992-95) que fez cerca de 100.000 mortos. Mas o papa tentará, todavia, encorajá-los a ficar, e a viver em conjunto, apesar dos cerca de 300.000 católicos (de 800.000 antes da guerra) que já abandonaram a Bósnia desde os anos 1990.

Uma missa “pela paz e pela justiça” realizar-se-á no estádio olímpico de Sarajevo, onde são esperadas mais de 65.000 pessoas.

Francisco ouvirá igualmente testemunhos da guerra, incluindo alguns muito dramáticos, como os de dois padres e uma freira, e também, durante a tarde, os de uma sérvia e de um católico croata, na visita a um centro de jovens.

Aí, o coro infantil de Srebrenica, cidade que se tornou um símbolo da tragédia que foi a guerra da Bósnia, cantará para o papa.

O coro “Superar”, composto por 40 meninos e meninas sérvios — cristãos ortodoxos e muçulmanos -, todos nascidos em Srebrenica, cantará no encontro com Francisco, num exemplo de tolerância e reconciliação, após o massacre ocorrido na cidade durante o conflito.

Em julho de 1995, pouco antes do fim da guerra da Bósnia, tropas sérvio-bósnias tomaram Srebrenica, então protegida pela ONU, e mataram cerca de 8.000 rapazes muçulmanos. Foi o maior massacre na Europa desde a Segunda Guerra Mundial.

Nenhum dos meninos do coro era ainda nascido quando tal sucedeu, mas esse assassínio em massa continua a envenenar as relações entre as duas principais comunidades da cidade de 15.000 habitantes.

Durante a visita papal, pelo menos 5.000 polícias estarão destacados em toda a capital bósnia, mas o Vaticano não está preocupado.

“Não há uma particular preocupação quanto à segurança” do papa, assegurou o padre Lombardi à imprensa.

Esta será a segunda visita de um chefe da Igreja Católica a Sarajevo, depois da efetuada em 1997 por João Paulo II, que também se deslocou, em 2003, a Banja Luka, na Bósnia.

Trata-se da terceira viagem do papa Francisco na Europa, após as realizadas a Estrasburgo, à sede do Parlamento Europeu, e à Albânia.