Dificilmente o debate quinzenal agendado para esta quarta-feira vai ser um passeio no parque para o primeiro-ministro. Desta vez, a pressão não virá só da direita: com a reestruturação da Caixa Geral de Depósitos na agenda, e a sombra de despedimentos no banco público no horizonte, BE e PCP vão juntar-se à oposição de direita e vão exigir explicações a António Costa.

Em jeito de antecipação do debate, o primeiro-ministro adiantou já esta terça-feira que o acordo com Bruxelas está quase fechado. Perante a Câmara do Comércio, Costa defendeu que o banco “100 por cento público” deve ter “uma gestão profissional”. Mas isto não chega: todos os partidos querem saber mais.

O debate quinzenal vai ser aberto pelo secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, que vai exigir explicações sobre a CGD, confirmou o Observador. Já esta terça-feira, o líder dos comunistas defendeu a recapitalização da Caixa, mas frisou que a injeção de capitais públicos deve servir para o “fortalecimento” do banco.

Se diminuem as áreas de intervenção da CGD, as consequências sobram para os trabalhadores. Essa ideia do fortalecimento é a melhor garantia de não haver despedimentos coletivos e em massa”, sublinhou, à margem de uma visita a uma exploração leiteira, em Braga, citado pela Lusa.

Ou seja, para os comunistas é fundamental que o dinheiro do Estado não seja usado para “tapar buracos”, mas antes para o “fortalecimento da atividade da CGD”.

Quem também está preocupado com o futuro da Caixa e com os planos do Executivo é o Bloco de Esquerda. E Catarina Martins, coordenadora do BE, vai mostrar isso mesmo ao primeiro-ministro. Mariana Mortágua, deputada bloquista, confirmou ao Observador que a líder do BE vai pedir explicações a António Costa sobre o assunto.

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“Não pomos em causa a necessidade de uma recapitalização pública, isso para nós não é drama nenhum”, garante Mariana Mortágua.

Mas não conhecemos o plano de reestruturação e ele tem de ser conhecido”, frisou,

A deputada adiantou os temas que mais preocupam os bloquistas e sobre os quais vão questionar o primeiro-ministro: “Como se justificam necessidades de capital de quatro mil milhões de euros, qual é o ponto de situação das negociações com a Comissão Europeia, qual é o modelo de governança que está a ser definido”.

Porque para Mariana Mortágua “não faz sentido” falar de aumentar os salários da administração do banco, ao mesmo tempo que se fala de despedimentos de trabalhadores. A ideia do BE é, por isso, esclarecer o assunto “até para que a dúvida não alimente debates de pessoas e partidos que podem colocar em causa estabilidade do banco”, critica a deputada.

É, aliás, por isso que Mariana Mortágua pede cautela em relação a hipóteses como a da criação de uma comissão parlamentar de inquérito, sugerida pelo comentador e social-democrata, Marques Mendes. Sem querer “fechar portas a nada”, e admitindo até a necessidade de se investigarem “casos como o do Vale do Lobo”, a bloquista avisa que “o assunto é sensível” e que deve ser tratado como tal. É que a CGD está em funcionamento e ninguém sabe quais seriam as consequências para a estabilidade do banco que resultariam da abertura de uma comissão parlamentar de inquérito.

Já Jerónimo de Sousa afastou mesmo essa possibilidade:

Ouço alguns dizerem que querem perguntar, acho que não é preciso nenhuma comissão de inquérito. PSD e CDS podem perfeitamente ter a informação toda tendo em conta que durante anos PS, PSD e CDS, à vez ou numa espécie de Tratado de Tordesilhas, geriram a CGD através de dirigentes partidários”, acusou o comunista, esta terça-feira.

Pela direita, o PSD entregou 30 perguntas ao Governo sobre a CGD, esta segunda-feira. E também sugeriu que até podem servir de “guião” para o Governo, durante o debate quinzenal. Há dúvidas, aliás, que são coincidentes com as do BE.

Os sociais-democratas querem saber como é que se justifica uma injeção de capital na ordem dos quatro mil milhões, um valor que será superior ao das necessidades do banco; querem saber o impacto que a operação terá nas contas públicas, querem uma atualização sobre as negociações com Bruxelas. Mas não afastam a hipótese de uma comissão parlamentar de inquérito:

Não podemos banalizar um instrumento, mas tudo depende das explicações que o doutor António Costa dê ao parlamento e aos portugueses”, disse o deputado do PSD, Duarte Pacheco, citado pela Lusa.

Na semana passada, o ministro das Finanças, Mário Centeno, confirmou que estão em curso negociações com a Comissão Europeia com vista à aprovação de um novo plano de reestruturação para a CGD, de modo a poder ser realizado um reforço de capital público que não seja considerado ajuda de Estado.

Para que tal seja possível, será necessário que a operação ocorra em condições de mercado e seja considerada um “investimento”, sublinhou o governante. Daí que o Executivo tenha revisto o estatuto dos gestores da CGD e garanta que as remunerações dos trabalhadores vão deixar de estar sujeitas às restrições do Orçamento do Estado, passando a estar alinhadas com as do setor privado.

Também as condições de aprovação de créditos no passado estão a gerar polémica, com o Correio da Manhã a antecipar resultados parciais de uma auditoria que dão conta de irregularidades.

Atualizado com declarações do primeiro-ministro sobre o ponto de situação das negociações com a Comissão Europeia.