A Polícia Judiciária já ouviu diversas testemunhas dos incidentes em Ponte de Sor que envolveram os filhos do embaixador do Iraque e aguarda a qualquer momento autorização médica para serem realizados exames periciais a Rúben Cavaco — a vítima que saiu esta manhã da situação de coma induzido, segundo a RTP.

“Estão a ser feitas todas as diligências que podem ser feitas sem colidir com a imunidade diplomática”, afirmou fonte da PJ ao Observador.

O objetivo da Judiciária passa por realizar e concluir o mais rápido possível a investigação ao caso das agressões a Rúben Cavaco para, em conjunto com o Ministério Público, propor ao juiz de instrução criminal o interrogatório de Haider e Ridha, os filhos menores do embaixador Saad Mohammed Ali — que, entretanto, foi chamado de urgência a Bagdade.

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Saar Mohammed Ridha, embaixador do Iraque em Lisboa e pai dos agressores de Rúben Cavaco. Créditos: Arquivo da Presidência da República.

Desde que tomou o caso em mãos, a PJ tem dado prioridade ao caso. A investigação foi passada a uma brigada de homicídios da Diretoria de Lisboa que se deslocou ao terreno, em Ponte de Sor, para inquirir as diversas testemunhas que presenciaram os acontecimentos. Desde os seis amigos de Ruben Cavaco que protagonizaram a primeira rixa próximo do bar Koppus, passando pelos clientes deste estabelecimento de diversão alentejano e terminando nas pessoas que testemunharam o reencontro de Haider e Ridha, os filhos do diplomata iraquiano, com Rúben — todos têm sido localizados e inquiridos pela Judiciária.

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Uma das diligências que deverá ser feita nos próximos dias diz respeito à realização de exames periciais a Rúben Cavaco, de forma a que sejam incluídos nos autos do inquérito criminal aberto pelo Ministério Público as provas dos múltiplos ferimentos sofridos que levaram a vítima de 15 anos a uma situação de coma induzido pelos médicos do Hospital de Santa Maria, em Lisboa.

O testemunho de Rúben Cavaco deverá ocorrer igualmente nos próximos dias, mal se verifique autorização médica para o efeito.

Questionada pelo Observador sobre os crimes que levaram o Ministério Público a abrir o inquérito judicial, fonte oficial da Procuradoria-Geral da República não quis responder de forma direta. “O inquérito encontra-se em investigação com vista ao apuramento dos factos e respetivo enquadramento jurídico”, afirmou a mesma fonte.

Segundo diversos juristas contactados pelo Observador, um inquérito com as características do caso de Ponte de Sor contém indícios que apontam para dois crimes: ofensa à integridade física ou homicídio na forma tentada.

No caso do crime de ofensa à integridade física é necessário, na sua forma simples, que haja uma queixa da vítima. Mas o Ministério Público tem a possibilidade de abrir o inquérito com base nesse crime mas na forma qualificada e agravada, devido ao facto de a vítima (Rúben Cavaco) não estar em condições de apresentar queixa.

Fontes da PJ explicaram ao Observador que é legal que as brigadas de homicídios daquela polícia investiguem igualmente crimes de ofensa à integridade à física na forma qualificada — e não apenas crimes de homicídio. “O desenrolar da investigação é que permitirá saber se se trata de um crime de ofensa à integridade física, na forma qualificada e agravada pelas consequências das agressões, ou de um crime de homicídio na forma tentada”, explica uma das fontes.

Advogado diz que Rúben vai fazer “avaliação neurológica”

O advogado de Rúben Cavaco, Santana Maia Leonardo, falou à comunicação social pouco depois de a imprensa iraquiana ter avançado que o embaixador do Iraque em Lisboa foi chamado de urgência a Bagdade. Esta reunião vem precisamente na sequência do caso de agressão entre o jovem português de 15 anos e os dois filhos de Saar Mohammed Ridha em Ponte de Sor, distrito de Portalegre. Entretanto, Maia Leonardo confirmou que Rúben Cavaco já não está nos cuidados intensivos do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, mas que vai ser submetido a uma “avaliação neurológica”.

Maia Leonardo disse aos jornalistas que “há uma situação de vantagem em que alguns já puderam fazer a sua defesa, outros nem sequer puderam apresentar a sua defesa nem uma queixa porque não estão em condições físicas para o fazer”. Para dar continuidade ao processo, é necessário que se levante a imunidade diplomática a que os dois gémeos de 17 anos seja levantada. Mas isso depende do Ministério Público: “É o MP que sabe os dados e as situações, o que investigou e o que falta investigar”. No entanto, os filhos do embaixador do Iraque em Lisboa ainda não invocaram essa imunidade neste caso.

O advogado, natural de Abrantes, diz não poder fornecer mais informações sobre o caso “Eu não sou testemunha. Há pessoas que, quando lhes põem um microfone à frente, dizem mais do que sabem. Outras dizem menos. Eu sou advogado, portanto não posso dizer nada”. Sobre as declarações feitas pelos dois rapazes iraquianos à imprensa portuguesa, Maia Leonardo diz ser “natural que, depois de todo este impacto mediático, eles tenham necessidade de dizer alguma”. Os dois irmãos gémeos dizem também terem sido agredidos por seis rapazes que acompanhavam Rúben Cavaco na noite dos acontecimentos. O advogado de defesa da família declarou que não falou com esses rapazes. “Não me ficaria bem andar por aí a falar com testemunhas”.

A versão dos iraquianos

De acordo com os relatos feitos por Ridha e Haider, a discussão começou na estrada à porta do Bar Koppus, em Ponte de Sor. Quando saíram, Ridha terá conseguido entrar no carro em que tinham chegado ao local. Haider ficou para trás e terá sido abordado por Rúben Cavaco e “mais cinco ou seis pessoas”, contaram os filhos do embaixador numa entrevista à SIC. “Tentei defender-me levantando as mãos, para evitar que eles se aproximassem do meu irmão. Mas fui atacado e passei pelas mãos de todos eles”, diz Haider.

Mesmo assim, os dois irmãos terão abandonado o local. Voltaram mais tarde, alegadamente para ir buscar “algumas coisas que tinham ficado para trás” após o incidente. Nesse momento, voltaram a encontrar-se com Rúben Cavaco. “Ele disse algo em português que eu não entendi, mas falava com um tom agressivo, como se quisesse começar uma nova discussão”. Haider terá sido agredido por Rúben na cara e nos ombros nessa altura e o português terá começado a correr. “Senti-me extremamente insultado e não podia tolerar mais”, disse Haider. Começou então a correr atrás do jovem.

Atrás de Haider veio Ridha. “O meu irmão veio para me ajudar a bater nele”. Rúben Cavaco acabou no chão. “Dei-lhe mais alguns pontapés, mas depois o meu irmão disse-me para parar, porque ele já estava no chão”, relata Haider. Questionados sobre o que pensariam se o governo iraquiano lhes retirasse a imunidade diplomática, ambos afirmaram que estão “prontos para assumir completa responsabilidade por estes atos”.