O ponto de encontro estava marcado nos armazéns da praia dos Pescadores em Cascais. Às 10h há ordem para entrada no barco e, já devidamente equipados com galochas, calças impermeáveis e colete salva-vidas, os chefs Tiago Bonito (do Largo do Paço, em Amarante, que tem uma estrela Michelin) e Miguel Laffan (cozinheiro no L’and, restaurante estrelado em Montemor-o-novo), entram no “Dragão Azul” — barco que os iria levar até às redes lançadas pelos pescadores na noite anterior.

“Estão ali as gaivotas, eles [peixes] devem estar lá, é a nossa teoria esperançosa”, diz Carlos Ambrósio, mestre do “Dragão Azul”.

Em jeito de passeio, junto à costa, com vista para a linha de Cascais, chegamos finalmente ao local onde José e Carlos Ambrósio tinham deitado as redes na noite anterior, devidamente assinaladas por umas bandeiras com o seu nome. Começam, então, a aladar (retirar) as redes do mar na convicção de que haja peixe. A esperança dos chefs e dos pescadores começava a dissipar-se à medida que a rede começava a ocupar grande parte do pequeno espaço do “Dragão Azul” e peixe… nem vê-lo.

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No fim, e já conformados com o facto de não haver peixe, eis que ‘saltam’ para o convés três douradas. “Três douradas bem jeitosas, a maior deve ter uns 4kg e a mais pequena uns 2kg. Nada mau”, diz José Ambrósio com um sorriso nos lábios, partilhado por todos no barco. “Já temos almoço, não é chefs?”.

O plano inicial era retirar somente uma rede naquela manhã mas o entusiasmo apoderou-se dos presentes e o desafio foi aceite: “Vamos a mais uma ou não, mestre?”, pergunta o chef Tiago Bonito. O ânimo e a confiança deram, pelos vistos, sorte e mais duas douradas vieram na segunda rede. “Agora sim, cinco douradas, já ninguém passa fome hoje”, exclama Laffan.

Dois pescadores: um ex-polícia da brigada anticrime e um ex-nadador-salvador

José, de 33 anos, e Carlos Ambrósio, de 45 anos, são irmãos e dedicam-se à pesca a tempo inteiro há apenas dois anos. Foram eles que levaram os cozinheiros à pesca.

José sempre esteve ligado ao mar e foi desde dos 18 anos nadador-salvador em Cascais. “Conheço estas águas como a palma da minha mão e por isso o mar é a minha primeira casa”. Dedicou-se à pesca há um ano por influência do irmão, que já era pescador . José e Carlos compraram duas embarcações iguais, a “Pai, mãe Júnior” e o “Dragão Azul”.

Carlos pertencia à Polícia de Segurança Pública (PSP) e estava na Unidade de Brigada Anticrime, trabalhou durante 22 anos até pedir uma licença sem vencimento para cumprir à risca aquilo que sempre o aconselharam a fazer: “Disseram-me para me dedicar à pesca, achei que tinham razão e cá estou eu”.

Na chegada à marina de Cascais, José e Carlos, começaram a preparar o peixe enquanto outros colegas seus ficaram encarregues de preparar o carvão. O almoço foi servido de uma forma informal e tipicamente portuguesa: com pão, salada e cervejas.

Miguel Laffan, cozinheiro há praticamente 20 anos, com uma estrela Michelin e natural de Cascais, não revela os pratos com que vai presentear o público do festival mas garante que vão ser todos à volta do peixe e do marisco, como forma de homenagear a região. Espera que seja a primeira de muitas edições e adianta ainda que “a Vila de Cascais está a renascer e sempre foi uma zona tradicionalmente muito ligada ao peixe e que, por isso, faz todo o sentido este festival realizar-se em Cascais”.

Tiago Bonito, chef com 30 anos e também detentor de uma estrela Michelin, explica que aceitou o convite para participar neste festival por achar que todos os projetos que tenham a ver com gastronomia “são para serem incentivados, não por ser cozinheiro mas sim porque somos um país muito rico e com uma diversidade gastronómica enorme. Iniciativas deste género só nos valorizam enquanto país”. O jovem cozinheiro espera também que este festival venha a ser frequentado não só por portugueses mas também por estrangeiros. “É importante que este festival seja visitado por estrangeiros para que eles consigam conhecer a nossa gastronomia e conhecer-nos melhor como país e consequentemente levar a nossa gastronomia além fronteiras”.

Também o chef Henrique Sá Pessoa marcou presença no evento. Conta ao Observador que o primeiro restaurante que chefiou, em 2003, era em Cascais e que tem uma enorme ligação com a região. “Sem dúvida que Cascais, para nós cozinheiros, tem uma oferta enormíssima no que diz respeito ao mar e a tudo o que lhe é associado”. Também sem querer revelar o que vai levar ao festival garante que os seus pratos vão ser todos à volta do peixe e do marisco. Justifica a opção: “Peixe e marisco são das coisas que mais gosto de cozinhar”.

O festival realiza-se nos dias 15, 16 e 17 Dezembro no Centro de Congressos do Estoril e vai ter três espaços distintos: O restaurante com menus de degustação feitos pelos chefs Michelin, um espaço reservado para conferências e uma área destinada a showcookings.