O Banco Central Europeu vê sinais de sobrevalorização no mercado imobiliário chinês e está preocupado que uma crise neste setor na segunda maior economia do mundo possa levar a uma queda no crescimento económico com impacto no crescimento mundial, e na zona euro, de acordo com o Boletim Económico publicado esta quinta-feira pela instituição. Em Frankfurt, o crescimento dos preços nas principais cidades chinesas na última década já é comparado com o que aconteceu nos Estados Unidos antes da crise de 2008.

Numa caixa incluída no boletim publicado esta quinta-feira, a instituição deixa o alerta para os perigos de uma crise no mercado imobiliário na China para a economia chinesa, o que poderia ter impactos um pouco por todo o mundo. De acordo com as estimativas do BCE, caso os preços das casas caíssem em média 6% e as vendas 32% no espaço de um ano, o PIB chinês diminuiria 2% (em comparação com a atual previsão) durante cinco trimestres.

Este abrandamento teria consequências na economia da zona euro que as autoridades não devem ignorar. “Uma crise [na economia chinesa] teria consequências significativas sobre a atividade global. Os desequilíbrios na China já foram identificados como um fator de risco chave para a zona euro e a economia mundial”, diz o BCE.

O que está em causa

Segundo o BCE, há vários sinais de que o setor imobiliário na China pode estar a caminho de um período de correção. A questão é a dimensão dessa correção. Nesta análise, assinada por Thomas Nielsen, o autor lembra que o mercado chinês assistiu a um crescimento sem precedentes nos últimos dois anos, com os preços a subirem 10% em 2016 e novamente 10% em 2017. Estes valores são apenas médias, já que nas principais cidades os preços cresceram a níveis bastante superiores, na ordem dos 30%.

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É com esta parte do mercado, onde se encontram as casas mais caras, que a instituição parece mais preocupada. Apesar de no país como um todo, os preços terem vindo a crescer mais ou menos em linha com o crescimento dos rendimentos, nas cidades de Pequim, Xangai, Guangzhou e Shenzen há “sinais de valorização desproporcionalmente elevados”.

Na última década, o preço dos imóveis nestas cidades cresceu muito acima do rendimento e esta diferença “parece comparável” com o que terá acontecido no Japão no início da década de 90 e com os Estados Unidos e a Europa antes da crise financeira de 2008. Esta é uma afirmação forte, por encontrar semelhanças entre a bolha especulativa que rebentou no Japão no final da década de 80 e se estendeu para a década de 90, e com um dos principais fatores que levaram à crise financeira dos Estados Unidos, a bolha especulativa no imobiliário. Esta divergência, diz o autor, “provou ser insustentável”.

A questão, segundo o BCE, é que nos últimos seis meses este ritmo tem vindo a abrandar. O preço médio das casas vendidas durante os primeiros seis meses do ano já está a crescer apenas 5%, e o número de casas vendidas também está a crescer mais lentamente.

A esta desaceleração do mercado juntam-se mais alguns fatores que podem agravar a situação do mercado, como o facto de este aumento dos preços das casas estar associado a um aumento significativo no crédito imobiliário, inclusivamente do estrangeiro, o que levou a que a dívida das famílias chinesas tenha vindo a aumentar (já atinge os 48% do PIB) e os construtores tenham necessidade de refinanciar elevadas quantias em dívida.

Mas com o governo chinês a implementar medidas para tentar controlar o crescimento súbito da dívida chinesa em todos os níveis, os mais endividados vão ter dificuldades em refinanciar os seus empréstimos e podem encontrar dificuldades, sejam eles famílias ou promotores. Também os governos locais podem sentir dificuldades, já que uma parte importante das receitas dos seus orçamentos resultam de impostos sobre a venda de terrenos para construção.

Mas nem tudo aponta para que haja uma bolha, ou para que, na eventualidade de esta existir, ela possa estar prestes a rebentar. Os preços não estão a crescer tanto, mas continuam a crescer, e o número de casas por vender é relativamente baixo, o que significa que não há tanta pressão para ceder no preço e vender mais barato. A estes dois pontos, o autor lembra também que, no caso das principais cidades, os preços podem estar a crescer mais devido à procura de pessoas com mais rendimentos que querem comprar casas nessas cidades, mas que não são necessariamente moradores.