O Governo entende que o decreto que fixa a limitação de circulação entre concelhos durante este fim de semana em nada viola a Constituição. Num longo documento enviado para o Supremo Tribunal Administrativo, o Executivo socialista tenta desmontar os argumentos apresentados pelo Chega em providência cautelar, alegando que “não está em causa a suspensão de nenhum direito fundamental“, que o Governo goza de uma base legal para “restringir a liberdade de circulação” mesmo sem o estado de emergência decretado e que há exceções suficientes no diploma para permitir “abertura e flexibilidade” na aplicação da lei.

Numa contestação assinada pelo Centro de Competências Jurídicas do Estado, alega-se que o Governo se “limitou a restringir a liberdade” de circulação sem a limitar de forma absoluta, e que a decisão respeita os princípios da proporcionalidade e da igualdade.

“De acordo com as mais recentes conclusões das autoridades nacionais de saúde, reportadas ao específico caso português, são precisamente as reuniões e ajuntamentos sociais e familiares os fatores que mais têm originado a ocorrência de surtos de infeção, não a falta de distanciamento social nos transportes públicos”, começa por argumentar o Governo.

Ora, perante isto, e sabendo-se que “por tradição religiosa e comunitária, o feriado do Dia de Todos os Santos e o subsequente Dia dos Fiéis Defuntos é, no território nacional, ocasião para reuniões familiares alargadas, seja em contexto doméstico seja através da permanência em locais de culto, não pode seriamente colocar-se em dúvida, em primeiro lugar, que a limitação de circulação entre concelhos é, desde logo, uma medida adequada a evitar (ainda) mais a propagação da infeção“.

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Mais a mais, continua o Executivo socialista, a medida é “necessária” porque, sabendo que “(i) não há testes instantâneos que revelem graus de eficácia satisfatórios, e que os que existem não são, de acordo com as suas prescrições técnicas, livremente utilizáveis pela população em geral; (ii) os sintomas não são imediatamente aparentes; (iii) os sintomas, a manifestarem-se, não são exuberantes (como aconteceu com a epidemia da doença do vírus Ébola); e (iv) há portadores assintomáticos com alta taxa de infecciosidade”, a limitação da circulação entre concelhos “é aquela com maior grau de eficácia permite conter a progressão das taxas de infeção“.

Em relação às acusações de que esta decisão viola o princípio da igualdade, e mesmo reconhecendo que o vírus não tem a mesma incidência em todo o território nacional — logo, a aplicação generalizada das restrições poderia ser desproporcional –, o Governo lança outro argumento: se o objetivo é impedir a propagação do vírus, não faz sentido permitir que “cidadãos residentes em zonas menos infetadas pudessem livremente deslocar-se para zonas mais infetadas“. “Uma hipotética distinção por regiões brigaria, e de modo manifesto, com o princípio da igualdade”, alega o Executivo.

Por estes e outros motivos, o Governo pede que a providência cautelar do Chega fique sem qualquer efeito. Depois desta resposta, que tinha de chegar em 24 horas, o Supremo Tribunal Administrativo tem agora de tomar uma decisão. Até lá, a limitação de circulação entre concelhos continua a vigorar.