Um Teatro dos Sonhos, um palco para alguém cruzar com o pesadelo, um local para outro encontrar a sua esperança perdida. Manchester United e Atl. Madrid são em vários pontos um espelho à respetiva dimensão quando se olha para o filme da temporada: investimento na equipa, reforço da ambição, resultados falhados no Campeonato que colocaram como objetivo acabar nos quatro primeiros, eliminações precoces nas taças. Assim, e mesmo sabendo que existem conjuntos com mais condições e argumentos para chegar a uma final, a Liga dos Campeões surgia como tábua de salvação para o que restava da temporada. Com essa nuance: só um poderia consegui-lo. E era nesse contexto que chegava um dos encontros mais aguardados dos oitavos.

Félix marcou, Bruno assistiu e a sorte protegeu Ronaldo: Manchester United é dominado mas empata com Atl. Madrid

Entre o conjunto inglês, a vitória na receção ao Tottenham servia como bálsamo para tudo – incluindo até as próprias deficiências defensivas da equipa, de novo expostas de forma bem visível pelos londrinos. E tudo porque, antes das decisões europeias, voltou o melhor Cristiano Ronaldo: 59.º hat-trick da carreira, recorde de golos marcados em jogos oficiais de clubes e seleções (ultrapassando Josef Bican pelos números da FIFA), recorde de golos marcados em jogos oficiais de clubes (superando Romário pelas estatísticas da IFFHS), três pontos fulcrais nesta fase da época. Pelo menos por alguns dias, todos os problemas que têm assolado a equipa deram uma trégua até pelo histórico que o avançado português tinha contra a formação colchonera, a segunda maior vítima em competições nacionais e europeias só atrás do Sevilha.

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Para não haver dúvidas, agora pelas contas da FIFA: Ronaldo faz um hat-trick, dá vitória ao United e torna-se o maior marcador da história

“Não interessa a forma pela qual chegamos à Liga dos Campeões na próxima época, a questão é perceber qual é a forma mais realista. Agora só queremos ganhar para chegarmos aos oito melhores da competição mas, se conseguirmos, sabemos que existem outras boas equipas na prova. Não podemos perder mais pontos na Premier League e precisamos de olhar para nós para conseguir esse objetivo. Agora é uma prova diferente, com a equipa muito motivada. Seria importante não sofrermos primeiro porque sabemos que o Atl. Madrid é uma equipa que não se importa de não ter bola. Nos últimos quatro ou cinco jogos, tiveram menos de 50% de posse. Não queremos sofrer mas, se acontecer, que o primeiro golo seja nosso”, comentara Ralf Rangnick no lançamento de um jogo que voltaria a contar com Bruno Fernandes, recuperado da Covid-19.

O dia que mudou (em definitivo) o futebol: o 59.º hat-trick da carreira deu dois recordes mundiais a Ronaldo

Na formação de Madrid, o duelo decisivo surgia na melhor fase da temporada na Liga espanhola, com uma série de quatro vitórias consecutivas que permitiu voltar aos lugares de apuramento para a Champions e com um total de dez golos marcados e apenas dois sofridos que indiciavam uma estabilização em termos coletivos da equipa. A esse momento não foi alheio (pelo contrário) a melhor fase de João Félix desde que chegou ao Wanda Metropolitano: quando voltou à titularidade frente ao Osasuna, com um golo e uma assistência, o avançado português iniciou uma série com cinco golos em cinco jogos que começou a remeter Luis Suárez, Correa e/ou Griezmann para o banco, em grande parte com vantagens logo nos minutos iniciais.

João Félix voltou a ser titular, voltou a marcar e voltou a ganhar. E a jogar assim, come à mesa de quem quiser

“Pelas características dos futebolistas do Manchester United e dos nossos jogadores e também pela forma como as duas equipas jogam, espero um jogo dinâmico, com alternância de posse de bola e domínio num palco fantástico. João Félix? Cumpre com o que a equipa precisa. Temos a nossa própria forma de trabalhar com os avançados. Ele está muito bem, está feliz, entusiasmado e é um jogador muito importante, a nível individual, para depois poder passar a sua qualidade para o coletivo, o que realmente importa”, tinha referido Diego Simeone, técnico do conjunto espanhol que foi apontado esta semana ao… PSG.

O jogo 100, um golo, uma assistência: João Félix voltou a ser feliz no regresso do Atl. Madrid às vitórias

No final, imperou a tática. A melhor versão do Cholismo que o Atl. Madrid tem com Diego Simeone. E se na fase de grupos a equipa espanhola já tinha ido ao Dragão carimbar o apuramento, agora voltou a ir ganhar a eliminatória em Old Trafford, com um golo de Renan Lodi numa jogada que começou num fantástico calcanhar de João Félix que superou os compatriotas Ronaldo, Bruno Fernandes e Diogo Dalot.

O Manchester United até começou melhor, com Elanga a ameaçar duas vezes o golo, a segunda numa jogada que passou pelos três jogadores portugueses dos red devils antes da assistência de Bruno Fernandes para o remate desviado por instinto com a cabeça de Oblak (13′). No entanto, e sempre que saía com qualidade em transições, o Atl. Madrid conseguia criar perigo com De Paul a ver De Gea fazer uma fabulosa defesa para canto após remate de meia distância (16′) e com João Félix a marcar mesmo num lance que passou por Koke e teve assistência de Marcos Llorente em posição irregular (33′). A ameaça tinha sido feita, o golo chegaria pouco depois: Félix saiu da zona mais central para abrir de calcanhar em Griezmann na direita, o francês cruzou largo ao segundo poste e Renan Lodi surgiu na esquerda a desviar para o 1-0 que se registava a intervalo (41′) apesar de mais uma boa iniciativa de Bruno Fernandes desviada por Oblak para canto (45′).

O segundo tempo manteve as características do encontro até ao último fôlego do Manchester United, que conseguiu criar mais situações de perigo junto da baliza de Oblak mas sem eficácia, dando uma redobrada confiança ao Atl. Madrid para gerir a vantagem e conseguir mesmo segurar o 1-0 até ao final do jogo, conseguindo mais uma vez garantir a continuidade na Champions jogando fora… e com uma lição tática de Diego Simeone, que saiu disparado para o balneário entre vários copos que iam sendo atirados ao treinador.