Mais um passo de Luís Montenegro. Um dia depois de André Ventura ter sido um dos protagonistas dos incidentes parlamentares que marcaram a cerimónia do 25 de Abril, o líder do PSD aproveitou o Conselho Nacional do PSD, em Lisboa, para deixar a garantia de que o PSD nunca governará “com o apoio da extrema-direita”. Sem nunca nomear o Chega, Montenegro acabou por ir mais longe do que alguma vez tinha ido na demarcação absoluta em relação ao partido de Ventura.

Quando ia já a meio da sua intervenção, Montenegro acabou por recuperar as palavras de António Costa — o primeiro-ministro responsabilizou diretamente a comunicação social pela ascensão do Chega — para atacar o líder socialista. “Pode dizer essas coisas porque os conselheiros dizem isso. E não se passa nada”, lamentou o líder social-democrata, sugerindo que “há muitos interesses em Portugal que vivem bem com o PS”, incluindo na comunicação social.

[Ouça aqui a reportagem da Rádio Observador com o essencial do discurso de Luís Montenegro no Conselho Nacional do PSD]

Montenegro diz “já chega” e recusa extrema-direita

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“Não se deixem enganar outra vez por António Costa. [Os socialistas] estão sempre de braço dado com o extremismo. De esquerda ou de direita. Em 2015, não havia problema nenhum. A extrema-esquerda era precisa, era uma muleta. Agora, querem-se ancorar na extrema-direita. Querem que nós falemos [da extrema-direita].  Nós no PSD nunca governámos, nem vamos governar com apoio da extrema-esquerda, nem com o apoio da extrema-direita”, garantiu Montenegro.

E esta não foi a única referência indireta ao Chega e a André Ventura. Acusando António Costa de estar a tentar “reeditar o ambiente” que lhe valeu a maioria absoluta – a última campanha legislativa ficou inevitavelmente marcada pelo agitar do fantasma em torno da possível aliança entre Rui Rio e André Ventura –, Montenegro deixou uma certeza: os sociais-democratas não vão voltar a cair na mesma armadilha.

“Francamente, parafraseando alguém: já chega dessa brincadeira, António Costa. Não é por os seus publicitários lhe dizerem isso que vai reeditar o ambiente que se viveu nas últimas eleições. Nem eu, nem o povo português estamos distraídos”, avisou. “Não somos aqueles partidos que berram e protestam, ou que fazem umas coisas mais ou menos engraçadas. Esses partidos têm um aliado: António Costa”, repetiu o líder social-democrata.

Nesse sentido, Montenegro acabou por criticar diretamente Augusto Santos Silva e o “discurso monotemático” que proferiu na Assembleia da República. “Falou do tempo da política [e sugeriu]: ‘Deixem-nos estar aqui que nós estamos agarrados ao poder até 2026 e que é preciso respeitar a vontade do povo’”, começou por notar o líder social-democrata, antes de explodir: “Como é possível que as pessoas que perderam eleições em 2015, que não tinham a vontade do povo para governar, queira atirar pedras para cima da casa do PSD.”

“Estamos aqui para merecer ter o maior número de votos e mandatos no Parlamento, que há de ser maioritário e há de ser de molde a dar condições ao nosso Governo de transformar o país. Não queremos ir para o Governo para sobreviver politicamente, para usufruir das benesses do poder”, acrescentou ainda.

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O risco do não julgamento de José Sócrates

Curiosamente, Montenegro acabou por recuperar um argumento utilizado por Ventura no seu discurso de 25 de Abril – a que o presidente social-democrata assistiu na primeira fila do Parlamento, enquanto líder do maior partido da oposição. Se na véspera o presidente do Chega tinha feito críticas inflamadas às declarações de António Costa sobre o sotaque brasileiro (“Temos pena de não falarmos com o vosso sotaque”), disse o socialista), esta quarta-feira Montenegro reeditou a crítica em tom sarcástico. “António Costa é um primeiro-ministro que tem algumas particularidades – ficamos a saber que até preferia falar com sotaque brasileiro.”

De resto, o principal alvo da intervenção de Montenegro foi mesmo António Costa, de quem chegou a dizer que era “um fantoche daquilo que os assessores dizem para fazer”. Insistindo na ideia de que os socialistas estão “cheios de medo e desesperados”, o presidente do PSD denunciou aquilo que diz ser um Governo “apodrecido”, sem rei nem roque. Um desnorte, insistiu Montenegro, particularmente evidente no caso da comissão parlamentar de inquérito à TAP

“António Costa está ausente na resposta do Governo sobre aquilo que se passou e se está a passar na TAP – não diz nada. Está candidamente à espera do fim da comissão de inquérito. É um problema de autoridade. Acha que não tem nada a dizer ao país. Isto é o apodrecimento da sua autoridade”, frisou.

Para o líder social-democrata, a marca de António Costa é também sinónimo de “empobrecimento” do país. Um “empobrecimento” que se sente na economia, com o país na “cauda da Europa”, na “perda de poder de compra”, no Serviço Nacional de Saúde, na Educação, na Habitação, no aumento da “criminalidade violenta e grave”, na “asfixia dos impostos” e na não proteção dos pensionistas e reformados – “instrumentalizados eleitoralmente pelo Governo”. “É este país mais pobre que prejudica a vida das pessoas. É o resultado de quase 8 anos de Governo de António Costa”, sugeriu Luís Montenegro.

A esse propósito, Montenegro não deixou de se referir à Operação Marquês à possibilidade real de o julgamento de José Sócrates nunca se realizar em virtude da prescrição dos crimes alegadamente cometidos. Se acontecer, argumentou o líder do PSD, “será mais um sinal da incapacidade do Estado de cumprir as suas funções mais essenciais”, rematou o social-democrata.