A Comunidade Israelita do Porto (CIP) esclareceu esta quarta-feira que as transferências para as contas do rabino referidas num acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa dizem respeito a certificação “kosher” e não a certificados para descendentes de judeus sefarditas.

Em causa está o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), datado de 24 de maio e revelado na terça-feira, que negou o levantamento da suspensão das operações bancárias do rabino Daniel Litvak, arguido na investigação à concessão de nacionalidade a descendentes de judeus sefarditas pela alegada prática dos crimes de falsificação de documento, tráfico de influência, corrupção ativa, associação criminosa e branqueamento de capitais.

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“Os únicos dois recebimentos de certificados que as contas do rabino revelaram dizem respeito à certificação ‘kosher’ de produtos fabricados por duas empresas alimentares, uma das quais com o nome ‘Tasty'”, explicou a CIP, num comunicado enviado à Lusa.

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A decisão, na qual o coletivo de juízas se dividiu (2-1) na votação, refere, com base nos argumentos do Ministério Público (MP), que as contas bancárias alvo da suspensão “não eram utilizadas exclusivamente para receitas e despesas pessoais, mas também serviriam (pelo menos) de passagem de pagamentos” ligados à CIP.

“E tanto assim é que foram detetadas rubricas de crédito com a designação de ‘certificados’, com vista à eventual dissimulação da sua origem”, lê-se no acórdão do TRL, que acabou por validar a pretensão do MP de renovação da suspensão das operações bancárias, relativizando um anterior acórdão de setembro de 2022 no qual foram levantadas todas as medidas de coação impostas ao rabino.

A remuneração por certificação de alimentos “kosher” (adequados aos princípios do judaísmo) foi, aliás, referida pela desembargadora Maria Margarida Ramos de Almeida, que votou vencida, citando o interrogatório do arguido, no qual Daniel Litvak indicou que também desempenha funções remuneradas na certificação de comida “kosher”. “Esta é matéria que não é despicienda para a apreciação das suspeitas a que o MP alude”, invocou.

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A CIP reiterou ser “uma organização privada cuja contabilidade sempre registou os pagamentos de honorários e despesas ao seu rabino, de acordo com a lei”, acrescentando ainda que “o processo de certificação de sefardismo da CIP/CJP cingiu-se a judeus descendentes de famílias tradicionais de comunidades sefarditas de origem portuguesa” e que este critério foi “devidamente ancorado” no regulamento da Lei da Nacionalidade.

A Procuradoria-Geral da República confirmou em 19 de janeiro de 2022 que a concessão da nacionalidade portuguesa ao empresário russo Roman Abramovich ao abrigo da Lei da Nacionalidade para os judeus sefarditas (judeus originários da Península Ibérica expulsos de Portugal no século XVI) estava a ser investigada pelo MP. Na sequência dessa investigação, o rabino Daniel Litvak viria a ser detido e constituído arguido em março desse ano.

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