A manutenção dos limites máximos para dedução de encargos com empréstimos é vista pelos empresários como uma dupla penalização no atual contexto de taxas de juro elevado, que lamentam que a proposta do OE2024 nada preveja neste campo.

“Atendendo ao atual contexto, caracterizado por uma forte instabilidade internacional, por taxas de juro elevadas, pela existência de níveis de inflação acima do desejável, sem esquecer os custos energéticos elevados (de forma geral) ou a redução da procura externa, seria desejável que este artigo do IRC [67.º] visse os seus limites aumentados, podendo ser entendido como uma forma de ajudar as empresas neste cenário“, disse à Lusa o presidente da Associação Empresarial de Portugal (AEP), Luís Miguel Ribeiro.

Vários empresários manifestaram também à Lusa que o facto de a proposta do Orçamento do Estado para 2024 (OE2024) não contemplar qualquer alteração daqueles limites constitui uma dupla penalização para as empresas na medida em que, apesar de gastarem mais com juros, não podem refletir essa subida de gastos na sua fatura com o IRC.

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O Código do IRC contempla (no artigo 67.º) uma limitação à dedutibilidade de gastos com financiamento, determinando que estes gastos concorrem para a determinação do lucro tributável até ao maior de dois limites: um milhão de euros ou 30% do EBITDA (resultado antes de impostos, depreciações, amortizações e gastos de financiamento líquidos).

Para o presidente da AEP esta situação acaba por se traduzir “de facto” numa “dupla penalização para as empresas” uma vez que os custos de financiamento aumentaram e os limites máximos aplicados podem constituir, efetivamente, uma significativa restrição para a dedução daqueles custos“.

Acentuando que as grandes empresas são as que mais vão sentir o impacto desta limitação do IRC, Luís Miguel Ribeiro aponta que, em contrapartida, o Estado “continua a beneficiar deste contexto, prevendo apresentar um excedente orçamental de 0,8% do PIB este ano e uma carga fiscal que atingirá máximos históricos (37,2% em 2023)”.

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“Como nos orçamentos anteriores, o OE2024 mantém-se pouco direcionado para as empresas, não incentivando o investimento privado e criando, neste caso, mais um constrangimento às grandes empresas”, observou o presidente da AEP.

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Ouvido pela Lusa, o fiscalista Renato Carreira, da consultora Deloitte, referiu que “num contexto de juros altos” como aquele que a zona euro atravessa “poderia fazer sentido que o limite [à dedutibilidade dos gastos de financiamento] fosse aumentado para as empresas acomodarem como custo dedutível a subida dos encargos com a dívida”. Para Renato Carreira, uma solução possível passaria por, por exemplo, aumentar temporariamente a parcela que atualmente está fixada em 30% do EBITDA.

De acordo com as estatísticas do IRC, em 2021 (últimos dados disponíveis) houve 428 empresas abrangidas pela limitação à dedutibilidade de gastos de financiamento líquido, tendo sido reportados 1.2371 milhões de euros para efeitos de apuramento do lucro tributável. No ano anterior, o artigo 67.º foi invocado em 458 declarações de IRC, no valor global de 1.326 milhões de euros.