Ricardo Salgado liderou uma associação criminosa que, além de ter levado à falência de várias holdings do GES e à resolução do BES, também corrompeu cerca de 20 administradores e funcionários públicos venezuelanos para obter contratos de compra de produtos financeiros do BES e do GES em troca do pagamento de cerca de 116 milhões de dólares. 

Esta é a última acusação do chamado caso Banco Espírito Santo/Grupo Espírito Santo — e uma das mais esperadas por que está diretamente relacionada com o caso BES/GES na Venenzuela e obrigou a uma intensa cooperação internacional com os Estados Unidos, Espanha, Suíça e outros países europeus. Ao fim de uma investigação que se iniciou em 2015, procuradora-geral adjunta Olga Barata não teve qualquer dúvida.

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Tais fundos foram transferidos para cerca 24 sociedades offshore criadas por diversos funcionários do GES, que tinham contas bancárias no Espírito Santo Bankers Dubai, um banco do GES mas a que pertenciam 20 Pessoas Politicamente Expostas (PEP) venezuelanas — muitos já foram identificados pelo Observador em vários trabalhos ao longo de 2018 (ver aqui, aqui e aqui).

O Ministério Pública imputa, por isso, a prática de 20 crimes de corrupção ativa no comércio internacional a Ricardo Salgado, mas também aos seus operacionais na implementação do alegado esquema: João Alexandre Silva (ex-diretor da Sucursal Financeira da Madeira do BES), Jean-Luc Schneider (ex-administrador da empresa suíça Espírito Santo Financière S.A e operacional do chamado saco azul do GES), Michel Ostertag (ex-funcionário da GESTAR e parceiro do GES), Paulo Murta (ex-diretor do GES) e Humberto Coelho (ex-funcionário do GES).

Todos são também acusados entre 20 a 21 crimes de branqueamento de capitais por terem, alegadamente, montado um esquema de ocultação da origem dos capitais que permitiu contornar as regras do mercado financeiro quer do Dubai quer da Suíça.

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Destaque para João Martins Pereira, ex-diretor de auditoria e de compliance do BES, que foi ainda acusado da alegada prática de um crime de corrupção passiva no setor privado e de um crime de branqueamento de capitais. Como o Observador noticiou em janeiro de 2018, Martins Pereira foi um dos altos diretores do BES que receberam fundos do saco azul do GES através de sociedades offshore que tinham contas abertas no Banque Privée Espírito Santo.

A investigação do Observador às contas bancárias da Espírito Santo Enterprises, a sociedade offshore que corresponde ao saco azul do GES, detetou em fevereiro 2018 o pagamento de um total de 1,46 milhões de euros entre 2006 e 2012.

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A procuradora-geral adjunta Olga Barata entendeu que não tinha competência territorial para acusar os 20 dirigentes venezuelanos alegadamente corrompidos pela associação criminosa que terá sido liderada por Ricardo Salgado.

Isto porque os referidos dirigentes não são portugueses e não praticaram crimes em território nacional.

Alguns eles, nomeadamente Nervis Villalobos (vice-ministro de Energia Eléctrica de Venezuela entre 2001 e 2006), Luís Carlos de León (ex-diretor financeiro da empresa Electricidade de Caracas, filial da Petróleos de Venezuela) e César Godoy (ex-diretor-geral da Bariven — uma filial da Petróleos de Venezuela), entre outros, eram igualmente suspeitos de diversos crimes de branqueamento de capitais através de produtos financeiros do GES e do BES, mas as suspeitas acabaram por ser arquivadas.

Tudo porque ficou provado que foram responsáveis do banco liderado por Ricardo Salgado que fizeram tais investimentos com fundos alegadamente provenientes de corrupção em produtos financeiros da família Espírito Santo. O capital acabou totalmente perdido entre a resolução do BES e a falência das principais empresas do GES.

Acusados:

Ricardo Salgado (ex-presidente executivo do BES – Banco Espírito Santo)

  • Imputada liderança de uma associação criminosa que só não se traduziu numa acusação porque Ricardo Salgado já tinha sido acusado do mesmo crime no processo principal do caso Universo Espírito Santo
  • 20 crimes de corrupção ativa com prejuízo no comércio internacional
  • 21 crimes de branqueamento de capitais

João Alexandre Silva (ex-diretor da Sucursal Financeira da Madeira do BES)

  • 1 crime de associação criminosa
  • 20 crimes de corrupção ativa com prejuízo no comércio internacional
  • 1 crime de corrupção passiva no setor privado
  • 21 crimes de branqueamento de capitais

Jean-Luc Schneider (ex-administrador da Esfil– Espírito Santo Financière S.A e operacional do chamado saco azul do GES)

  • 1 crime de associação criminosa
  • 20 crimes de corrupção ativa com prejuízo no comércio internacional
  • 1 crime de corrupção passiva no setor privado
  • 21 crimes de branqueamento de capitais
  • 1 crime de burla qualificada (em regime de co-autoria com Ricardo Salgado, Amílcar Morais Pires, Isabel Almeida e Manuel Fernando Espírito Santo que já foram acusados desse crime no inquérito do caso Universo Espírito Santo)

Paulo Murta (ex-diretor da Grupo Espírito Santo)

  • 1 crime de associação criminosa
  • 20 crimes de corrupção ativa com prejuízo no comércio internacional
  • 21 crimes de branqueamento de capitais

Michel Joseph Ostertag (ex-funcionário da GESTAR e parceiro do GES)

  • 1 crime de associação criminosa
  • 20 crimes de corrupção ativa com prejuízo no comércio internacional
  • 21  crimes de branqueamento de capitais

Humberto Coelho (ex-funcionário do GES – Grupo Espírito Santo)

  • 1 crime de associação criminosa
  • 19 crimes de corrupção ativa com prejuízo no comércio internacional
  • 20 crimes de branqueamento de capitais

João Martins Pereira (ex-diretor de auditoria e de compliance do BES)

  • 1 crime de corrupção passiva no setor privado
  • 1 crime de branqueamento de capitais