O antigo secretário particular do Papa Bento XVI, o arcebispo alemão Georg Gänswein, foi esta segunda-feira nomeado embaixador da Santa Sé na Estónia, Letónia e Lituânia, numa decisão que colocou um ponto final em mais de um ano de especulação sobre qual seria o destino do alemão após ter entrado em rota de colisão com o Papa Francisco.

A nomeação foi conhecida através de uma curta referência no boletim diário de informações do Vaticano, onde se lê que o Papa Francisco nomeou Gänswein, de 67 anos, para o cargo de núncio apostólico nos três países bálticos.

Durante quase três décadas, Georg Gänswein foi o braço direito de Bento XVI. Como jovem sacerdote, juntou-se à equipa de Ratzinger no Vaticano em 1995, quando o cardeal alemão era prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, e manteve-se a seu lado até à morte de Bento XVI, em 31 de dezembro de 2022, já como Papa emérito.

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Ao longo da década inédita em que coexistiram dois papas no Vaticano — Francisco, em funções, e Bento XVI, emérito —, Gänswein foi uma peça-chave nos esforços da Igreja para controlar os danos provocados pela narrativa de que haveria tensões entre o pensamento dos dois papas. Manteve-se como secretário de Bento XVI, mas acumulou as funções de prefeito da Casa Pontifícia de Francisco.

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Porém, poucos dias depois da morte de Bento XVI, estalou a polémica quando Gänswein publicou o livro Nada Mais do que a Verdade: a minha vida ao lado de Bento XVI, um volume de memórias que o alemão tinha preparado — mas que havia prometido só publicar após a morte de Ratzinger.

Como o Observador revelou na altura, o livro trouxe a público vários momentos de tensão entre os dois papas. Na obra, Gänswein revelou como Bento XVI ficou espantado com algumas posições de Francisco e como achou um “erro” a restrição à missa em latim — e como chegou mesmo a dizer a Gänswein que achava que Francisco não confiava em si. A publicação do livro causou ondas de choque na Igreja Católica e azedou as relações entre Francisco e Gänswein, que já praticamente não desempenhava qualquer função na Cúria.

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Poucas semanas depois da publicação do polémico livro, chegou mesmo a circular nos meios católicos a possibilidade de Gänswein ser enviado como núncio apostólico para a Costa Rica, o que foi considerado como “uma espécie de exílio” para o alemão.

Essa informação acabaria por não se confirmar e, no verão passado, Francisco enviou Gänswein para a Alemanha, para a sua diocese de origem, sem lhe atribuir qualquer cargo. Praticamente ostracizado, o alemão ficou pelo país-natal sem quaisquer funções, fazendo algumas aparições em celebrações e apresentações de livros.

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Aos 67 anos de idade, Gänswein segue agora para uma função que o vai colocar como representante do Vaticano em três países onde terá um destaque mínimo. Os três países bálticos são de maioria cristã, embora com uma grande predominância de luteranos e ortodoxos (à exceção da Estónia, onde o catolicismo é maioritário), pelo que uma boa parte do seu tempo deverá ser focado em questões relacionadas com o diálogo ecuménico.