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Fragilizado e com o partido dividido, chegou a hora da verdade para Jeremy Corbyn

À quarta foi de vez e o Labour, pressionado por SNP e Lib-Dems, aprovou ida às urnas. Mas é um partido dividido e assombrado pelas sondagens. Conseguirá Corbyn surpreender tudo e todos?

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“Última hora: um Jeremy Corbyn exultante confirma que o Labour vai finalmente apoiar eleições gerais, pelo facto de já não ter mais nenhuma outra opção.” Foi assim que a página de Facebook do programa humorístico Have I Got News For You — do qual Boris Johnson já fez parte, nos tempos de jornalista — reagiu ao anúncio feito pelo Partido Trabalhista na manhã desta terça-feira. A frase é satírica, claro está, mas, como em toda a sátira, não deixa de ter um fundo de verdade: o mesmo partido que, durante muito tempo, pediu repetidamente nova ida às urnas, votou três vezes contra essa possibilidade nos últimos meses. Até que à quarta foi de vez: “Está na hora”, afirmou o próprio Corbyn no Twitter.

O resultado da votação confirma-o. Na Câmara dos Comuns, 438 votos a favor, incluindo do Labour, ditaram a sentença: o Reino Unido vai mesmo a votos para eleger um novo Governo e um novo Parlamento, a 12 de dezembro.

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O dia, contudo, não poderia decorrer sem algum suspense. Depois de ameaças do Executivo de retirar a moção de votação caso fossem aprovadas algumas emendas, tudo terminou em aprovação. Mas, para Jeremy Corbyn, esta terça-feira não foi simples: os 11 deputados que se rebelaram contra a disciplina de voto — e votaram contra as eleições antecipadas — ilustram o momento complicado que o partido e a sua liderança atravessam. Terá Corbyn a capacidade para dar a volta e surpreender tudo e todos na campanha eleitoral?

O que fez Corbyn apoiar ida às urnas? Lib-Dems e SNP encostaram Labour à parede

Em primeiro lugar, a questão que se coloca antes de todas as outras é só uma: o que é que levou o Labour a decidir, afinal, apoiar uma ida às urnas, depois de meses a dizer que não estavam reunidas as condições para tal? A resposta cabe em poucas palavras: liberais-democratas (Lib-Dems) e nacionalistas escoceses (SNP).

Os dois partidos decidiram prosseguir o caminho encetado na véspera, de estarem abertos a apoiar a ida a eleições, e voltaram a sinalizá-lo logo pela manhã — o que, na prática, se traduziria numa aprovação automática da moção, deixando o Partido Trabalhista como único dos principais partidos a não votar a favor da ida às urnas. “Corbyn concluiu que uma eleição se estava a tornar inevitável, graças ao apoio dos Lib-Dems e do SNP, e ele não quis ser visto como o único a dizer não”, resume ao Observador Simon Fitzpatrick, analista especializado no Labour da consultora Cicero. “Se vai acontecer de qualquer maneira, mais vale ele juntar-se a bordo em vez de correr o risco de ser apelidado de ‘medricas’.”

A posição de Ian Blackford, líder parlamentar do SNP, foi decisiva para pressionar o Labour. Com os 35 votos dos escoceses, já haveria eleições (Jeff J Mitchell/Getty Images)

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A matemática não engana: se na segunda-feira a proposta de eleições antecipadas de Boris Johnson teve 299 votos, esta terça bastar-lhe-iam os votos do SNP (35) para atingir a maioria pretendida de 320. A eleição era, por isso, praticamente inevitável.

“Com base nisto, Corbyn rendeu-se ao inevitável”, aponta ao Observador Steven Fielding, professor de História Política da Universidade de Nottingham e um estudioso do Partido Trabalhista. “Os trabalhistas andam a pedir eleições desde as últimas. Iria parecer muito mal, no mínimo, se agora não as aprovassem.”

Até agora, a oposição tinha-se mantido unida, afirmando que só votaria a favor das eleições quando o risco de no deal estivesse totalmente afastado. Com a confirmação de que a União Europeia iria conceder um adiamento do Brexit até 31 de janeiro de 2020, os Lib-Dems e o SNP consideraram já não haver o risco de uma saída sem acordo e posicionaram-se a favor de eleições. Ironicamente, o líder da oposição ficou para trás. Algo que, como aponta Fitzpatrick, não é alheio às atuais sondagens: “Tanto o SNP como os Lib-Dems têm muito mais razões para estar otimistas quanto às suas chances numa eleição do que o Labour.”

Se os primeiros estão em tendência ascendente, prevendo-se que aumentem o número de deputados, os trabalhistas correm o risco de perder eleições pela quarta vez consecutiva (a última vitória foi em 2005, com a reeleição de Tony Blair). A política ambígua do partido para o Brexit, propondo negociar um novo acordo, mas levá-lo a referendo, complica tudo. “São um partido de dentro-e-fora [da UE]”, resume o professor Fielding. E o eleitorado aprecia posições menos complexas, como o académico já tinha explicado ao Observador em setembro.

Brexit: o dilema de Jeremy Corbyn que pode condenar o Labour “à desgraça”

Momentum e deputados. As duas fações que dividem os trabalhistas

Significa isto, portanto, que todo o Partido Trabalhista está pronto a mergulhar de cabeça nesta eleição? Nem por isso. As divisões que corroem o Labour são profundas e isso traduziu-se no atraso e na indecisão em apoiar estas eleições.

Steven Fielding explica as duas fações que existem dentro do partido. A primeira acha que é possível ganhar estas eleições devido à “lufada de ar fresco” que crê ser trazida por esta nova posição ideológica do partido, movida por Corbyn: “O programa atual do Labour é, provavelmente, o programa eleitoral mais radical e socialista apresentado ao eleitorado desde 1945”, aponta o professor de História Política, destacando medidas como as nacionalizações de escolas privadas ou a meta de neutralidade carbónica para 2030. “Muitos dos apoiantes de Corbyn acham que os eleitores vão abraçar este manifesto. Acham que vão conseguir apresentá-lo e que isso os vai ajudar a ir para lá do Brexit e vencer a eleição.”

Grande parte desta fação move-se graças ao apoio da organização civil Momentum, fortemente pró-Corbyn, que reagiu de imediato no Twitter esta manhã com um vídeo humorístico, onde Corbyn chama os seus apoiantes soprando num búzio e dizendo-lhes para se erguerem “como leões após o sono”. A frase não é inocente: é um verso de uma obra de Percy Shelley, poeta do período Romântico conhecido pelas suas ideias revolucionárias, que já foi citada pelo próprio Corbyn, no último comício antes da eleição de 2017 — onde o partido conseguiu um dos seus melhores resultados eleitorais dos últimos anos.

Mas se os motores da Momentum já estão a aquecer para uma eleição, nem todos dentro do Partido Trabalhista estão satisfeitos. Fielding explica porquê: “Há muitos céticos dentro do partido, que acham que o Labour vai ser esmagado entre o voto nos conservadores e o voto nos liberais-democratas. Esta eleição pode girar à volta do Brexit e a posição dos trabalhistas sobre o Brexit é ambígua, por isso podem perder para os dois lados”, resume. Ou seja: aqueles que querem sair da UE podem virar-se para Boris Johnson; os que querem permanecer podem considerar que estão mais seguros com Jo Swinson, dos Lib-Dems.

Corbyn discursa perante a multidão no último comício da campanha de 2017, onde teve resultados eleitorais muito superiores ao esperado (ISABEL INFANTES/AFP/Getty Images)

AFP/Getty Images

Este receio de que o resultado eleitoral possa ser desastroso para o partido foi visível esta terça-feira no Parlamento. Não só vários deputados se rebelaram e furaram a disciplina de voto, como alguns expressaram diretamente a sua discordância. “Irei hoje votar contra uma eleição e encorajo os meus colegas a fazerem o mesmo”, incitou à rebelião o deputado Paul Ferrelly, citando o risco de no deal, que considera que se mantém. Também o veterano Barry Sheerman não se conteve: apelidou a ida às urnas de “pura loucura” e sublinhou haver rumores no partido de que alguns dos whips (deputados responsáveis por assegurar a disciplina de voto) estavam a considerar demitir-se.

“Acredito que o Labour estava a ser sincero ao dizer que só queria uma eleição depois de ser garantido o adiamento. Mas a partir do momento em que isso acontece, a relutância em apoiar uma eleição só pode explicar-se por estarem nervosos sobre como a eleição pode correr ao partido”, considera Simon Fitzpatrick.

“As pessoas continuam a achar que o Brexit é o assunto mais importante”. A campanha complicada que aí vem para Corbyn

Os velhos do Restelo do Labour foram, portanto, afastados por Corbyn, que considerou já não ter espaço de manobra para continuar a resistir à chamada às urnas. “Jeremy Corbyn sabe que só terá mais uma hipótese de lutar em eleições como líder. Idealmente, creio que ele gostaria de ter partido para estas eleições numa posição mais forte do que aquela em que parte”, acrescenta o consultor da Cicero.

O Labour não tem, por isso, quaisquer hipóteses de ter um bom resultado nesta eleição? Não exatamente. Mas que é difícil, lá isso é. Palavra ao professor Fielding, que diz que o resultado pode bem ser “uma derrota enorme” para o Labour ou “um resultado que não é assim tão mau”. É tudo uma questão de expectativas e, para isso, o académico aponta para as eleições antecipadas de 2017: Theresa May convocou a ida às urnas, na esperança de reforçar a sua maioria e saiu-lhe o tiro pela culatra; o Labour teve um resultado muito melhor do que o esperado e ela foi obrigada a coligar-se com o DUP no Parlamento.

Em 2017 toda a gente esperava que Theresa May limpasse aquilo e isso não aconteceu. Em parte porque a campanha dela foi má, mas também porque o Labour foi capaz de tornar a campanha numa campanha sobre a austeridade, sobre o dia-a-dia das pessoas, e não sobre o Brexit. Isso aconteceu porque em 2017 as pessoas achavam que íamos sair em breve da UE e portanto era preciso olhar para a frente. Quão erradas estavam…”, aponta Fielding. E o professor acrescenta ainda um terceiro fator que beneficiou os trabalhistas nessa eleição: os Lib-Dems ainda estavam associados ao seu Governo de coligação com David Cameron e ao legado das políticas de austeridade, o que os prejudicava.

Esta poderá ser a última ida a eleições de Jeremy Corbyn como líder do Partido Trabalhista (Stefan Rousseau/WPA Pool/Getty Images)

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Agora, em 2019, o cenário é bem diferente, porque tudo se resume a uma palavra: Brexit, Brexit, Brexit. “Aquilo de que o Labour quer falar é da economia, da austeridade, dos direitos dos trabalhadores. Não do Brexit. Boris Johnson irá tentar falar do Brexit a toda a hora e Corbyn não irá querer falar disso”, resume o professor da Universidade de Nottingham sobre o que esperar desta campanha. “O problema para Jeremy é que, embora muita gente esteja farta da austeridade, as pessoas continuam a achar que o Brexit é o assunto mais importante do país.”

O cenário, por isso, não está famoso para os trabalhistas, o que ajuda a explicar tanta reticência em ir a votos. As sondagens dão, em média, uma distância de 12 pontos percentuais dos conservadores, o que, a manter-se, poderá redundar em maioria absoluta para Boris. Mas em política nada está escrito na pedra e, quando há Brexit ao barulho, muito menos. Simon Fitzpatrick deixa o aviso: “Boris Johnson é uma figura polarizadora e seria um erro dizermos já que Corbyn e o Labour não têm hipótese. As campanhas eleitorais são sempre imprevisíveis e o Labour não está tão atrás nas sondagens atualmente como estava em 2017 [quando a campanha começou].” O lema para a campanha eleitoral que aí vem é claro: “Temos de estar sempre preparados para surpresas”.

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