Não estava previsto no Orçamento, mas com a proposta do PS é garantido que será aplicado: as autarquias vão ter a possibilidade de duplicar o IMI aos donos de alojamentos locais (decisão que fica dependente da autarquia), majorar em 50% as propriedades dos fundos imobiliários e, para quem tenha casas vazias e não as coloque à disposição do mercado de arredamento, ainda pode subir mais 25%. Esta não é a única alteração que será feita ao Orçamento do Estado para 2023, mas uma coisa é certa: das 1.800 propostas de alteração, apenas as que têm a chancela do PS têm aprovação garantida. Até porque, conforme anunciou o líder parlamentar socialista, são propostas de alteração com “neutralidade orçamental”, apesar da apresentação de cerca de 50 mudanças.

Além das alterações ao IMI, o PS anunciou também esta sexta-feira que quer limitar o alargamento do prazo para reportar prejuízos fiscais, “apenas para anos em que não tenham sido atribuídos créditos tributários”. Nas empresas vai ser reforçado o incentivo à inovação.

Ainda na área da habitação, o Orçamento do Estado para o próximo ano vai contemplar, sob proposta, a isenção de imposto de selo nas renegociações dos créditos à habitação e uma taxa de IVA reduzida nas caldeiras de calor e caldeiras a pellets, que são equipamentos de aquecimento que usam biomassa para funcionar. A isenção do IVA para adubos, fertilizantes, corretivos de solo e outros produtos para alimentação de gado vai ser prolongada para 2023 (já estava em vigor neste ano) — o PS também prevê o prolongamento das medidas de mitigação do aumento dos combustíveis. Mas Eurico Brilhante Dias, líder parlamentar socialista, descartou qualquer mexida de IVA nos bens alimentares (à exceção da equiparação das conservas de moluscos com as outras conservas para taxa reduzida) por entender que não era líquido que essa descida de IVA se repercutisse nos preços finais, já que, admitiu Eurico Brilhante Dias, poderia ir para a margem do retalho.

Na fiscalidade, já depois do avanço da tributação de criptoativos, que é um tema apanhado por vários partidos políticos, o PS diz que quer ir mais longe do que o Governo. A mineração de criptomoedas (produção através de procedimentos computacionais) vai ser penalizada em sede de IRC e IRS com um coeficiente de tributação de 0,95. O coeficiente é de 0,15 para a venda de criptoativos que só serão taxados no momento em que forem convertidos numa moeda fiduciária. Face à proposta do Governo, os socialistas alteram também para que as operações como staking sejam rendimentos de capitais, estabelecendo-se  uma “dispensa na retenção na fonte para os rendimentos de capitais”.

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Com o relógio ainda a contar e a slot para entregar propostas de alteração disponível, na área dos jovens, o PS altera o Orçamento do Estado para 2023 tendo em vista o aumento de 40 euros no complemento pago aos estudantes bolseiros que não conseguiram alojamento nas residências de estudantes, para atingir 260 euros. 

No que diz respeito à retenção na fonte dos trabalhadores independentes, possibilidade já avançada pelo secretário de Estado de Assuntos Fiscais, o PS voltou a abrir a porta a uma revisão, mas continua sem ter números concretos para avançar. Para já, sabe-se que é uma ambição quer do Governo, quer dos socialistas que pretendem que a taxa seja progressiva consoante o rendimento.

A IL minimalista que “não entra no campeonato da fita métrica”

Se nos últimos anos se têm atribuído os galardões aos partidos que entregam o maior número de propostas de alteração ao Orçamento, a IL vem contrariar a tendência e anunciou ter apenas cerca de 20 propostas para apresentar. Não é que politicamente não esteja distante da ideia de Orçamento do Partido Socialista, garante a IL, mas optou por trazer propostas “cirúrgicas, eficazes e liberais”.

Numa altura de definição de lideranças liberais, a IL não quer abdicar dos princípios que a norteiam, mas faz cedências. Com a rejeição mais do que garantida da flat tax, a IL tenta agora aprovar — tal como já tinham anunciado — uma taxa única para os cinco primeiros escalões de IRS. Carla Castro reconhece que “baixar o IRS nos primeiros cinco escalões não é a proposta ideal”, mas frisa que o partido “continua a acreditar no que defende no programa”. Segundo as contas liberais, a fusão dos escalões teria um impacto entre 1.000 e 1.200 milhões de euros.

É também em sede de IRS, que a IL propõe que se permitam que contratos de crédito à habitação feitos após 2011 possam também deduzir a despesa com juros. Uma proposta que também o PAN faz, mas que viu Fernando Medina, ministro das Finanças, a explicar que é uma medida que não teria impacto no imediato, por isso, não melhoraria a vida de quem tem empréstimos nos meses em que os juros vão subir.

A IL insiste na redução de taxas de IRC e eliminação da derrama estadual, para melhorar a competitividade das empresas. Tal como já tinha sido comunicado, a IL tem propostas para os trabalhadores independentes e liberais. Rui Rocha já tinha revelado a pretensão de para estes trabalhadores propor uma redução da taxa de retenção de IRS de 25% para 20%; que a contribuição para a segurança social desça de 21,4% para 20%; a recuperação do regime simplificado, que permitia que as despesas sejam automaticamente admitidas sem justificação para determinados rendimentos; e que quando haja acumulação de rendimentos independentes com trabalho por conta de outrem, tenham isenção de contribuição para segurança social até 25 mil euros de rendimento.

Também no IVA, a IL propõe reduzir a taxa da energia de forma estrutural e dos bens alimentares de forma temporária. Carla Castro fez questão de salientar que são propostas “responsáveis” financeiramente, já que a redução das receitas e algum aumento de despesas previstas nas suas propostas seriam compensadas por um programa de corte de custos de 3 mil milhões e de privatizações.

As empresas CGD, RTP, Transtejo/Soflusa e TAP também entram nas propostas de alteração da IL que quer privatizar totalmente as primeiras e define para a TAP um mínimo de 50%.

A direita com propostas condenadas à nascença?

Com o PS a deixar claro que só está disponível para discutir “propostas da esquerda à direita democrática”, antevê-se a rejeição de todas as propostas de alteração do Chega, à semelhança do que aconteceu no último Orçamento do Estado.

Com mais de quatro centenas de propostas de alteração entregues no Parlamento, o Chega promete “600 ou 700 para o próximo ano” caso o Governo não aceite qualquer das alterações que o partido submeteu. Entre elas, o IVA à taxa zero nos bens essenciais (que o Governo já rejeitou); que o orçamento da defesa atinja já 2% do PIB; que o subsídio de risco às forças de segurança seja integralmente pago já no próximo ano; a criação de um cheque saúde para as regiões autónomas; mudanças nas regras de contratação pública nos ajustes diretos ou aplicar os lucros excessivos das empresas na redução das faturas.

Já o PSD, mais ao centro, ainda pode aspirar a pontos de encontro com o Governo e à viabilização de algumas propostas. Mas dificilmente conseguirão as de maior fôlego. Os sociais-democratas voltaram ao tema da taxa máxima de IRS a 15% para os jovens até aos 35 anos, querem alargar a margem para redução de IMI nos municípios (com o mínimo a descer dos 0,3% para os 0,1%), querem reforçar o número de camas disponíveis para estudantes deslocados, alargar as deduções com despesas de habitação em sede de IRS, diminuir o imposto nos depósitos a prazo até 100 mil euros e introduzir já mudanças no SIFIDE — que o Governo já disse que ia fazer mas fora do Orçamento.

Governo vai pôr fim aos benefícios fiscais para inovação (SIFIDE) dos fundos de investimento

Também a área da educação mereceu reparos do PSD, sob a forma de propostas de alteração. O PSD quer o “alargamento da gratuitidade das creches ao privado, com efeitos retroativos a 1 de setembro de 2022” e apresentou ainda propostas para “atribuir o direito à Prestação Social de Inclusão a partir do momento em que a mesma seja requerida”, para uma “taxa reduzida de IVA nas empreitadas de construção, conservação, reparação e beneficiação dos prédios propriedade das IPSS” e a “isenção de IVA na aquisição de bens alimentares no sector social solidário durante o ano de 2023”.

Na saúde, os sociais-democratas querem um que seja atribuído um cheque psicólogo (à semelhança do que acontece com dentistas) aos portugueses e que todos tenham acesso a um médico de família, bem como o aumento do número de camas de cuidados continuados e paliativos e cuidados domiciliários.

O PSD que apresenta cerca de 200 propostas de alteração, contabiliza em 500 milhões o impacto das suas medidas, mas que teriam enquadramento financeiro na proposta do Governo uma vez que, segundo Joaquim Miranda Sarmento, as receitas apresentadas pelo executivo apresentam sempre suborçamentação. Nestes 500 milhões estão incluídos 200 milhões de custos da descida do IRC de 21% para 19% e 100 milhões para a proposta de atualização os escalões de IRS de 5,1% (que o Governo propõe) para 7,4%.

PAN e Livre ainda sonham

Os únicos partidos que se somaram à viabilização do Orçamento do Governo para 2022 são também os que a esta altura ainda mantêm alguma esperança de ver propostas incluídas na Lei do Orçamento do Estado para 2023, com o PAN a ter já alguns ganhos de causa e o Livre a acenar com o voto contra na votação final global caso as propostas aprovadas no último Orçamento não vejam a luz do dia ou tenham compromissos do Governo nesse sentido.

O ministro das Finanças reconheceu esta sexta-feira que os jatos privados — nomeadamente o utilizados na aviação executiva — vão ser alvo de uma taxação (2 euros por viajante), uma ambição antiga do PAN e que poderá doravante reivindicar ter conseguido implementar. Mas os ganhos para o Pessoas-Animais-Natureza não se ficam por aqui já que Fernando Medina reconhece que as  verbas atribuídas aos centros de recolha animal e da comparticipação de despesas “que as associações zoófilas legalmente constituídas suportem com a aquisição de produtos de uso veterinário ou de serviços médico-veterinários” devem ser reforçadas, tal como o PAN quer.

Com estas duas propostas bem posicionadas para serem acolhidas pelo Governo, o PAN apresentou ainda uma uma proposta de alteração, que tem como objetivo incentivar a adoção do teletrabalho pelas empresas. A proposta passa por reduzir a taxa contributiva a cargo da entidade empregadora em relação aos funcionários que estão em teletrabalho em dois pontos percentuais, para 18,3%. O PAN tem mais de 100 propostas de alteração.

Já o Livre, insiste no Programa 3C (casa, conforto e clima), que quer reforçado no próximo ano. Reconhecendo que a proposta, aprovada pela primeira vez no OE2022, já tem histórico de não execução — “não foi tão longe quanto possível” — e que no futuro o Livre pode continuar a dizer que “não foi suficiente”, mas insistiu na necessidade de implementação, conforme disse também na entrevista ao programa Sob Escuta da Rádio Observador.

O passe ferroviário nacional, que já mereceu a desaprovação pública do ministro das Infraestruturas Pedro Nuno Santos, é outra das propostas, com o Livre a reconhecer “estágios e fases” e diz-se “pronto para negociar este tema”, pedindo também que “a CP baixe os outros passes que já tem.” Ainda nos transportes, o Livre quer a criação de rede de transportes escolares, em formato projeto-piloto, para que as crianças sejam transportadas de casa à escola e vice-versa.

Também para os mais novos, o Livre apresenta uma proposta para “reforçar em 30% o valor de todas as prestações” de abono de família. O partido que tem Rui Tavares como deputado único apresenta 150 propostas de alteração.

Esquerda a preparar ataques ao Governo, sem perspetivas de aceitação

À semelhança do que aconteceu no último Orçamento do Estado, o passado em comum de PS e BE e PCP parece ter algum peso na hora de discutir as propostas da esquerda, levando à sua rejeição. Bloco e PCP insistem na taxa de lucros excessivos e nos criptoativos, com o PCP a propor uma taxa de 35%.

Ainda nas taxas e impostos, o BE insiste no “imposto Google” e quer destinar parte das receitas da Santa Casa da Misericórdia para comunicação para prevenir adição do jogo.

O Bloco propõe ainda a criação de um passe de transportes a nove euros em todo o país, para aplicar em vários concelhos e áreas metropolitanas, para que os portugueses se possam deslocar em “todos os transportes coletivos”.

Na educação, o Bloco quer uma compensação para professores deslocados e acabar com as propinas, dos cursos técnico-superiores aos mestrados integrados.

Na saúde, o BE quer impedir que unidades de saúde familiar tipo C que estão nas mãos dos privados avancem e, na habitação, o Bloco vai avançar com uma proposta para impor um travão à atualização de rendas também para os novos contratos — o PS faz proposta diferente para impedir benefícios fiscais aos senhorios que na renovação ou nos novos contratos aumentem as rendas em mais de 2% (o limite imposto pelo Governo na norma travão de atualização das rendas).

Já o PCP insiste na reforma aos 65 anos, a eliminação do fator de sustentabilidade, a aposentação sem penalizações depois de 40 anos de contribuições e a reposição das percentagens de pagamento de trabalho suplementar cortadas pelo governo PSD/CDS. Nas famílias, o PCP quer ver o abono pré-natal aumentar para os 250 euros e volta a pedir uma “rede pública de creches e gratuitidade para todas as crianças.”

Na área do trabalho, na função pública, o PCP quer o “aumento do subsídio de refeição para 9 euros, face aos 5,2 euros que o governo assume para 2023 e o aumento do subsídio de transporte para 0,50euros/km”.