Os incêndios florestais na ilha de Maui, no Havai, já provocaram mais de 100 mortos, forçaram residentes e turistas a fugir – alguns refugiaram-se no oceano para escapar às chamas – e devastaram centenas de casas, locais de trabalho e edifícios históricos, incluindo na antiga capital da ilha, Lahaina. As autoridades ainda estão a investigar a origem dos incêndios, que começaram a 8 de agosto e são considerados os mais mortíferos do último século nos Estados Unidos, mas nas redes sociais circulam já algumas teorias. São numerosos os utilizadores do Facebook e do Twitter que apontam o uso de Armas de Energia Direta (DEW, na sigla em inglês) como a possível causa.

Uma das publicações que tem circulado alega que os fogos não tiveram uma causa natural e que só uma destas armas poderia ter provocado o grau de destruição que se verificou. O objetivo seria, como afirma um utilizador do Facebook, “empurrar” a população para smart cities e “justificar os lockdowns climáticos”.

Não é o único post do género e alguns fazem-se acompanhar por fotografias manipuladas. Uma das que mais tem circulado mostra a Igreja Waiola, em Lahaina, completamente envolvida por chamas, sendo possível ver um feixe de luz apontado à estrutura. A imagem original, que está disponível no site da Associated Press, foi invertida e nela adicionado digitalmente o feixe, como avisa até a própria rede social X (antigo Twitter).

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Não é a primeira vez que circula a teoria de que um incêndio foi provocado com recurso a às DEW. Como explica o Office of Naval Research — organismo da Marinha dos Estados Unidos — tratam-se de “sistemas eletromagnéticos capazes de converter energia química ou elétrica em energia irradiada e focá-la num alvo, capaz de degradar, neutralizar, derrotar ou destruir uma capacidade adversária”.

Alguns utilizadores alegam ainda que os incêndios foram uma causa direta da geoengenharia, ou engenharia climática, isto é a intervenção deliberada e em grande escala no sistema climático da Terra, geralmente com o objetivo de mitigar os efeitos do aquecimento global. Também há quem aponte o dedo ao projeto norte-americano HAARP — Programa de Investigação de Aurora Ativa de Alta Frequência, em português — que investiga a ionosfera, a camada superior da atmosfera terrestre. O programa é frequentemente referido em teorias da conspiração como causa de desastres naturais, como foi o caso em 2021 da erupção do vulcão Cumbre Vieja, na ilha de La Palma, em Espanha.

Estas e várias outras sugestões parecem ter começado a propagar-se numa altura em que foi noticiado que um dos primeiros incêndios reportados no Maui podia ter sido provocado por linhas de energia danificadas. Isto porque no dia 7 de agosto, pelo menos um hora antes das autoridades darem o alerta, uma câmara de segurança no Centro de Conservação de Pássaros de Maui captou um flash entre a vegetação visto por alguns como suspeito.

“Está vento e então há um flash. E acho que é quando uma árvore está a cair numa linha elétrica. Depois disso a energia foi abaixo, o nosso gerador disparou, a câmara voltou a ficar online e a floresta já está a arder”, descreveu Jennifer Pribble, investigadora sénior no centro de conservação num vídeo divulgado no Instagram e que mostra o deflagrar de um incêndio.

Por essa altura, na cidade de Makawao, onde se situa o centro, dez sensores registaram um incidente significativo na rede elétrica do Havai, segundo dados divulgados pela Whisker Labs, uma empresa de monitorização nos EUA. O flash brilhante captado pela câmara de segurança terá sido provavelmente um “arco elétrico” – quando uma linha elétrica é derrubada ou entra em contacto com outra linha ou com vegetação, libertando energia geralmente por meio de faíscas –, segundo tem explicado membros da empresa e vários especialistas à imprensa internacional.

O caso não foi o único. Alguns residentes da ilha de Maui captaram vídeos que mostram incidentes com postes de energia e que resultaram no acendimento de chamas, mostrando os primeiros momentos do que se tornou um dos piores incêndios nos EUA. As imagens estão a emergir como provas que apontam as linhas de serviço público caídas como uma possível causa de alguns focos de incêndio.

A Hawaiian Electric Co., a maior distribuidora de eletricidade do arquipélago, enfrenta críticas por não desligar a energia num momento de alerta de vento forte, devido ao furacão Dora, de categoria 4 e que passava a uma distância segura de cerca de 800 quilómetros. A rede terá sido mantida ligada mesmo quando dezenas de postes começaram a cair.

A Justiça do Havai já recebeu inclusivamente uma ação coletiva avançada por três escritórios de advogados da ilha que acusam a distribuidora de eletricidade de ter provocado os incêndios, “por, indesculpavelmente, deixar as suas linhas de energia operacionais durante as condições previstas de alto risco de incêndio”. Para já está hipótese ainda não foi comprovada.

O Serviço Nacional de Meteorologia começou a alertar o público sobre condições perigosas de incêndio no Maui a 3 de agosto. Os meteorologistas emitiram o nível de alerta vermelho a 7 de agosto, alertando que a combinação de ventos fortes do furacão de categoria 4 e as condições de seca, agravadas pelas alterações climáticas, criavam as condições ideais para isso. Ecoando as declarações de especialistas em incêndios florestais, o governador do Havai disse acreditar que uma confluência de condições climáticas contribuiu para a deflagrar e propagar as chamas.

Conclusão

Não há qualquer prova de que os incêndios no Havai tenham sido provocados por Armas de Energia Direta, muito menos geoengenharia ou o programa HAARP. As declarações sobre isso não são acompanhadas por qualquer tipo de evidências e as imagens divulgadas como provas têm sido denunciadas como manipuladas. Para já as autoridades continuam a investigar as causas dos fogos, que o governador do Havai, Josh Green, descreveu como o “maior desastre natural” da história do estado, apontando para as alterações climáticas como um dos impulsionadores.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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