O consenso a que os países do G7 chegaram na passada semana, ao acordar que todas as suas empresas internacionais paguem pelo menos 15 por cento sobre os respetivos lucros, é uma oportunidade para quem defende a simplificação e redução da carga fiscal propor que aquela taxa seja o ponto de chegada e não um ponto de partida.

Uma das principais reformas que ficou por fazer neste século em Portugal foi, com efeito, a do sistema fiscal: a abolição dos mais de 500 regimes de benefício que foram identificados pelo Governo em 2019, acompanhada da diminuição progressiva do número de taxas, como as do IRS e do IVA, e da harmonização e redução das taxas remanescentes, não só daqueles dois como do IRC.

Qualquer reforma fiscal deveria ter como objectivo mais eminente restituir a universalidade a todos os impostos. Assim reverteríamos a tendência perniciosa de isentar total ou parcialmente cada vez mais contribuintes em obediência aos mais variados propósitos que, no conjunto, obscurecem a natureza essencial dos impostos que é serem instrumentos do exercício da cidadania ativa, o que implica acessibilidade e transparência.

É mal-são que 45 por cento dos 5 milhões de famílias que declararam rendimentos em 2020, a metade mais pobre, não tivesse pago IRS para facilitar a vida à máquina tributária, que assim as alienou civicamente por um capricho burocrático. Como podemos convencer a metade dos eleitores que deixaram de votar nas legislativas se a humilde colecta de muitos deles foi considerada indigna do esforço de cobrança?

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Por outro lado, para conseguir reter o crescente contingente de Portugueses qualificados, o país precisa de facilitar a respetiva contratação reduzindo a carga fiscal que incide sobre o trabalho dependente. O atual Governo compreendeu isso quando prometeu, ao abrigo do Programa Regressar, isentar 50 por cento do rendimento do trabalho dos emigrantes que voltassem em 2019 ou 2020.

Na prática, os contribuintes de IRS que não são abrangidos por estes e outros regimes excecionais, como o dos residentes não habituais, acabam subsidiando os restantes. Uma solução mais transparente e equitativa seria, portanto, acabar progressivamente com todas as isenções e benefícios e reduzir gradualmente a pletora de taxas de IRS até se alcançar uma única e universal de 15 por cento.

Em matéria de IVA, devíamos seguir o exemplo da Alemanha, que anunciou há um ano a redução da taxa normal do seu IVA de 19 para 16 por cento, e almejar alcançar a taxa única e universal de 15 por cento que defendia o saudoso José Luís Saldanha Sanches. Esta redução traduzir-se-ia numa transferência para os consumidores, sobretudo os mais pobres, de cerca de um terço da respetiva receita em 2019, que foi de 17 mil milhões de euros, contra 13 mil milhões de euros do IRS e 6,5 mil milhões de euros do IRC.

O nosso atual IRC, de 31,5 por cento, o segundo mais alto da UE, desincentiva o investimento. Segundo o Banco Mundial, entre 2010 e 2018 a formação bruta de capital fixo anual na Irlanda foi de 23 por cento do PIB, enquanto em Portugal foi de 16,5%. No mesmo período, o investimento direto estrangeiro (IDE) anual na Irlanda foi, em média, de cerca de 27 por cento do PIB, enquanto em Portugal foi de cerca de 5%. Ora, a taxa de IRC na Irlanda é de 12,5 por cento. Devíamos, pois, baixar a taxa única de IRC para 15 por cento dos lucros distribuídos e acabar com todos os respectivos regimes de isenção parcial, o que atrairia mais IDE e FBCF (Formação Bruta de Capital Fixo), incentivando a criação de emprego e o aumento da nossa produtividade.

A contribuição da progressividade para a redução da pobreza é em grande parte uma ilusão, na medida em que em praticamente todos os países onde se adotou uma taxa única e universal a receita fiscal aumentou em consequência, não só da obliteração das oportunidades para fugir aos impostos, como sobretudo do aumento da taxa de crescimento da economia e portanto da matéria colectável.

Para já não falar, claro está, no aumento da coesão social e da confiança nas instituições de um Estado de Direito que resultam de todos os seus cidadãos passarem finalmente a saber, de ciência certa, o que todas as famílias e empresas pagam sobre qualquer tipo de rendimento ou receita.

A fim de manter a transparência, credibilidade e justiça do nosso sistema fiscal, que assim seriam alcançadas, de cada vez que se decidisse aumentar a taxa de 15 por cento, agora adoptada pelos países do G7 para o IRC sobre os lucros das suas empresas internacionais, o aumento decidido seria prontamente aplicado a todos os impostos.