A escolha do novo Presidente da Comissão mostrou, mais uma vez, o entendimento muito particular que a esquerda tem da democracia. Os exemplos repetiram-se. Começou com a rejeição de Manfred Weber para a chefia da Comissão. Já afirmei que o PPE cometeu um erro ao escolher um político inexperiente e sem experiência executiva para se candidatar à presidência da Comissão. Mas uma coisa bem diferente é atacar a sua legitimidade para o cargo. Eu trabalhava em Bruxelas quando se negociou o Tratado de Lisboa e lembro-me muito bem do que se discutiu. Todos sabiam que havendo eleições em 28 países é praticamente impossível um grupo político alcançar sozinho a maioria absoluta. Por isso, o espírito do Tratado é de que o candidato do grupo mais votado goza do direito político de ser escolhido pelo Conselho Europeu e de tentar construir uma maioria no Parlamento Europeu. Foi assim com Durão Barroso em 2009 e com Jean Claude Juncker em 2014.

Desta vez, não foi assim porque os governos socialistas e liberais atacaram a legitimidade de Weber, com argumentos extraordinários. Um deles foi de que o PPE tem ocupado a presidência da Comissão Europeia há demasiado tempo. É verdade. Sabem porquê? Porque é o grupo mais votado desde 2004. Vejam se entendem bem. Os socialistas perdem as eleições europeias desde 2004. Quem tem a culpa das sucessivas derrotas dos socialistas? Não são certamente os partidos de direita na Europa. Se os socialistas tivessem sido o grupo mais votado nestas eleições europeias, os seus líderes teriam questionado a legitimidade do seu candidato, Timmermans? Claro que não. Então por que razão questionaram a legitimidade de Weber? Por uma razão muito simples: não é socialista e é de direita. Perguntará o leitor mais sensato: e o respeito pelas regras da democracia europeia e do Tratado de Lisboa? Os socialistas não as respeitaram porque não gostam de perder. Só gostam das regras da democracia quando ganham as eleições. Quando as perdem, tentam descobrir atalhos políticos para alcançar uma vitória que não conseguiram nas urnas. De resto, é essa a definição de geringonça.

Weber foi afastado, pela coligação entre socialistas, liberais e Macron, a qual contudo não conseguiu eleger o candidato socialista, Timmermans. Acabou por ser eleita uma política do PPE, Ursula von der Leyen. Apareceram então mais dois argumentos dos socialistas. Em primeiro lugar, Ursula von der Leyen não foi candidata nas eleições europeias e por isso não tem legitimidade. Ou seja, quando foi do interesse dos socialistas, as regras do Tratado de Lisboa não interessavam. Agora, para enfraquecer a escolha do Conselho Europeu, o Tratado de Lisboa voltou a ser importante. Em segundo lugar, os liberais e Macron eram óptimos quando se juntaram aos socialistas para derrotar Weber. Agora, já são péssimos porque se aliaram ao PPE.

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