Como é possível, depois de conhecidos os resultados, ter-se achado credível o cenário de uma vitória à direita com o PSD a vencer as eleições? O que a noite de 30 de janeiro prova é que o país político (políticos, comentadores e técnicos de sondagens) não faz a menor ideia do que pensam, esperam e querem os portugueses.

O tsunami que deixou todo o país pintado a cor-de-rosa diz-nos que a direita tradicional já não sabe interpretar as necessidades do país, nem alinhar qualquer resposta que surja como uma boa alternativa. Se, no que respeita ao CDS, este corte com a realidade era já uma constatação de facto, o que aconteceu ao PSD torna o cenário muito mais preocupante.

Não, já não se trata apenas de uma questão de liderança. Trata-se de todo um partido que não percebeu nada do que o seu eleitorado queria ou esperava. O CDS morreu no domingo, mas o PSD também já não se sente nada bem e isso coloca um problema gigante a que o eleitorado não socialista tem que responder nos próximos quatro anos. Ou o PSD muda de alto a baixo, ou os novos partidos à direita absorvem todo esse eleitorado, ou o PSD e o CDS de outros tempos fazem um rebranding para surgirem aos olhos dos portugueses com uma marca própria e única, capaz de reconquistar uma multidão de órfãos que ficaram sem casa natural na política portuguesa.

O alemão que Rui Rio ontem utilizou para enxovalhar um jornalista, que lhe fazia uma pergunta legítima debaixo de uma chuva de apupos, acaba por ser a caricatura em que o líder da suposta direita se tornou. Rio que aconselhava Costa a perder com dignidade, acaba por dar um triste espetáculo na hora da derrota. Ele e o aparelho do PSD que o acompanhava na sala não perceberam que andaram nos últimos anos a falar alemão com o seu potencial eleitorado.

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E agora? O que deve fazer a direita? Qual é a resposta para milhares (milhões?) de portugueses que votaram Costa porque preferiram o original à cópia, votaram Chega porque quiseram mandar recados ao sistema ou votaram IL porque era o menos mau dentro do que havia para escolher? Quatro anos é muito pouco tempo para fazer vingar uma alternativa. Mas ao menos a maioria absoluta do PS abre espaço para que a direita tenha tempo e recato para voltar ao país real, juntar os melhores e ensaiar uma resposta.

O PSD que sai das eleições já não é um partido de alternativa de poder. Como não há vazios em política, ou o PSD se reinventa, ou o PS continua a ocupar o espaço todo, ou a panela de pressão dos descontentes vai escolher o caminho mais fácil para descomprimir.

O que aconteceu à direita nestas eleições não traz boas notícias à democracia. Como sempre, o que acontece lá fora, chega tarde, mas chega cá. Depois de os vencedores fazerem a festa e de os derrotados lamberem as feridas, era importante, a bem do regime, que todos olhassem com atenção e tirassem as devidas lições destas surpreendentes eleições.