É tempo de férias e seria também um bom momento para pensarmos no que é fundamental fazer para conseguirmos crescer mais do que os pouco mais de 2% que nos estão prometidos quando for corrigido o mergulho gerado pela pandemia. Sim, o ministro das Finanças, na linha aliás do que já fazia Mário Centeno, apresenta agora o crescimento de dois anos para nos impressionarmos com o 9%. Mas o que nos interessa é saber como vamos aproveitar o facto de termos dinheiro para dar um salto no crescimento da economia.

Até agora, a falta de dinheiro e de condições políticas foram os principais argumentos que podíamos encontrar para a ausência de políticas públicas de intervenção estrutural – sim, está tudo farto da expressão reforma estrutural e embora esta expressão seja mais complicada, vamos tentando encontrar outra mais simples.

António Costa concentrou-se na sua primeira legislatura a corrigir o desequilíbrio orçamental, custasse o que custasse. Era um objectivo importante para o país, pela dimensão da sua dívida, e, ao mesmo tempo, retirava uma das bandeiras do PSD. O PS passou a ser também um partido financeiramente responsável, conseguindo a proeza de “enganar” os seus parceiro da Gerigonça. Usou-se e abusou-se das cativações, retirou-se poder aos gestores públicos transformando-os em directores-gerais e reduziu-se ao mínimo o investimento público. Três vectores de actuação que nem no tempo da troika o Governo de Pedro Passos Coelho se tinha atrevido a usar. Ao mesmo tempo que se acenava com o fim da austeridade por se acabarem os cortes salariais dos funcionários públicos. A aliança à esquerda e a ligação partidária de alguns grupos que foram muito activos no tempo da troika garantiram a paz social, uma vez que se foi assistindo à degradação dos serviços públicos em geral e à não recuperação, por exemplo, do poder de compra de alguns pensionistas, sem que existisse quem o denunciasse.

Mas o objectivo foi atingido. E para quem considere que os meios justificam os fins, foi uma política de sucesso. Atingimos o excedente orçamental no ano anterior à pandemia, uma marca histórica, sem que o “lixo debaixo do tapete” incomodasse alguém.

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Chegou então a pandemia, e para todos os países do mundo. Um choque simétrico que ditou uma atitude completamente diferente de quem manda na União Europeia. Obviamente que nunca se aplicaria uma política restritiva numa circunstância destas, quer pelo tipo de crise que enfrentamos, quer pelo facto de todos estarem a ser violentamente afectados pela pandemia.

Todos sabem muito bem que um crise que tem origem no universo financeiro, seja ela provocada pelos excessos do Estado ou do sistema financeiro, segue a terapia habitual: um coque recessivo para reduzir as necessidades de financiamento. Foi isso que a troika fez, em Portugal como na Grécia e na Irlanda. Foi assim que o FMI actuou quando Portugal precisou dele em finais da década de 70 e no início da década de 70.

É por isso demagógico comparar as medidas que estão a ser adoptadas agora com o que o Governo de Pedro Passos Coelho foi obrigado a fazer e antes dele Mário Soares, com o FMI. Crises diferentes exigem terapias diferentes. Como diferentes são as terapias quando todos estão metidos no mesmo saco. E é lamentável que, em vez de se contribuir para que as pessoas em geral compreensão isso, se opte por dizer que “desta vez, nesta crise, não vai haver austeridade”. Como se isso fosse uma escolha do Governo e não, simplesmente, fruto do tipo de crise e das circunstâncias. Mais lamentável ainda é ver a incapacidade que o PSD revela em explicar isso mesmo, como se tivesse vergonha da sua herança ou da sua história.