Um presente de Natal é uma “prova de vida”. Não tem que ser grande. Não precisa de ser fantástico. Não é, seguramente, indispensável que seja caro. Mas, para ser presente, tem que concretizar um desejo. Um desejo acerca do qual não se escreveu uma carta ao Pai Natal. A propósito de quem nunca se falou, de forma explícita e clara. E, quando muito, que mereceu pequenas pistas; quase por meias-palavras ou nas entrelinhas dum comentário qualquer. Numa visita a um centro comercial ou quando, num passeio, descontraído, se apontou para uma montra e, de forma subtil, se olhou, fixamente, para um objecto. Ou quando se fez um  “à parte” generoso, mas quase de fugida, acerca doutro.

Se, na verdade, as cartas ao Pai Natal nos dizem alguma coisa é que, sem elas, muitos de nós teríamos bastantes dificuldades em identificar os desejos dos nossos filhos para que, depois, conseguíssemos hierarquizá-los e, só então, corresponder-lhes e satisfazê-los. Mas entre nós, as pessoas crescidas, os desejos não se escarrapacham numa carta porque, de certa forma, todos reconhecemos que, quando precisamos de “escrever” os nossos desejos, quem está connosco vive “a leste” de quase tudo o que é importante para nós. Por mais que os nossos mais pequenos desejos estejam – todos! – inequivocamente “identificados”, à espera que alguém os “apanhe no ar” e os concretize. O Natal é uma festa porque é nele que se concretizam alguns dos nossos desejos. E é uma festa porque – quando alguém nos conhece tão intimamente que não só nos guarda dentro de si como identifica os mais pequenos desejos que “costurámos”, em segredo – somos, de certa forma, e por causa disso, “o seu menino Jesus”. Que mereceu o cuidado e a delicadeza de quem, num pequeno gesto, lhe deu uma “prova de vida” do seu amor por si.

É verdade que todos repetimos, quase como quem desqualifica a sua inocência, que as crianças acreditam no Pai Natal. Mas não é bem assim. Seja o Menino Jesus, o Pai Natal ou os pais, as crianças reconhecem que há alguém que olha por elas, as reconhece de forma única e lhes satisfaz os desejos. E isso, sim, é o mais importante. É verdade que lhes “vendemos” o Natal como se aquilo que as crianças recebem fosse proporcional ao bem que se portam. Mas, na verdade, tal como acontece com elas, connosco as coisas passam-se de forma parecida. Já não podemos responsabilizar o Pai Natal pelo modo desajeitado como não identifica os nossos desejos. E deixa de ser possível resguardarmo-nos na decepção do talão de troca de um presente “de circunstância”… do “Menino Jesus”. Sobramos uns para os outros. Mas, tal como elas, a concretização dos nossos desejos pelas pessoas que nos amam depende do modo como nos “portámos bem”. Da forma como não fomos omissos nem esquivos com elas, ao longo de um ano. Ou da convicção com que as mimámos e as fizemos sentir aconchegadas, ao pé de nós. Ou lhes demos “colo”, simplesmente. O Natal não é só uma troca de presentes. Se os presentes, para serem presentes, “têm” de concretizar desejos, o Natal é uma troca de desejos; que “apanhamos” entre as palavras de todos os dias, e concretizamos, uns aos outros. Com a certeza de que disso depende a forma como elas ficam mais perto do nosso coração.

É muito bonito que — seja por causa duma estrela cadente, seja em consequência de uma primeira vez diante duma circunstância nova, na nossa vida — alguém, de forma atenta, (de preferência, alguém muito próximo de nós) nos interpele e nos diga: “Pede um desejo!”. Para que, de seguida, nos advirta que ele só se virá a concretizar se o guardarmos, preciosamente, e nunca o contarmos a ninguém. A “regra do jogo” pressupõe, não tanto, que haja quem registe os nossos desejos e os concretize. Mas que, se a pessoa a quem não o contámos nos conhecer de forma íntima, delicada e única, ela irá contribuir para que os nossos desejos sejam concretizados. Feitas as contas, um desejo nunca se pede! De certa forma, “sinaliza”. Põe uma relação à prova. Melhor: pede-se a alguém que o reconheça! Quase como quem coloca um alfinete num palheiro. Esperando-se, de seguida, que quem nos conhece, intimamente, não se perca e o resgate. É por isso que os desejos que se trocam nos fazem fazem sentir co-moventes, uns para os outros. Nos aproximam uns dos outros, dito de maneira diferente. E é por eles que essa comunhão faz, só por si, com que seja Natal.

Por tudo isto, apesar de sermos partículas tão ínfimas do Universo que quase “não existimos”, tenho esperança que os desejos que vir concretizados na mais “insignificante” lembrança que vier a receber, o faça sentir “o melhor do mundo” para alguém. Feliz Natal!!

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