É estranho que, chegados aqui, haja tantas pessoas a falar com nostalgia do Natal. Não tanto porque lhes doa já não acreditarem no Pai Natal. Ou porque a persistente ausência de algumas pessoas ajude a que se vinque aquilo que lhes falta sobre tudo o mais em que acreditam. Mas a nostalgia que deixa tantas pessoas mais agrestes parece ter, sobretudo, a ver com o modo como parecessem sentir-se a festejar a familia… em que não acreditam. E isso é mau!
Ou porque as famílias que fazem parte de si são omissas, negligentes ou, mesmo, maltratantes. Ou porque as clivagens entre pais e filhos ou entre irmãos ou outros familiares transformam uma festa numa espécie de protocolo de estado onde os tempos de convívio são geridos e cronometrados para que os familiares não se cruzem, uns com os outros. Ou porque os presentes não são gestos simbólicos que traduzam a impressão digital da presença preciosa de algumas pessoas na nossa vida e oscilam entre um desfile exibicionista e a afirmação do desmazelo e do descuidado. Ou porque a forma como as famílias não casam umas com as outras faz do Natal uma divisão quase milimétrica do tempo que se dispensa a cada família de origem de um casal, como se fossem todos a mesma família. Ou porque quem chega de novo a uma família se coloca assustado no seu canto em vez de participar na construção da festa, que é sempre mais preciosa e mais importante que tudo o resto que ela nos traga, a seguir.
Chegados aqui, há sempre a fórmula banal: “o Natal é das crianças”. Que é mentira! Ou, vendo bem, talvez até seja verdade. Porque, chegados à festa – à excitação do convivo, à alegria e ao fervilhar, às historietas de todos os anos recontadas como se ninguém se recordasse delas, ou ao “tic tac” para desembrulhar um presente e para nos comovermos pelo amor que ele nos traga – somos todos crianças. Prontos para acreditar na bondade e no amor. Prontos para nos aconchegarmos no colo e termos o mimo que não se reclama. Prontos para acreditar que aquilo que nos liga sobressai sobre tudo o que nos separa.
Somos todos crianças no Natal. E só quando é assim o Natal é Natal.
Por isso tudo, dêem-se às criancices. E Feliz Natal!!