A tendência para vivermos com mentiras colectivas, e fingirmos que elas não existem, é impressionante. Qualquer pessoa que pense cinco minutos sobre a política europeia e sobre a política nacional, percebe que as eleições europeias não existem. São 28 eleições nacionais; por isso ninguém discute temas europeus. Em Portugal, as “eleições europeias” são a primeira volta das eleições legislativas de Outubro. Em Espanha, são a segunda volta das legislativas do fim de Abril. Em França, são, mais uma vez, eleições entre Macron e Marine Le Pen. Na Alemanha, são eleições para confirmar que os Verdes se transformarão no principal partido de centro esquerda e para testar até onde continua a crescer o partido de extrema direita, o AfD. Em Itália, são eleições para reconfigurar a relação de poder entre os dois parceiros da coligação, a Liga e o Movimento 5 Estrelas. E podíamos continuar com todos os outros países europeus. Não se discute a “Europa” em lado nenhum. Só se discutem temas nacionais. Ironicamente, o único país onde se discutiu a “Europa” foi naquele que se prepara para sair da União Europeia, o Reino Unido.

Perante esta realidade política, há duas escolhas. A maioria lamenta-se da ausência da “Europa” das campanhas e do aumento da abstenção, e não entende o eleitorado (é grave quando aqueles que pedem o voto não entendem os eleitores). Mas há uma segunda escolha: tentar compreender as causas do aumento da abstenção nas “eleições europeias” e o crescente voto nos partidos nacionalistas e soberanistas (chamam-lhes “populistas” e até, involuntariamente, têm alguma razão, na Europa o nacionalismo foi sempre popular).

Não quero transformar este artigo numa lição de história ou de pensamento politico. Mas convém começar com uma observação simples. Os parlamentos nacionais, em todas as democracias parlamentares europeias, resultaram de lutas políticas, de revoluções nacionais ou de guerras europeias. Na grande maioria dos casos, resultam de conquistas populares. O parlamento europeu é uma excepção. Foi criado por elites políticas e partidárias em nome de uma aspiração, uma federação europeia, que não existe. Não resultou de conquistas políticas de um “povo europeu”, que de resto não existe. As eleições europeias servem para tentar legitimar a posteriori uma invenção parlamentar que não tem base popular. Os parlamentos são legítimos quando os eleitores se sentem representados pelos deputados. A maioria dos europeus não se sente representada pelos deputados que se sentam em Bruxelas ou em Estrasburgo.

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