O «monstro» é, como se adivinha, o governo formado por António Costa para a legislatura que agora se inicia e não se sabe quando terminará. Trata-se, efectivamente de uma colecção incoerente de pastas bizarras coladas com cuspo às funções habituais e suficientes de qualquer governo. A sua primeira «monstruosidade» reside nesses setenta membros que batem todos os recordes e só se explicam pela necessidade permanente do PS distribuir «jobs for the boys and the girls» recrutados nas hostes partidárias!

Em segundo lugar, é a falta de competência conhecida da maioria dos nomeados para o desempenho dos pelouros inventados não se sabe por que imaginação delirante. Em terceiro, o recrutamento maciço de eleitos das autarquias para o novo governo, a começar pelas do distrito de Lisboa, que já tem pelo menos cinco representantes sem contar o 1.º ministro, para não falar do pessoal para os inúmeros novos gabinetes governamentais. Com efeito, esta enorme quantidade de autarcas e funcionários autárquicos não pode deixar de estar ligada à preocupação do PS com as próximas eleições autárquicas.

Em quarto lugar, espantam as dúzias de designações obscuras e, por vezes, incompatíveis das pastas governamentais, sobretudo as dezenas de secretarias de Estado distribuídas entre perto de uma vintena de ministérios, muitos das quais de nomenclatura já de si rebarbativa e, por vezes, contraditória, como tudo o que tem que ver com ambiente e território, como se este tipo de governos fosse capaz de fazer mais do que legislação inaplicável ou inaplicada!

Por último, uma quinta disformidade é a reiteração de toda uma série de «erros de casting» cometidos no anterior governo e que o PS não quer reconhecer, apesar de ter ficado longe da «maioria absoluta». Resta-nos adivinhar quem vai coordenar aquela trapalhada toda: só «coordenadores» são quatro… Em suma, o PS não aprendeu nada e apenas repete um vocabulário pseudo-tecnocrático em benefício de uma máquina tentacular de clientelas.

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Acresce a insistência em nomeações de ministros que só aumentaram os problemas das respectivas pastas no passado, como sucede com ambos os Ministérios da Educação, a da Justiça, a última da Saúde e a última da Cultura, a qual ganhou três secretarias de Estado, incluindo a tutela dos «media», para distribuir por menos de 1% do PIB. Na conta das pastas com muita gente mas pouca ou nenhuma obra feita, figuram o Ambiente e o Planeamento, que ninguém sabe o que faz, enquanto se multiplicam ministérios e secretarias de Estado que só servem para «dinamizar» o chamado «interior»!

As contradições internas dos governos estão longe de ser inéditas e, em Portugal, dependem mais das modas culturais e pseudo-técnicas do que do conteúdo e da dimensão real das questões em causa, desde uma misteriosa «transição informática» a várias versões da chamada «emergência ecológica», seja lá o que significa esta novi-língua! Em contrapartida, a pasta da agricultura, à qual foram retiradas as florestas por causa do medo que o governo apanhou com os fogos, ficou cada vez com menos gente e menos dinheiro.

Entretanto, as ditas florestas, que são uma componente significativa da economia agro-industrial (3% do PIB), foram entregues ao ministério do Ambiente (?), enquanto era inventado ao lado um ministério da «coesão territorial», a par de um denominado «desenvolvimento rural» e de uma tal «valorização do interior», que não passam de piscadelas de olho eleitoralistas devidamente ridicularizadas!

Lado a lado com dessa súbita paixão pelo «interior» franqueada por uma secretaria de Estado das Autarquias a fim de acautelar as eleições de 2021, já em termos político-partidários se passa o oposto: quatro distritos apenas do litoral apens (Braga, Porto, Lisboa e Setúbal) pesam mais do que o resto do país! Daí que se imponha cada vez mais uma reforma eleitoral que acabe com a crescente desigualdade entre o litoral urbano e o interior desertificado que só faz aumentar a desproporcionalidade da representação parlamentar. Mas isso jamais o PS nem o PSD o farão em tempo útil para, entre muitas outras coisas, controlar a abstenção crescente. Afinal, segundo os números, com bastante menos de 2 milhões de votos, o PS teve apenas o apoio expresso de 18% do eleitorado inscrito pelos serviços públicos. Em contrapartida, no parlamento o mesmo partido clientelar pesará perto de metade e é esta desproporcionalidade que se torna cada vez mais intolerável em democracia!

PS. E como não podia deixar de ser, antes mesmo de o novo «monstro» tomar posse, já o nóvel secretário de Estado para a televisão vendeu a sua empresa ao sobrinho, enquanto uma antiga secretária de Estado do Turismo, acusada pelo «Polígrafo» de conversas indevidas com um capitalista chinês, saltou para ministra da Segurança Social – de longe, a maior rubrica orçamental do país!