No dia 18 de Dezembro celebrou-se mais um Dia Internacional dos Migrantes. Com o ano a chegar ao fim é tempo para fazer um balanço sobre o que 2022 trouxe em matéria de migrações em Portugal.

A comunidade estrangeira continua a crescer totalizando perto de 700 mil cidadãos estrangeiros titulares de autorização de residência, o valor mais elevado registado pelo SEF desde o seu surgimento em 1976.

Relativamente à tão aguardada alteração da Lei dos Estrangeiros, bem como do Decreto-Regulamentar que entrou  em vigor no passado dia 30 de Outubro, não são  suficientes para fazer frente aos desafios migratórios que Portugal atravessa.

As alterações à Lei confundem prioridades, aumentam a insegurança e lançam a confusão nas entidades públicas envolvidas. Analisamos brevemente dois vistos novos:

Foi aprovado o famoso visto para trabalho remoto, também designado  Visto digital nomad..

Um dos principais riscos decorrentes desta alteração é o facto de não estarem previstas  adaptações ao sistema fiscal  de segurança social do trabalhador remoto.

O Orçamento de Estado faz referência “a um programa de atração e de apoio à fixação em Portugal de trabalhadores estrangeiros, através de “mecanismos facilitadores e de agilização da sua instalação no território nacional, promovendo (…) a simplificação dos processos administrativos junto dos diferentes serviços públicos intervenientes (artigo 101.º OE)”.

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Infelizmente, para além deste artigo nada mais se prevê acerca desta simplificação. Não estão previstas quaisquer adaptações dos consulados, do SEF, das obrigações fiscais e de segurança social para o digital nomad.

Chamo também a atenção para mais uma alteração: a do novo visto que permite a entrada e permanência em Portugal de cidadãos com finalidade de procura de trabalho, que autoriza o exercício   de atividade laboral dependente, até ao termo da duração do visto ou até à concessão da autorização de residência durante um período de 120 dias, prorrogável por mais 60 dias e permite uma entrada em Portugal. O Governo diz que com esta medida quer criar condições para uma “imigração segura em Portugal”, contudo, depois de entrarem não está previsto qualquer mecanismo de controlo sobre se estes estrangeiros.

Para além da alteração legislativa, foi ontem assinado um protocolo entre GNR, PSP, SEF e PJ que estabelece “o modelo de cooperação entre as forças de segurança no âmbito da reestruturação do sistema português de controlo de fronteiras”. Este protocolo veio esquartejar a gestão do controlo de fronteiras por diferentes forças policiais.

A necessária e urgente reforma do SEF continua eternamente adiada até à criação da Agência Portuguesa para as Migrações e Asilo (APMA), aguardando que as atribuições em matéria administrativa passem a ser exercidas pela APMA e Instituto dos Registos e do Notariado.

É lamentável que pelo segundo ano consecutivo, desde que foi tomada a decisão de reformar o SEF, o Orçamento de Estado não preveja uma rúbrica para a tão esperada reforma do SEF.

Faz sentido que com um aumento crescente de estrangeiros as competências do SEF fiquem espalhadas por 6 entidades diferentes? Será possível aumentar a eficiência, diminuir os tempos de espera e garantir a segurança do País?

O que fica por fazer em 2023?

Sugiro que o Governo comece com a regra dos 3 “P’s” – pouco, pequeno e possível – como:

– Perante a crise demográfica Portuguesa e com o fim da definição anual do Contingente migratório, o Governo devia parar para pensar para definir a política migratória que Portugal precisa à semelhança de países como o Canadá.

– Uniformizar os procedimentos exigidos a nível consular (forma de agendamento, documentos exigidos e tempos de processamento);

– Eliminar estruturas monopolistas como a VFS, que criam sistemas de corrupção no sistema de agendamentos, desprovidas de  pessoal qualificado na análise dos documentos e que são um mau cartão de visita da realidade diplomática portuguesa (o que se passa num consulado dentro dos E.U.A é diferente da África do Sul, que é diferente dos Emirados Árabes Unidos);

– Garantir que se respeite os agendamentos por ordem cronológica através de um sistema online, eliminando o atendimento por via telefónica. O SEF tem 50 funcionários para o atendimento de milhares de requerentes. Este sistema arcaico deve ser substituído por um sistema informático que permita o agendamento electrónico de forma a promover a igualdade de acesso aos serviços da administração pública. Não é inventar, o Estado já dispõe desta tecnologia noutros serviços, (ex.: o agendamento do cartão de cidadão

– Harmonizar as alterações legislativas do digital nomad visa com o regime fiscal e segurança social.

Portugal está perante um aumento crescente de cidadãos estrangeiros em território nacional. São boas notícias que não se coadunam com o nível de irresponsabilidade na forma como tem sido gerido o assunto “reforma do SEF”. É fulcral assegurar uma rápida optimização dos serviços, tanto a nível informático como do ponto de vista de recursos humanos.

O Ministro da Administração Interna recentemente referiu “que a reestruturação do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) vai melhorar a segurança do país, com o aumento de efetivos para responder à gestão das fronteiras e às migrações”. Contudo, até hoje para protocolo assinado ontem não foi explicado como será concretizada esta reforma, nem a data concreta da implementação.

Acabamos por ter uma alteração legislativa sem a reforma esperada de um serviço público que acolha com dignidade os estrangeiros que procuram o nosso país para viver.