O filho de Pedro Nuno Santos frequenta o Colégio Moderno. António Costa escolheu o mesmo colégio privado (excelente, por sinal) para os filhos. José Sócrates idem acrescentando a Escola Alemã ao leque das escolas privadas escolhidas pelos dirigentes socialistas para matricularem os seus filhos. A lista prossegue com o caso politicamente notável da socialista Alexandra Leitão que enquanto secretária de Estado Adjunta e da Educação no governo da geringonça perseguiu os contratos de associação celebrados entre o Ministério da Educação e vários colégios privados, apesar do bom desempenho desses colégios, da satisfação de famílias e alunos e das poupanças que esses contratos permitiam ao contribuinte: sim o custo por aluno era mais baixo nas escolas com contrato de associação do que nas escolas públicas. Toda esta cruzada contra o ensino privado, sobretudo aquele em que era maior a diversidade social, não suscitou qualquer questão moral à então secretária de Estado cujas filhas frequentavam então a privadíssima Escola Alemã e muito menos a penalizou politicamente à época ou agora, pois encontramo-la presentemente como a figura mais destacada na liderança e no programa de Pedro Nuno Santos.

Alguém devia traduzir para francês esta lista das preferências dos socialistas portugueses pelas escolas privadas e enviá-la à imprensa francesa e também a Amélie Oudéa-Castéra, a actual ministra da educação de França. Mal chegou ao cargo Amélie Oudéa-Castéra viu-se envolta numa polémica por ter colocado os seus três filhos numa escola privada, para mais a muito católica escola Stanislas, o que numa França enredada na armadilha do activismo laicista ainda agrava mais a polémica. Ora a senhora Amélie Oudéa-Castéra, em vez de andar a tentar arranjar justificações para o que é mais ou menos óbvio – queria uma boa escola para os seus filhos – devia pura e simplesmente dizer que segue os melhores exemplos da esquerda politicamente melhor sucedida na Europa, a esquerda portuguesa, aquela que ergueu um muro entre a forma como governa o povo e como se governa a si.

A óbvia preferência dos dirigentes da esquerda portuguesa em geral e dos socialistas nacionais em particular pelas mais reputadas escolas privadas e também pela medicina privada e por tudo aquilo que os poupe de ter de frequentar os mesmos serviços públicos que eles impõem aos demais cidadãos (sempre em nome da justiça e da igualdade), sem que sejam questionados por isso, é um óptimo exemplo do sucesso da demagogia em política.

O discurso de sobranceria que emana dos socialistas portugueses, que nem por sombras se imaginam na pele de Amélie Oudéa-Castéra, é resultante não dum qualquer mau feitio mas sim da interiorização desta duplicidade entre uma virtude reivindicada e uma irresponsabilidade praticada. A este título são exemplares as declarações do ministro João Costa sobre a morte de uma aluna na Escola Secundária de Seia após ter chocado com uma porta de vidro. Recordo que João Costa, na Covilhã (tanto quanto sei João Costa nem foi à escola de Seia), declarou “Nós estamos a falar de um acidente que poderia ter acontecido, infelizmente, em qualquer escola ou em qualquer lugar onde haja vidro. Acho que qualquer associação entre a tragédia e as diferentes condições que as escolas têm é de mau gosto. Portanto para João Costa o problema é o mau gosto de quem pergunta e não as perguntas que qualquer pessoa faz perante uma tragédia destas. Por exemplo, deverão existir portas de vidro nas escolas? E de que tipo de vidro? (De repente, acodem-me à memórias as grossas portas de madeira com aberturas de vidro aramado das escolas públicas que frequentei e sou levada a concluir que obviamente a questão está mais que estudada mas alguém saltou esses capítulos!)

O ministro ao menos podia ter mostrado preocupação com o facto de existirem portas de vidro facilmente quebrável nas escolas. Num tempo em que se arrancam árvores dos recreios por causa da segurança, se proíbe tudo e mais alguma coisa em matéria alimentar por causa da segurança, se avaliam brinquedos por causa da segurança… não é compreensível que existam portas de vidro que se podem estilhaçar porque alguém, no caso uma rapariga, choca com elas. Não é portanto uma questão de mau gosto perguntar como e porquê se escolheu colocar portas de vidro nas escolas. É uma questão de exigência. Mas é revelador que João Costa tenha usado a expressão mau gosto.  Sim, o sucesso do discurso da esquerda vê-se exactamente nesse aparente detalhe: o que noutras áreas políticas é um erro que tem de ser denunciado, criticado e corrigido, à esquerda é um facto pelo qual se mandam condolências mas que é de mau gosto questionar. Tal como é de mau gosto questionar que escolas frequentam os filhos dos políticos, tal como é de mau gosto perguntar as causas da degradação do atendimento aos utentes no Hospital Beatriz Ângelo após o fim da PPP levado a cabo por Marta Temido, agora estrela ascendente no universo socialista, tal como é de mau gosto tudo o que ponha em causa a superioridade política do discurso estatista.

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