Que resultado eleitoral pode esperar obter um candidato credível a primeiro-ministro nas próximas eleições legislativas se confessar antes ou durante a campanha que será impossível aumentar salários; melhorar a vida dos portugueses; baixar impostos; repor o poder de compra? Na melhor das hipóteses perde as eleições, na pior perde-as por margem desastrosa.

Ninguém vence eleições a dar más notícias. E por isso promete-se- já se começou a prometer – o impossível, o que não se pode dar ou, pelo menos, não se sabe se se pode dar. Depois não se dá, mas então já não interessa nada, estão as eleições ganhas.

Há alguns meses, Marcelo Rebelo de Sousa disse que os candidatos em campanha prometem coisas que, mal chegam ao governo, tratam de não fazer e que isso afasta os portugueses dos políticos. Nada de novo, de resto. Um estudo de 2010 sobre a qualidade da democracia em Portugal promovido pela SEDES e redactado por Pedro Magalhães referia prevalecer “claramente a ideia de que os eleitos não atendem às expectativas e interesses dos eleitores” e que os portugueses têm a percepção de que não “influenciam em nada as decisões politicas, de que os políticos se preocupam exclusivamente com interesses pessoais (…) e de que não há sintonia entre aquilo que consideram ser prioritário para o país e aquilo a que os governos dão prioridade”. Confirmava aliás as conclusões de um inquérito internacional de 2006 realizado em 33 países pelo Instituto alemão Leibniz, que concluía que mais de 70% dos portugueses consideravam que os eleitos não cumpriam as promessas feitas em campanha.

Mas será mesmo assim? Um outro e muito recente  estudo internacional sobre o qual escreveu o Observador indicava que 60% das promessas feitas em 11 paises nesses países eram realizadas e, mais importante para nós, que os políticos portugueses são dos mais eficazes: quase 70% de promessas cumpridas, colocando Portugal em 3º lugar. Em que ficamos, afinal? Seria maçador para os leitores enunciar aqui os prós e contras destes estudos, analisar a metodologia, o tipo de promessas tidas em conta e o que significa, nessa óptica, “cumprir promessas”, etc. Elas não têm todas o mesmo valor – uma única promessa, decisiva para a vida das pessoas, pode afectar mais o sentimento popular do que cem medidas insignificantes, óbvias ou fáceis de concretizar. Mas também teriam de considerar-se os diferentes momentos em que a opinião pública se pronuncia, com claras diferenças entre períodos de euforia e crescimento económico e fases de retrocesso e depressão.

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Ainda assim, e para simplificar parece de senso comum, opinião generalizada ou o que lhe quiserem chamar, que se fazem demasiadas promessas, com excessiva facilidade, sem preocupação com a sua “adesão à realidade” (a expressão é horrível, eu sei, mas pelo menos não escrevi “aderência” à realidade). Isso afasta as pessoas, descredibiliza os políticos, torna a causa pública perdida para muitos de nós – quando todos nos devíamos envolver (e devíamos poder envolver-nos). Que fazer? Desde logo, talvez, que os políticos em campanha, e até muito antes das campanhas, tenham consciência do problema e aceitem tomá-lo em consideração. Prometer? Claro, mas com moderação e enunciando fundamentos, apresentando dados objectivos e até, se possível, prós e contras e margens de erro. Será uma fantasia?

Estamos a quase um ano das próximas legislativas, caso não haja eleições antecipadas, pouco verosímeis. E as promessas já começaram, de um lado e outro do espectro eleitoral. Não vou aqui enunciá-las, os leitores sabem bem do que falo: já se promete mudar tudo e o seu contrário e a procissão ainda nem sequer chegou ao adro. Talvez alguns políticos portugueses pudessem fazer como “um certo” candidato a deputado federal brasileiro nas eleições de 2010: “Vote em Tiririca, pior não fica”.

Esta crónica não pretende senão alertar para o problema. Poderia agora discorrer sobre a natureza do sistema político, da governação aos sistemas eleitoral ou partidário, em busca das razões mais profundas para a crescente descrença nas promessas eleitorais; não é este o momento nem o local, mas é algo que terá de ser feito.

Os políticos têm cada vez maior dificuldade em perceber o que se passa e as razões da sua impopularidade. Talvez por isso (só talvez) redobram de zelo – e de promessas – e, para piorar, falam em politiquês, cada vez mais importante para justificar o que não conseguem justificar, uma novilíngua que contribui afinal para manter os cidadãos à distância:

Na política não se mente, dizem-se inverdades; os políticos não falham, incumprem. Na verdade, na genial expressão inventada (creio) pelo brasileiro cartunista (sic) Braga a propósito das eleições brasileiras de 2010, entre si, em público e na relação com os cidadãos, os candidatos em campanha já não discordam nem concordam:

Disconcordam.

 

Professor da Universidade Católica – Instituto de Estudos Políticos